Faz pouco mais de um mês que Fiapo foi encontrado em uma via pública da zona sul da Capital e levado para o abrigo de animais de grande porte da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), no bairro Lami. Desnutrido, o cavalo era pele e osso quando foi resgatado, não tinha forças nem para ficar em pé. Após 15 dias de cuidados, o ânimo é diferente.
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– Agora, fica no pasto, caminha. Entro aqui no campo com o balde de ração e ele já vem – conta Denísio Pires Correa, conhecido como Castelhano por sua origem uruguaia, que cuida do abrigo por meio de um contrato de prestação de serviços com a EPTC até novembro deste ano.
Abandonada em vias da cidade e vítima de maus-tratos, a maioria dos animais de grande porte resgatados pela EPTC é encontrada em condições preocupantes, como magreza extrema decorrente de desnutrição, patas bichadas e corpo machucado.
Mantido com verba pública, o abrigo tem como objetivo retirar esses animais das ruas e de situações violentas para que, após cuidados veterinários, possam encontrar um lar definitivo e saudável. Em casos de cavalos roubados que acabam ficando soltos na via, o dono tem um prazo de 15 dias para a retirada do animal. Atualmente, cerca de 60 cavalos vivem no abrigo, 33 deles aptos para adoção – os demais ainda passam por tratamento.
– Quando o animal vem muito debilitado, encaminhamos para o hospital veterinário da UFRGS. Eles passam por uma série de cuidados para depois serem adotados. Só liberamos quando estão saudáveis – diz Tiago Oliveira, coordenador do abrigo.
Desde 2008, o programa de adoção da EPTC já garantiu que 757 cavalos ganhassem um novo lar. Gostar muito de cavalo e ter um espaço fora da área urbana – sítio ou chácara – são requisitos essenciais para aqueles que têm interesse em levar um deles para casa. De acordo com Oliveira, gente de todos os cantos do Estado aparece em busca dos bichos.
– São pessoas que gostam da lida do campo, que querem ter um cavalo para estimação, montaria e corte de grama – conta o coordenador.
O perfil do interessado é analisado junto à Secretaria Especial dos Direitos Animais (Seda). É verificado se há histórico de maus-tratos – de qualquer tipo de animal – e ocorrências criminosas, se a pessoa vai deixar o cavalo em um lugar apropriado e se tem condições para manter o bicho. Essa consulta é feita para garantir que o cavalo não volte a uma condição de sofrimento.
Segundo Correa, para manter um cavalo, é preciso reservar de R$ 300 a R$ 500 por mês para gastos com ração, medicamentos e vacinas – são cinco por ano. O valor varia porque depende da situação do cavalo e se ele se alimenta só de ração ou de pasto também.
Após a adoção, um acompanhamento anual é realizado. Além de vistorias nos locais, os agentes da EPTC monitoram os cavalos por meio de um microchip, implantado na chegada ao abrigo.
Quase 150 resgates somente em 2017
No ano passado, 546 cavalos foram levados ao abrigo – 71% a mais do que em 2015, quando 319 animais foram para o local. Só neste ano, até sábado, 147 resgates foram contabilizados. Oliveira acredita que esse aumento ocorreu devido ao Programa Todos Somos Porto Alegre, que oferece alternativas de trabalho a carroceiros em razão da lei municipal de 2008, que proíbe carroças de circularem na cidade. A medida passaria a vigorar em setembro de 2016, mas teve prazo prorrogado para 10 de março deste ano. A atividade é permitida na zona rural e nas ilhas.
– Chegamos a receber 30 cavalos em um mês de forma espontânea, mas conseguimos encaminhá-los – afirma Oliveira, ressaltando que, em alguns casos, os carroceiros venderam as carroças e ficaram com os animais por estimá-los.
Os xodós do rebanho
Dois cavalos são os xodós de Correa. O guardião da área de 27 hectares fala que Ceguinho e Ceguinho Dois – batizados assim, por não enxergarem – são patrimônios do abrigo.
– Deles, eu não me desfaço. Eles sentem a minha presença. O Ceguinho está comigo desde 2013. O Dois chegou depois, mas não desgrudou mais do primeiro – brinca. – Se um começa a se distanciar um pouco, o outro já começa a relinchar – completa o cuidador.
Ceguinho foi encontrado no Arroio Dilúvio, com os olhos sangrando, durante a madrugada. Há quatro anos, o cavalo vive no abrigo aos cuidados de Correa. Resgatado em 2015, o Ceguinho Dois foi abandonado em uma via da Capital por não enxergar. Agora, os dois têm um pelo castanho claro brilhoso que denuncia a vida boa que levam desde que chegaram ao abrigo.
Denúncias
> Pelos telefones 118 e 156.
> A EPTC apenas recolhe cavalos abandonados ou vítimas de maus-tratos se eles estiverem soltos. Caso o animal esteja amarrado dentro de uma propriedade e ficar constatada a situação de abandono, a EPTC aciona o Batalhão Ambiental da Brigada Militar.
Para adotar
> O cavalo não poderá ser vendido, em hipótese alguma.
> É preciso ter chácara, fazenda ou sítio de, no mínimo, um hectare.
> O animal não poderá ser utilizado para puxar carroças, charretes ou para atividades esportivas como corridas e saltos.