Um edifício com ar de escada chama atenção no entorno do Beira-Rio. Com degraus que escalam o Morro Santa Tereza, em Porto Alegre, o Condomínio Encosta do Poente desperta curiosidade em visitantes e porto-alegrenses desde os anos 1970. A peculiaridade que o incluiu no Guia de Arquitetura de Porto Alegre, lançado em março de 2017, também faz voar a imaginação de quem o vê.
— Desde piá eu ficava com aquela coisa na cabeça. Achava que tinham empurrado o prédio contra o morro — lembra Marlus Sousa, morador do Centro Histórico.
Trabalhar em uma pet shop permitiu a Marlus tirar as dúvidas da infância. Buscando os cachorros da freguesia no bairro Santa Tereza para fazer banho e tosa, pôde conhecer de perto a arquitetura do prédio escalonado e também do edifício erguido posteriormente ao lado, no mesmo sistema.
— Eles têm uma das melhores vistas na cidade. Tirando o Beira-Rio — diz o gremista.
Cada degrau tem dois apartamentos de pelo menos 281 metros quadrados com terraço e piscina — são 30, ao todo. No Encosta do Poente, quase tudo é peculiar. É um prédio em que se pode entrar também pelo topo — quem mora nos últimos andares chega pela Rua Sinke, 70 metros acima do nível do mar, enquanto os apartamentos mais baixos usam uma entrada na Rua Monroe, quase na altura do Guaíba.
Claro que o elevador também não seria comum. Em vez de subir reto, se movimenta sobre um trilho, em plano inclinado, no meio dos dois blocos do condomínio. A subida parece o início de uma montanha-russa, quando os vagões são puxados lentamente até o topo — mas sem emoção depois. Do subsolo ao ponto mais alto, o trajeto pode levar três minutos. Como se já não fosse diferente o bastante, o elevador ainda tem dois andares: em cima, é o social e, em baixo, o de serviço.
Por isso, é atração mesmo depois de quatro décadas em funcionamento, conta Tânia Oliveira, que mora desde 2009 no local.
— Quando nossos amigos descobrem que a gente mora aqui, todos querem vir conhecer. É uma procissão — diverte-se.
O condomínio foi projetado pelo porto-alegrense Ruben Kleebank, que fez o trabalho no início dos anos 1970 sem nunca ter visto pessoalmente um prédio escalonado em morro antes. Naquela época pré-internet, a única referência que tinha vinha de uma revista técnica, onde achou uma foto de um condomínio que, se não lhe falha a memória, ficava na Alemanha.
– Pensei: se eles fizeram, por que não podemos fazer também?
Ele mesmo desenhou a cabine do elevador, com auxílio de um engenheiro austríaco na parte mecânica. A construção do conjunto, realizada entre 1972 e 1975, foi como "fazer uma pirâmide do Egito", exagera.
— O problema foi escorar os pavimentos para concretar as lajes. Foi trabalhoso, mas não impossível — conta.
Porém, mais difícil ainda seria vender os apartamentos depois. Em vez de fazer sucesso, a peculiaridade do imóvel "deixou o pessoal receoso" no início, conforme Kleebank. Um segundo prédio, nos mesmos moldes, seria erguido ao lado cerca de 10 anos depois por uma outra construtora. Questionado por que o sistema de escalonamento não se difundiu em Porto Alegre, ele acredita que foi por uma eventual dificuldade em conseguir as autorizações e encontrar terreno próprio, com inclinação adequada.
Esta matéria foi publicada originalmente em abril de 2017 e atualizada em outubro de 2018.