Enquanto acompanhava as cenas das invasões das escolas e universidades estatais, chocou-me menos a prática violenta e ilegal em si do que o apoio explícito do professorado e a conivência (por vezes mais do que isso) do estamento burocrático-administrativo dessas escolas e universidades ao que é, claramente, um ataque à instituição a que pertencem e que deveriam saber honrar. Imediatamente, lembrei-me de importante reflexão de Eugenio Bucci, professor da USP e ex-presidente da Radiobras durante o governo Lula da Silva (PT). Em plena campanha eleitoral de 2014, 66 reitores de universidades federais rumaram em caravana de beija-mão para declarar, em indecoroso palanque no Palácio do Alvorada, apoio à candidata do petismo. Era mera repetição de uma rotina de aparelhamento político-partidário que se tornara prática corrente na década anterior, e que Bucci descreveu com o que, hoje se comprova, eram cuidadosos eufemismos: "Ainda que tenham sinceras razões para preferir a candidata do PT, esses reitores, inadvertidamente, causam a impressão de assimetrias partidárias no tratamento do corpo docente e podem, sem querer, inibir dissidências e encorajar o monolitismo de opinião. Isso não é autonomia. Pode ser partidarismo, ainda que involuntário" (O Estado de S.Paulo, 2/10/2014).
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Não havia, nunca houve e não há agora nada de involuntário no partidarismo que a corporação universitária manifesta, seja em sua aberta doutrinação ideológica em sala de aula, seja em seu envolvimento escancarado em práticas ilegais como são as invasões de prédios públicos.
As exceções, como de praxe, são raras ou silenciosas. O que é notável, no entanto, é que os pró-invasores efetivamente acreditam que a decisão da tigrada partidária tem prevalência sobre a vontade da maioria nas escolas ou universidades, que decisões da tropa de choque invasora são a mais acabada expressão da democracia e que a violência praticada em nome de suas convicções é necessária e justa.
Essa convicção total na verdade absoluta de suas ideologias e de seus partidos explica, por exemplo, a incapacidade dessa burocracia estatal do ensino para reconhecer os papéis institucionais que exercem, quer como professores, quer como gestores, e que são incompatíveis com certas práticas de vassalagem partidária e ideológica a que parecem estar habituados.
O ex-reitor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Roberto Salles, por exemplo, deu uma pequena mostra disso. Na mesma campanha de 2014, Salles enviou um e-mail pedindo voto à candidatura petista "à comunidade universitária e ao público em geral" usando o endereço do gabinete da reitoria e dirigindo-se a diretores e funcionários da universidade, assim como a diretores, professores e funcionários de outras instituições federais. Por que deveríamos pensar que, hoje, esses mesmos indivíduos que nunca fizeram outra coisa que não doutrinar alunos e aparelhar instituições subitamente passariam a ter algum tipo de atitude institucional apropriada?
De positivo, em todo esse triste cenário de invasões e demais ilegalidades praticadas por esses grupos partidários, há o isolamento social em que estão caindo: fora de seus meios, ninguém lhes dá bola, ninguém os apoia, ninguém se importa.
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* Eduardo Wolf escreve mensalmente no Caderno DOC.