Há alguns anos, um curso pré-vestibular tinha como slogan a seguinte frase: "Você é o resultado de suas escolhas". Um slogan bastante existencialista, aliás. De fato, a frase parecia estar no lugar certo, uma vez que, para muitos de nós, escolher uma faculdade para cursar pareceu a primeira grande decisão de uma vida que estava começando. Antes disso, não se tinha autonomia para muita coisa, e viver parecia um pouco com uma esteira rolante em que a gente sobe e pronto. Até nossas paixões adolescentes tinham uma dose brutal de aleatoriedade, como se, seguindo o ritmo e o caminho previsível da esteira, a gente avistasse uma pessoa ao longe e caísse de amor já no instante seguinte sem saber absolutamente nada sobre ela. Uma flecha era jogada de algum lugar.
A vida fica um pouco mais complicada depois e, no que se refere a escolhas, a impressão é a de que cada porta de uma antessala de mil portas revela uma outra antessala de mil portas. Comprar um apartamento ou alugar um apartamento ou fazer um curso de fotografia em Berlim ou prestar um concurso público e ir morar no interior do Paraná ou aquele cara ou aquele outro ou aquele drinque ou aquele filme ou pilates ou yoga ou funcional ou sedentarismo assumido ou trabalhar mais e ganhar mais dinheiro ou trabalhar apenas o suficiente e aproveitar o tempo ou ou ou.
Cada escolha da vida adulta deixa também evidente tudo o que não escolhemos, e é preciso que estejamos muito tranquilos ao contemplarmos todos esses caminhos descartados. Para isso, ajuda muito ter a consciência de que somos os construtores de nossa trajetória, o que nem sempre é tão simples quanto soa. Simples é esticar o dedo e apontar para todos os lados, menos para nós mesmos. A família. O chefe. O acaso. As estrelas (que me fizeram leão-ascendente-leão-lua-em-libra). O dia cinza (que me deixa deprimida). A ligação (que não veio). A frase escrita no biscoito da sorte. Pensando bem, nada é mais difícil do que assumir a autoria da própria vida.
Claro que não é muito reconfortante saber que algumas decisões vão cobrar o seu preço, ainda que num futuro distante. Um exemplo clássico, que vejo sobretudo na geração de meus pais, é o do casal que se fechou em si mesmo e que, depois de décadas (os filhos já crescidos e agora com suas próprias vidas), vai reclamar e sofrer com a falta de amigos. Aqui vale o ditado: a gente colhe o que planta. Mesmo que às vezes estejamos tão distraídos seguindo "o fluxo normal da vida" a ponto de nem nos darmos conta do que estamos plantando.
Falando em expressões populares, há uma da qual eu desconfio um pouco: "Nunca é tarde". Sim, às vezes é tarde, sobretudo quando o sonho envolve outra(s) pessoa(s). Felizmente, às vezes é tarde. O "nunca é tarde" pode ser em alguns casos a negação de que escolhas têm consequências boas e ruins, e que é preciso aceitar o pacote todo. Querer uma segunda chance de alguém a quem você fez mal, por exemplo, é um jeito de não assumir que suas atitudes tiveram consequências. Liberdade e responsabilidade andam de mãos dadas. Sobre isso, não há escolha alguma a ser feita.
>>> Carol Bensimon escreve mensalmente no Caderno DOC.