Resoluções para 2016: "Esse ano eu vou parar de beber, amor, esse ano eu vou parar de fumar, esse ano eu vou emagrecer, eu vou virar o tal. Tudo que você pedir eu vou te dar, dessa vez vamos casar, pode preparar o enxoval. Mas só depois do Carnaval".
A letra dessa marchinha de carnaval composta por Alê Muniz e Luciana Simões transmite a ideia corrente de que o Brasil tem dois calendários. Um iria de março a novembro e outro, de dezembro a fevereiro. Durante o primeiro, as coisas, digamos, funcionam. Mas, de dezembro a fevereiro, as coisas "funcionam menos".
Nada pior que ficar desempregado ou precisar de algo urgente em dezembro. A primeira resposta sempre é "Bem, agora está vindo o Natal, mas depois vamos ver". Em seguida, invoca-se o Ano-Novo e depois que esse começou, menciona-se o carnaval. Isso deixa as coisas em banho-maria, às vezes até o começo de março.
Nesse período, estamos em pleno verão. Com o calor, as pessoas estão mais propensas à praia, à cerveja e aos amigos. Quem pode, marca suas férias nesses meses. É o caso do Judiciário e do Legislativo que "entram em recesso". Mas nem todos podem se dar a esse luxo.
Boa parte da população brasileira trabalha normalmente nessa época. No verão, os trabalhadores do turismo, hotelaria, lazer e entretenimento estão mais ativos do que nunca para atender a demanda. Por isso, há muitas contratações temporárias. O mesmo vale para aquelas pessoas diretamente envolvidas com o carnaval: os carnavalescos, os figurinistas, os passistas, os músicos. Empresas costumam colocar em execução restruturações, planos de investimentos, contratações no começo do ano.
É bom lembrar que há muitas obrigações que precisam ser cumpridas logo no começo do ano, principalmente as financeiras: IPTU, IPVA, matrícula do colégio, material escolar.
Mas o verão e seu clima festivo se prestam a desenvolver o preconceito de que os brasileiros são preguiçosos. O ponto alto desse período do ano é o Carnaval, que não tem data fixa para ocorrer. Na prática, ele toma conta do país por uma semana, apesar de oficialmente apenas a "Terça-feira Gorda" ser feriado. Antigamente, para os católicos praticantes, este costumava ser o último dia de consumo de carne. Daí a expressão em latim carnevale, "adeus carne".
A partir da Quarta-feira de Cinzas, deveria se dar adeus aos prazeres e começar a trabalhar novamente. Neste período estamos na Quaresma, os 40 dias que antecedem a Páscoa. Como este feriado comemora a morte e a ressurreição de Cristo, essa seria uma época de maior contenção. Mas, há lugares em que o carnaval entra Quaresma adentro. E nesse caso, podemos estar em abril e o ano ainda não ter começado.
Se até o carnaval decisões são adiadas, quanto mais tarde no calendário cair esse feriado, melhor para a indústria do turismo e setores a ela associados, uma vez que seus negócios continuam. Por isso, várias tentativas foram feitas para comemorar a festa num dia fixo, o que já ocorre com seu desfile em diferentes cidades brasileiras. Quando o carnaval cai na primeira metade de fevereiro, como é o caso de 2016, isso é muito ruim para a indústria do turismo. Nas palavras de Caribé da Rocha, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis na década de 1980: "O Carnaval na primeira quinzena de fevereiro é um desastre econômico para o Rio, pois reduz os três meses da temporada de verão carioca à metade". Ou seja, queremos trabalhar mais.
Mas, se na verdade, várias pessoas precisam e querem trabalhar nesse período, no imaginário brasileiro o carnaval acentuaria nosso lado Macunaíma. A música popular expressa o clima que toma conta do Brasil nesses meses. Em vários sambas e marchinhas, o Brasil cai novamente na real só depois do Carnaval.
*Ruben George Oliven escreve mensalmente no Caderno PrOA.
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