Anunciado como "o maior projeto de drenagem da história" da Capital pelo prefeito José Fortunati em julho de 2015, o DrenaPOA vai atrasar e não tem prazo para sair do papel. As obras, que devem amenizar alagamentos como o que trouxe transtornos a Porto Alegre na manhã desta quinta-feira, começariam daqui um mês. Os processos licitatórios, porém, foram suspensos no final do ano passado. Seriam investidos R$ 237 milhões em recursos federais, obtidos por meio do PAC Prevenção. Zero Hora entrou em contato com o Ministério das Cidades e não obteve retorno.
O problema é que o valor foi reajustado devido a uma lei que alterou o índice de Benefício e Despesas Indiretas (BDI) das empresas – taxa que se adiciona ao custo de uma obra para cobrir gastos indiretos que tem o construtor – e não há garantia de que será liberado pelo Ministério das Cidades. Enquanto isso, as casas de bombas seguem parando por falta de luz – apenas três das 21 têm geradores –, e os arroios continuam com problemas de drenagem.
Leia mais:
Prefeitura promete força-tarefa para faxinar postes de Porto Alegre
Temporal faz moradores de Porto Alegre reviverem pesadelo de sexta-feira Hospitais danificados no fim de semana mantêm atendimento após chuvarada
Apesar da chuva atípica desta quinta – 90 mm em três horas, quase a média histórica de fevereiro, que é de 108,6 mm – e dos resquícios da tempestade da semana passada em bueiros e bocas de lobo, as dificuldades históricas para escoar a enxurrada foram as mesmas de sempre. Cinco casas de bombas ficaram sem luz, e o arroio Sarandi transbordou. Mais de 40 pontos alagaram na Capital. O distúrbio foi tamanho que, na Avenida Sertório, um homem foi visto num caiaque (foto abaixo) para conseguir se deslocar.
– O ritmo das obras se dará conforme o repasse do governo federal – afirma o diretor do Departamento de Esgotos Pluviais (DEP), Tarso Boelter.
Comerciante retira lixo com as mãos
Segundo Boelter, os editais com os novos valores devem ser publicados em março. As empresas, então, têm 45 dias para se inscrever, e em maio a cidade começa a ver na prática o desenvolvimento do projeto divulgado com pompa por Fortunati. Mas, como o país está em crise, é possível que o PAC Prevenção fique em segundo plano, como o próprio DEP admite. Não há plano B. Com orçamento anual de R$ 45 milhões, o órgão municipal não tem condições de levar adiante o DrenaPOA sem recursos da União.
– Brasília empurrou os prazos em função da crise. Estamos atacando nesse momento só questões emergenciais, como arroios obstruídos – diz Boelter.
Para a rotina da cidade, as consequências da morosidade parecem intermináveis. Na manhã desta quinta, casas de bombas das zonas leste, norte e central não operaram por falta de energia elétrica. O resultado: transtornos em diversas ruas. No bairro Cidade Baixa, um comerciante teve de retirar o lixo que invadia seu estabelecimento com as próprias mãos.
– Meu receio agora é que a calçada comece a ceder – desabafou João Borba, 44 anos.
Obras complexas, caras e demoradas
A primeira fase do projeto para mudar a drenagem de Porto Alegre abrange três frentes: obras nas bacias hidrográficas dos arroios Areia (R$ 107 milhões) e Moinho (R$ 40 milhões), e a reforma de cinco casas de bombas (R$ 42 milhões) das 13 previstas. Serão beneficiadas mais de 500 mil pessoas. A promessa é eliminar os alagamentos em regiões como a da Avenida Nilo Peçanha, onde já ocorreram mortes em enchentes.
Com valores elevados, as obras também são complexas e demoradas. O arroio Areia, por exemplo, precisa de pelo menos quatros anos e meio para ser remodelado. As casas de bombas e o arroio Moinho, de três anos. Doutor em hidrologia e coordenador do Núcleo de Águas Urbanas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Joel Goldenfum salienta que a escassez de dinheiro poderia ser contornada com um trabalho coordenado entre todos os órgãos da prefeitura:
– Há desalinhamento entre eles. Enquanto o DEP vai numa direção, Secretaria de Obras e Viação e Secretaria do Meio Ambiente vão para outro. Falta articulação, parece que só se preocupam com isso quando acontecem os eventos.
O prefeito em exercício, Sebastião Melo, argumenta que o Executivo foca em "projetos de médio e longo prazo" e que não há como tirar verba do caixa para resolver todos os problemas no momento.