Antes de um referendo sobre a redução da maioridade penal, em outubro do ano passado, 70% dos uruguaios se diziam favoráveis à medida. Mas o resultado nas urnas foi diferente: a redução acabou rejeitada, por 53% a 47%. A seguir, um dos organizadores do movimento No a la baja, Federico Barreto, que articulou a oposição, explica como a virada foi possível.
O movimento "No a la Baja" ("Não à redução", em tradução livre) é citado como referência internacional na luta contra a redução da maioridade penal. Qual foi a principal estratégia adotada para convencer a população a mudar de opinião?
Embora tivéssemos uma enorme quantidade de argumentos de peso para rejeitar a proposta, o que precisávamos era combiná-los com uma estratégia de comunicação que atingisse a opinião pública. Para isso, resumimos todos os argumentos em três linhas fundamentais: 1) A redução não serve, de forma alguma vai colaborar para reduzir a insegurança no Uruguai, já que apenas 6% dos crimes são cometidos por adolescentes; 2) A redução é má, já que usa adolescentes como bodes expiatórios para os problemas do mundo adulto; 3) A redução é pior, já que potencializa a exclusão e a violência desses adolescentes, condenando-os, o que é provável, a um contato permanente com o mundo do crime.
No Brasil, uma comissão especial da Câmara aprovou recentemente a proposta de redução da maioridade penal para crimes hediondos e 87% da população se declara favorável à medida. O senhor tem acompanhado o caso brasileiro? O que o Brasil pode aprender com a experiência uruguaia?
No Uruguai, estamos muito atentos ao que acontece no Brasil no que diz respeito a esta questão. Já desde o ano passado, à medida que levávamos adiante a campanha, sabíamos que o que acontecia em nosso país também seria visto com olhos regionais. Hoje, continuamos cada vez mais preocupados com o que está acontecendo no Brasil e esperamos que também aí se consiga uma vitória da resistência popular. Sem querer dar lições, já que as situações são muito diferentes -, por exemplo, o caminho aí é parlamentar, enquanto aqui foi através de uma consulta popular -, acho que a chave para o sucesso no Uruguai foi saber aproveitar os potenciais populares próprios de nosso país. Foi sabermos abrir o máximo, ser mais e diversos, reconhecendo as nossas diferenças, mas trabalhando na unidade.
Como o senhor avalia o cenário internacional em relação à maioridade penal?
No Uruguai, desde a restauração da democracia, houve 19 tentativas de reduzir a idade de responsabilidade penal, todas fracassadas. Mas nós sabemos que isso não é uma obsessão uruguaia, uma vez que se podem encontrar os mesmos antecedentes em quase todos os países da região. A agenda de insegurança conecta de forma quase inalterada os setores conservadores de direita e os grandes meios de comunicação.
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Nas redes sociais, mais pessoas são contra a redução da maioridade penal
Qual é o maior equívoco que cerca a discussão sobre a maioridade penal?
O maior erro desta proposta específica parte do mesmo paradigma de "mão forte", de que mais segurança só pode ser obtida por meio de mais repressão. Isto tem sido historicamente falsificado. Mais repressão pode significar um número maior de presos, mas nunca menos insegurança. Na verdade, os dados mostram que esse caminho não consegue reduzir os índices de criminalidade.