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Ronco de motores, alta velocidade, freadas e acidentes. Poderia ser uma corrida real, mas são carrinhos de controle remoto, guiados por homens que amam as máquinas - as de verdade e as miniaturas. Adrenalina não falta: os pequenos bólidos percorrem a Avenida Edvaldo Pereira Paiva (Beira-Rio), em Porto Alegre, a mais de 170 km/h.
Nas noites de quarta-feira e sábado, dezenas de caras de idade preponderante entre 30 e 40 anos saem de seus lares para acelerar na pista improvisada a partir das 20h, aproximadamente. São pessoas já envolvidas com automobilismo, ex-corredores de kart, frequentadores de Tarumã e jipeiros, por exemplo, que enveredaram pelo automodelismo. Eles vêm não só da Capital, mas também de Canoas, Viamão, Alvorada. Até público se forma em torno do asfalto para assistir.
Além da paixão pelas máquinas, o grupo se reúne para desestressar do cotidiano de trabalho. O despertar tardio de uma tecnologia que não existia na juventude da maioria dos participantes é um dos motivos dos encontros, que começaram há cerca de um ano.
- Desde criança eu fuço nessas coisas. Todo mundo queria ter um desses na infância - diz o administrador Rafael Squinzani, 39 anos.
"Isso aqui é uma cachaça" foi uma frase repetida na noite da última quarta-feira. O hobby às vezes se torna vício e chega a atrapalhar a vida pessoal. Foi o caso de um frequentador que teve de decidir: a mulher ou o carrinho. Acabou vendendo o pequeno veículo para impedir que o casamento de desintegrasse. Não voltou mais ao grupo.
Poucas mulheres acompanham os companheiros no "autódromo". Normalmente, o desinteresse pela atividade e a falta de infraestrutura acabam desmobilizando-as.
- Todo cara traz a mulher uma vez. Aí ela reclama, vê que não tem banheiro, então não vem mais - atesta o empresário Marcos Oxley, 41 anos.
Às vezes, as mulheres acabam se tornando críticas ferrenhas da atividade dos maridos. Os homens admitem que não contam para elas o preço real dos pequenos veículos para evitar reprimendas ainda maiores.
- Ela vê que eu tô me preparando e diz: "quem sabe vamos jantar?" "Eu vou lá nos carrinhos", digo. "De novo?" - exemplifica o engenheiro elétrico Marcelo de Jesus, 35 anos.
Já os filhos de alguns frequentadores acabaram gostando tanto da função que agora têm seus próprios carrinhos. É o caso de Patrick Zanchin, 12 anos. O pai dele, o proprietário de estética Ronaldo Zanchin, 42 anos, convidou o garoto para acompanhá-lo no hobby, há três anos. Hoje, já pensa em seguir uma profissão compatível, a de engenheiro mecânico.
- Foi uma forma de conseguir tirá-lo da frente do computador. O acesso ao computador está acabando com as brincadeiras das crianças - afirmou Zanchin.
EPTC fala em risco de acidentes (de verdade)
Mas não são todos que curtem a brincadeira. A diversão está sob os olhos da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC). Para o diretor-presidente do órgão, Vanderlei Cappellari, os carrinhos podem causar acidentes sérios, especialmente envolvendo ciclistas. Ele ressalta que é possível obter uma licença para utilizar o local a partir das 22h, que é quando o tráfego diminui muito na região e um bloqueio pode ser feito pelos agentes de trânsito.
Há tempos, os automodelistas buscam um lugar adequado para acelerar seus minibólidos. Até agora, a Avenida Beira-Rio foi o melhor circuito que encontraram para as competições, que são caóticas. Os carrinhos zunem de todos os lados, movidos a gasolina, nitrometano ou eletricidade (esses são os mais rápidos), tentando bater o atual recorde de velocidade, 171 km/h - é um número que ficou registrado, mas ninguém sabe exatamente quem foi que obteve a marca.
O comerciante Tobias Tres, 26 anos, é quem dá o sinal de largada e usa um radar para medir as velocidades. Não para um instante, corre até o local de um "acidente", avisa sobre a passagem de carros de verdade na pista, instala os avisos luminosos para que os motoristas vejam a movimentação.
Uma vez, distraído, acabou sendo atingido nas pernas por um carrinho em alta velocidade. Praticamente girou no ar e se arrebentou no chão. A história virou uma lenda no grupo.
- Passei Nebacetin. Fiquei ruim por uma semana - disse.
Como nas pistas de verdade, os acidentes são espetaculares, e tem quem não fuja do choque pelo prazer de ver a cena - mesmo que custe a bolha do veículo, isto é, a sua carcaça de plástico, ou algum item mais valioso. Na noite da última quarta-feira, um carrinho se chocou contra o meio-fio a 119 km/h. A batida gerou um estouro e uma série de brincadeiras:
- Quebrou a balança!
- Tem que chamar a EPTC!
- Chama o Samu!