Correção: a solicitação teria sido encaminhada para o próprio Alexandre Ramagem, e não para a sua secretária, como publicado inicialmente entre 17h08min e 22h12min. O texto já foi corrigido.
Em 11 de outubro de 2021, uma assessora do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) remeteu por WhatsApp um pedido ao então chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem:
"Bom diaaaa..Tudo bem? Estou precisando muito de uma ajuda... Delegada PF. Dra. ISABELA MUNIZ FERREIRA _ Delegacia da PF Inquéritos Especiais...Inquéritos: 73.630 / 73.637 (Envolvendo PR e 3 filhos)".
Conforme a Procuradoria-Geral da República (PGR), esse pedido é para verificar o conteúdo das investigações sobre o então presidente da República, Jair Bolsonaro, e três de seus filhos — incluindo o próprio Carlos. A solicitação foi recebida por Ramagem, que é delegado da PF, mas que chefiou a Abin entre julho de 2019 a março de 2022.
Conforme as ordens judiciais emitidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nesta segunda-feira (29), às quais a reportagem de GZH teve acesso, essa troca de mensagens é um dos motivos que levou a PF a pedir busca e apreensão de celulares, computadores e outros objetos de Carlos Bolsonaro, nesta segunda-feira (29).
O pedido foi aceito pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF. Os outros alvos prioritários de investigação seriam Flávio Bolsonaro e Jair Renan, filhos mais velho e mais novo do ex-presidente, respectivamente.
Conforme a apuração, existiam mesmo investigações nos sistemas federais sobre os filhos do então presidente da República, mas não compatíveis com os números dos inquéritos mencionados. Mesmo assim, aponta a PF, "o NÚCLEO POLÍTICO do governo possivelmente se valia do Del. Alexandre Ramagem para obtenção de informações sigilosas e/ou ações ainda não totalmente esclarecidas", de modo que os policiais pediram a busca e apreensão, tanto em relação ao então chefe da Abin quanto ao vereador Carlos Bolsonaro.
Conforme as ordens judiciais, a PF ressalta que eles falavam por meio das respectivas secretárias e considera que elas eram intermediárias dos recados dos chefes. As duas também sofreram busca e apreensão.
Um segundo episódio motivou o pedido de busca e apreensão contra o filho do ex-presidente. Conforme a PF, em fevereiro de 2020 Alexandre Ramagem determinou a impressão da lista de informações dos Inquéritos Eleitorais da Polícia Federal no Estado do Rio de Janeiro. A listagem continha o número de inquérito, nome do investigado, o cargo político e o partido político dos alvos. Conforme a PGR, os documentos eram sigilosos e não deveriam ter sido impressos.
Um terceiro ponto motiva a investigação contra o filho do ex-presidente: o uso do sistema First Mile, um aparelho de fabricação israelense que permite monitorar milhares de celulares, simultaneamente. Em outubro de 2020, véspera das eleições municipais, essa aparelhagem teria sido utilizada pela Abin, então chefiada por Ramagem, para fazer 30.344 consultas de uso de telefones. A PF está convencida de que o sistema foi usado para espionar adversários políticos dos Bolsonaro.
O monitoramento, segundo a PF, foi comandado pelo militar do Exército Giancarlo Gomes Rodrigues, na época cedido à Abin, "por determinação do dr. Alexandre Ramagem" (diretor da agência de inteligência). A PF diz que, entre outros, ocorreu monitoramento injustificado do advogado Roberto Bertholdo, que teria proximidade com os ex-deputados federais Joice Hasselmann e Rodrigo Maia (ambos do PSDB), "à época tidos como adversários políticos do governo".
Um dos filhos do ex-presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), se pronunciou nas redes sociais e disse que a primeira equipe da PF bateu na casa dos Bolsonaro em Angra dos Reis mais tarde do que de costume, "talvez porque Alexandre de Moraes confeccionou a ordem de busca de ontem para hoje". A reportagem conferiu. As ordens de busca e apreensão foram emitidas dois dias atrás, em 27 de janeiro.