Uma conversa interceptada pela Polícia Federal (PF) entre o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, e uma assessora de Michelle Bolsonaro sugere uma orientação de pagamento para despesas da então primeira-dama. De acordo com áudios de WhatsApp, o militar demonstrava preocupação de que o ato relatado por ele fosse interpretado como um esquema de rachadinha, citando uma investigação a qual o senador Flávio Bolsonaro foi alvo no Ministério Público do Rio de Janeiro. A transcrição dos áudios obtidos pela PF foi revelada pelo portal UOL.
Mauro Cid foi preso no dia 3 de maio em uma operação da PF sobre fraudes em certificados de vacinação contra a covid-19 no sistema do Ministério da Saúde.
— Se ela (Michelle) perguntar pra você ou falar alguma coisa ou comentar, é importante ressaltar com ela que é o comprovante que ela tem. É um comprovante de depósito, é comprovante de pagamento. Não é um comprovante dela pagando nem do presidente pagando. Entendeu? É um comprovante que alguém tá pagando. Tanto que a gente saca o dinheiro e dá pra ela pagar ou sei lá quem paga ali. Então não tem como comprovar que esse dinheiro efetivamente sai da conta do presidente. É a mesma coisa do Flávio — disse Mauro Cid, em 25 de novembro de 2020, a Giselle dos Santos Carneiro da Silva, assessora da então primeira-dama, de acordo com áudio obtido pela PF.
De acordo com o UOL, também com base na investigação da PF, uma empresa que teve contratos públicos na gestão Bolsonaro, a Cedro do Líbano Comércio de Madeiras e Materiais, teria feito, em 2022, uma série de transferências a um militar que trabalhava com Mauro Cid na Ajudância de Ordens da Presidência da República.
Segundo a PF, o segundo sargento Luis Marcos dos Reis fez ao menos 12 depósitos em uma conta da tia da então primeira-dama em quatro ocasiões, entre abril e junho de 2022. Os depósitos tiveram o mesmo valor: R$ 2.840,00. A Cedro do Líbano Comércio de Madeiras e Materiais tem contratos com a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf).
Ao UOL, a defesa de Bolsonaro e Michelle diz que não há irregularidades nas transações e nega que recursos da Codevasf tenham sido utilizados para pagar despesas da ex-primeira-dama.
— A dona Michelle não conhece esse ajudante de ordens (sargento Dos Reis) e desconhece que ele tenha feito pagamentos para ela — disse o advogado Fábio Wajngarten, que foi chefe da Secretaria de Comunicação na gestão Bolsonaro.
Empréstimo de senha
A PF cumpriu no dia de 3 de maio mandado de busca e apreensão na casa de Bolsonaro, em Brasília, e prendeu o ex-ajudante de ordens Mauro Cid. De acordo com a PF, os suspeitos agiram para inserir dados falsos sobre vacinação contra a covid-19 no sistema do Ministério. A operação foi do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Os certificados de vacinação de Bolsonaro e da filha Laura, de 12 anos, teriam sido adulterados às vésperas da viagem da família aos Estados Unidos, em dezembro.
Em depoimento à PF, obtido pelo jornal Folha de S.Paulo, Cláudia Helena Acosta Rodrigues da Silva - chefe da central de vacinação da cidade carioca de Duque de Caxias, onde foram registradas as vacinas de Bolsonaro - afirmou que emprestou sua senha para o secretário de Governo do município, João Carlos de Sousa Brecha, para excluir dados de vacinação, sem saber que se tratava do ex-presidente.
Cláudia teria dito que não recebeu a relação dos CPFs que tiveram dados de vacinação excluídos e que Sousa Brecha teria justificado o empréstimo da senha dizendo que não queria "envolvê-la em problemas, uma vez que se tratavam de pessoas relevantes e conhecidas".
Brecha foi preso no mesmo dia que Mauro Cid. O secretário é acusado de incluir dados falsos de vacinação nos registros de Bolsonaro no ConecteSUS.