A decisão do governo Lula de criar a Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia, nova estrutura da Advocacia-Geral da União (AGU), com a tarefa de combater a desinformação sobre políticas públicas, despertou reações negativas na oposição.
As críticas são de que a iniciativa poderá gerar cerceamento da liberdade de manifestação e viés autoritário, embora a AGU tenha de recorrer ao Poder Judiciário para apresentar demandas. Ou seja, ela não tem poder decisório. Outro apontamento é que a desinformação não está tipificada no ordenamento jurídico brasileiro, o que poderá atribuir caráter subjetivo ao ato de identificação de possíveis falsidades.
A AGU é um órgão com status de ministério que representa judicialmente e extrajudicialmente a União em processos e presta consultoria jurídica para as demais estruturas da administração federal.
Criada por decreto do governo Lula, a Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia foi anunciada pelo titular da AGU, Jorge Messias, no seu discurso de posse, no dia 2 de janeiro. Ainda não está claro como será o funcionamento do órgão ou mesmo sua composição interna. São questões que terão de ser alvo de regulamentação. O certo é que a atuação da procuradoria terá relação direta com comportamentos e conteúdos digitais, campo em que as pretensas fake news são mais abundantes.
O deputado federal Carlos Sampaio (PSDB-SP) apresentou uma representação à Procuradoria-Geral da República (PGR) questionando a legalidade do núcleo. Ele disse que se trata de uma “arbitrariedade em nascedouro”.
— Se não existe nenhum texto legal que define o que é desinformação, quem será o responsável por decidir o que é verdade e o que é mentira? Essa função cabe ao Ministério Público, e não à AGU. Se não derrubarmos esse decreto, o Lula pode usá-lo para patrulhar pensamentos, censurar críticas e perseguir adversários. Espero que o Ministério Público acolha a minha representação e atue junto à Suprema Corte para derrubar essa medida — afirmou Sampaio, em vídeo publicado nas redes sociais.
O deputado federal Lucas Redecker (PSDB-RS) também se manifestou: — Questiono se o tal decreto que cria uma Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia é realmente uma necessidade ou apenas uma forma de controlar críticas às políticas públicas?
Outro a fazer oposição à medida foi o deputado federal Kim Kataguiri (UB-SP). Ele avaliou que a novidade irá “servir de patrulha do pensamento”.
Após a repercussão, a AGU afirmou, em nota, que “sob nenhuma hipótese” irá “cercear opiniões, críticas ou atuará contrariamente às liberdades públicas consagradas na Constituição Federal”. O comunicado ressaltou que “a divulgação de informação com erro não intencional não é desinformação”.
A advocacia federal afirmou que há precedentes no Supremo Tribunal Federal (STF) e que “a desinformação se caracteriza por fatos inverídicos ou supostamente descontextualizados levados ao conhecimento público de maneira voluntária com o objetivo de prejudicar a adequada execução das políticas públicas, com real prejuízo à sociedade”.
O órgão ainda comunicou que a regulamentação da nova estrutura irá passar por análise de especialistas e instituições de defesa da democracia. “A AGU está, no momento, em tratativas internas para a estruturação da procuradoria. Essa regulamentação deverá ser submetida à consulta pública para permitir que diferentes setores da sociedade, incluindo especialistas e representantes de outros órgãos e instituições imbuídos da defesa da democracia, como a própria imprensa profissional, possam opinar e sugerir aprimoramentos”, disse o organismo.
A advocacia da União frisou que a desinformação “mina a confiança nas instituições” e disse que buscará atuar com parcerias junto a agências de checagem e sociedade civil, a exemplo do que fez o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na eleição de 2022.
O advogado Fabiano Machado da Rosa, especialista em compliance, entende que a medida é positiva.
— A criação de uma procuradoria de defesa da democracia confirma o compromisso de Estado com a proteção da cidadania, das liberdades individuais e das instituições da República que foram tão atacadas - ainda são - por movimentos antidemocráticos. Vejo como mais um passo na reconstrução da normalidade política e jurídica do Brasil — afirma o advogado.