Ouvido pela CPI da Covid desde a manhã desta quarta-feira (7), o ex-diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, recebeu ordem de prisão às 17h25min, depois que o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM) o acusou de ter mentido e omitido informações.
Diálogos do ex-diretor com intermediários da Davati Medical Supply — empresa que prometia a venda de 400 milhões de doses do imunizante AstraZeneca —, foram o principal alvo dos senadores, que entenderam haver lacunas e contradições na fala de Dias.
Para Aziz, ele cometeu "perjúrio" ao negar que havia combinado um encontro com o policial militar Luiz Paulo Dominghetti.
Veja os principais pontos do depoimento:
Encontro em Brasília e pedido de propina
O ex-diretor confirmou que ocorreu um jantar, no dia 25 de fevereiro, em um restaurante de Brasília. Ele disse que teria ido até o local com um amigo, e encontrado por acaso o policial militar Luiz Paulo Dominguetti Pereira e o coronel da reserva Marcelo Blanco.
Segundo Dias, Dominguetti falou sobre vacinas contra a covid-19 durante o encontro. O ex-diretor negou um suposto pedido de propina e alegou ter pedido ao policial que agendasse um horário no Ministério da Saúde para que tratassem sobre o assunto. Ele reconheceu, porém, que Blanco — seu ex-assessor — sabia que ele estava no restaurante.
Mensagem sobre reunião
Em uma mensagem por áudio encontrada no celular de Dominguetti — que teve o telefone apreendido quando depôs à CPI, no dia 1° de julho —, o policial diz a um interlocutor, chamado Rafael, que teria uma reunião marcada com Dias em 25 de fevereiro, e que o então diretor do Ministério da Saúde assinaria a compra de vacinas. A mensagem foi veiculada durante a sessão desta quarta-feira. Dias manteve a versão de que não havia combinado de se encontrar com Dominguetti.
No dia seguinte ao encontro no bar, Dominguetti se reúne com Dias no Ministério da Saúde e, depois, volta a enviar mensagem ao interlocutor Rafael dizendo que havia acabado de sair do encontro. No áudio, informa que Dias iria telefonar para o representante da Davati no Brasil e conversar com o CEO da empresa para definir detalhes da compra.
Pedido de prisão
Com as controvérsias entre o áudio de Dominguetti e a fala de Dias, o presidente da CPI, Omar Aziz, ordenou a prisão do ex-diretor do governo.
— Chame a polícia do Senado. O senhor está detido pela presidência da CPI — afirmou Aziz a Roberto Dias.
O ex-diretor foi levado para a Delegacia de Polícia do Senado por volta das 17h55 e, até a publicação da reportagem, ele permanecia no local.
Aliados do governo dizem que decisão de prisão é nula
Senadores da base do governo Jair Bolsonaro se insurgiram contra a ordem de prisão do ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias. Eles alegam que a decisão não tem validade, já que o regimento determina que as comissões, temporárias ou permanentes, tenham os trabalhos suspensos quando tem início a ordem do dia no plenário.
O apelo foi feito pelo senador Esperidião Amin (PP-SC) ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
— Enquanto houver ordem do dia no Senado, comissões não podem funcionar — disse Pacheco. — Faço apelo a Omar Aziz que suspenda trabalhos da CPI em razão do funcionamento do plenário.
Pacheco disse que iria aguardar um relato da Secretaria-Geral da Mesa sobre o momento em que o pedido de prisão foi dado para decidir se anula a prisão
Conversa com representante da Davati
Em seu depoimento, o ex-diretor disse que não era responsável por negociar vacinas — segundo ele, essa responsabilidade seria da Secretaria-Executiva da Saúde. Dias reconheceu, no entanto, que chegou a conversar por WhatsApp com Cristiano Carvalho, representante da Davati, dias antes do jantar.
O jornal Folha de S. Paulo mostrou que o ex-dirigente procurou Carvalho em 3 de fevereiro para questioná-lo sobre a oferta das doses. À CPI, Dias alegou que estava somente checando se a proposta era verdadeira, e não negociando imunizantes. Ele também afirmou que ficou sabendo sobre a oferta de 400 milhões de doses por meio de Blanco, e que recebeu em outro dia o reverendo Amilton Gomes de Paula (que também buscava intermediar a negociação com a Davati).
Ex-diretor nega participação em negociação da Covaxin
Em fala inicial à CPI, Dias afirmou que não teve participação na negociação do contrato de compra da vacina indiana Covaxin. O servidor da pasta Luis Ricardo Miranda, também em depoimento ao colegiado, citou seu nome como um dos responsáveis pela "pressão" para que o negócio fosse agilizado.
Ao rebater as acusações do servidor e de seu irmão, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), Dias questionou as intenções de ambos. O ex-diretor afirmou que negou pedido de cargo para o irmão de Miranda e, por isso, imaginou estar sendo alvo de "retaliação".
Dias tentou colocar sob suspeita a movimentação do parlamentar no caso.
— Teria eu atrapalhado algum negócio do deputado? — levantou Dias, afirmando que Luis Miranda tem um "currículo controverso que é de conhecimento público".
Repasse de propostas
Apesar de ordem interna para centralizar discussões referentes a imunizantes na área comandada pelo coronel da reserva Elcio Franco, ex-braço direito de Eduardo Pazuello, Dias disse que não repassou as propostas ao então secretário-executivo da Saúde por "falta de documentos da Davati". O ex-diretor também relatou à comissão ter sofrido interferências da Secretaria-Executiva, citando o fato de que dois de seus auxiliares foram trocados por militares, que teriam "contato direto" com a cúpula da pasta.