O ministro Ricardo Salles, que pediu demissão na tarde desta quarta-feira (23), protagonizou uma série de polêmicas à frente do Ministério do Meio Ambiente, pasta que dirigiu desde o início do governo de Jair Bolsonaro, em 2019.
O legado de Salles, que teve bate-boca nas redes sociais e ataques a autoridades, está relacionado ao desmatamento e ao desgaste com parcerias de fora do país. Ele deixa a pasta na mira de inquéritos do Supremo Tribunal Federal (STF). Veja alguns dos momentos mais marcantes da gestão:
Fundo Amazônia
Nos primeiros meses de governo, o ministro tentou modificar as regras do Fundo Amazônia, projeto bilionário de preservação do bioma que era financiado, em parte, por países como Alemanha e Noruega. Sem apresentar provas, Salles anunciou que os recursos poderiam ser usados para indenizar proprietários de terras e que havia indícios de irregularidades nos contratos com ONGs.
O governo brasileiro editou um decreto que dissolveu o Comitê Orientador do Fundo Amazônia (Cofa) e o Comitê Técnico do Fundo Amazônia (CTFA), que faziam o fundo acontecer. À época, a Noruega declarou que, "dada a conjuntura atual", o país não tinha "fundamento jurídico e técnico" para realizar a contribuição anual do Fundo Amazônia.
Salles paralisou os repasses a novos projetos no início do governo Bolsonaro, com o argumento de ter encontrado "fragilidades" nos projetos. Paralelamente, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que administra os recursos, afastou sua chefia do Departamento de Meio Ambiente, que cuidava do programa. Nunca veio à tona qualquer prova de irregularidades na gestão do fundo, que tem seus resultados publicados regularmente.
Concessão de parques
Em abril de 2019, Salles comunicou oficialmente a concessão de áreas verdes do Rio Grande do Sul. Os parques nacionais de Canela e São Francisco de Paula, na serra gaúcha, foram incluídos na lista de empreendimentos a serem concedidos à iniciativa privada nos próximos anos.
O governo federal aprovou a concessão desses parques no Rio Grande do Sul para exploração turística, em um modelo de manejo florestal em bases sustentáveis que, conforme o Executivo, permite o benefício econômico, mas proporciona às florestas capacidade de se recuperar ao longo do tempo.
Juntos, os parques da Serra Geral e Aparados da Serra, além das florestas nacionais de Canela e São Francisco de Paula, deverão receber cerca de R$ 425 milhões em investimentos durante 30 anos.
“Passando a boiada”
Uma das principais polêmicas da gestão de Salles foi quando sugeriu "ir passando a boiada", alterando regras ambientais, enquanto imprensa e sociedade estavam preocupados com a pandemia da covid-19. A manifestação foi feita durante reunião ministerial de 22 de abril de 2020.
— Enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de covid e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. De Iphan, Ministério da Agricultura, ministério do Meio Ambiente, de ministério disso, ministério daquilo. Agora é hora de unir esforços pra dar de baciada a simplificação. É de regulatório que nós precisamos, em todos os aspectos — disse.
Bate-boca nas redes
Em abril de 2021, um dia antes de ter início a conferência internacional sobre as mudanças climáticas convocada pelo presidente norte-americano, Joe Biden, Salles passou parte do dia envolvido em bate-boca pelas redes sociais com pessoas que pediam sua saída do cargo. Depois de cantora Anitta publicar, em seu perfil no Twitter, uma foto do ministro e escrever "#FORASALLES desserviço para o meio ambiente", o ministro reagiu à publicação e respondeu: "Fica na sua aí, ô Teletubbie ! #FicaSalles".
Em outubro do ano passado, ele chamou o ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, de Maria Fofoca. O ataque ocorreu após uma nota publicada pelo jornal O Globo, afirmando que Salles estava "esticando a corda" com militares do governo. O ministro do Meio Ambiente entendeu que seria uma declaração de Ramos, que negou ter feito o comentário.
Dias depois, em mensagem também publicada nas redes sociais, Salles pediu "desculpas pelo excesso" ao chamar Ramos de Maria Fofoca. O ministro da Secretaria de Governo, por sua vez, disse que "uma boa conversa apazigua as diferenças".
Na sequência, uma publicação feita pelo perfil de Salles se referiu ao então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, como Nhonho. Trata-se de um apelido utilizado de forma pejorativa pelos bolsonaristas contra o então presidente da Câmara, em referência ao personagem da série mexicana Chaves, interpretado pelo ator Édgar Vivar. A palavra "nhonho" é também popularmente usada para se referir a uma pessoa "tonta", que só fala besteira.
Alvo da Justiça
A Justiça precisou interferir, em setembro do ano passado, em ações de órgãos ligados ao Ministério do Meio Ambiente. O objetivo era evitar que áreas de preservação ambiental fossem exploradas sem prejuízo aos infratores.
À época, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), presidido pelo ministro, aprovou a extinção de duas resoluções que delimitavam as áreas de proteção permanente (APPs) de manguezais e de restingas do litoral brasileiro.
Inquéritos
Em abril de 2021, a Polícia Federal do Amazonas enviou uma notícia-crime contra Salles ao Supremo Tribunal Federal, depois que ele fez afirmações contraditórias a respeito de uma operação que apreendeu 200 mil metros cúbicos de madeira extraída ilegalmente da Amazônia.
Em maio, junto do presidente do Ibama, Eduardo Bim, Salles foi alvo de operação da Polícia Federal que investiga exportação ilegal de madeira para Estados Unidos e Europa. O Supremo autorizou a quebra dos sigilos bancário e fiscal do ministro.