Conteúdo verificado: Vídeo que circula no Facebook afirmando que um viaduto inaugurado na BR-277 no município de Foz do Iguaçu (PR) foi obra do governo de Jair Bolsonaro.
São falsas as afirmações feitas em um vídeo que circula no Facebook e atribui ao governo de Jair Bolsonaro (sem partido) a construção de um viaduto entre a BR-277 e a Avenida Costa e Silva, no município de Foz do Iguaçu (PR). No vídeo, um homem destaca a rapidez com que a obra foi concluída, insinuando que essa seria uma marca do atual governo, e afirma que sua realização não teria sido possível sem a Operação Lava-Jato. Na realidade, a obra foi feita pelo governo do Estado do Paraná, integralmente com recursos próprios, e não tem nenhuma relação com o governo federal, como confirmaram ao Comprova o governo paranaense e o próprio Ministério da Infraestrutura.
O Comprova não identificou nenhuma relação entre o viaduto e a Lava-Jato, como a que foi citada no vídeo. Acordos de leniência fechados pela operação no Paraná de fato resultaram em valores destinados a obras viárias no estado, mas não foi o caso do viaduto em questão. Segundo a própria força-tarefa, é o governo estadual o responsável por destinar os recursos dos acordos de leniência. Ao Comprova, o governo do Paraná disse que a relação entre a Lava Jato e esse viaduto “não se aplica”.
O comprova tentou contato com a página do Facebook que publicou o conteúdo e com a página “Zap Bolsonaro”, cuja marca d’água aparece no vídeo, mas não obteve resposta.
Como verificamos?
O ponto de partida para a verificação foi um trecho da fala contida no vídeo, na qual um homem informa que está no município de Foz do Iguaçu em uma sexta-feira, dia 6, às 16h05min. Fizemos uma busca com esses termos no Google, cujo resultado apontou para uma nota do governo estadual do Paraná informando a inauguração de um viaduto na cidade no dia 6 de dezembro de 2019, uma sexta-feira. Outras informações do vídeo, como a citação da BR-277 e da Avenida Costa e Silva, confirmaram que se tratava da mesma obra.
Além disso, analisamos alguns frames do vídeo e comparamos com imagens do Google Street View para verificar se o local em que o homem fez o vídeo é, de fato, o viaduto na BR-277. As imagens mais recentes do banco de dados do Google datam de dezembro de 2018, antes, portanto, da conclusão do viaduto, mas é possível localizar nelas dois prédios e um outdoor que também aparecem no vídeo, como mostra a imagem abaixo.
Com isso, procuramos a assessoria de imprensa da Secretaria de Infraestrutura e Logística do Estado do Paraná e o Departamento de Estradas de Rodagem do Paraná (DER/PR) para entender de quem é a responsabilidade pela obra e verificar a veracidade das alegações feitas no vídeo. Também procuramos o Ministério da Infraestrutura, do governo federal, a assessoria de imprensa da Presidência e da força-tarefa da Operação Lava-Jato.
Por fim, enviamos uma mensagem para a página do Facebook que publicou o conteúdo, mas não obtivemos resposta. Também procuramos a página Zap Bolsonaro, cuja marca d’água aparece no vídeo, mas não houve resposta.
Você também pode refazer o caminho da verificação acessando os links disponíveis na reportagem.
Verificação
O viaduto
A obra que aparece no vídeo é um viaduto localizado no quilômetro 725 da rodovia federal BR-277. Localizada em Foz do Iguaçu, no oeste paranaense, a ponte foi construída para desafogar o trânsito no cruzamento da rodovia com a avenida Costa e Silva, facilitando o acesso aos bairros da região norte e central da cidade e agilizando o tráfego de caminhões que seguem em direção às fronteiras com o Paraguai e a Argentina.
O Ministério da Infraestrutura informou que o “governo federal não tem relação com a obra na BR-277, em Foz do Iguaçu”. A Secretaria de Infraestrutura e Logística, do governo do Paraná, confirmou que a obra não teve participação de outras autoridades e foi realizada inteiramente com recursos estaduais. O viaduto, que tem duas pistas com acostamento e 22 metros de largura, recebeu um investimento total de R$ 18,4 milhões.
Operação Lava-Jato
No vídeo, um homem afirma sucessivas vezes que a inauguração do viaduto não teria sido possível sem a Operação Lava-Jato. As falas sugerem que a obra foi realizada sem que houvesse corrupção dos agentes envolvidos na construção — segundo o vídeo, diferentemente do que acontecia nos governos anteriores.
O homem que narra o vídeo chega a afirmar que Fernando Haddad (PT), candidato derrotado nas eleições presidenciais de 2018, teria prometido acabar com a Lava-Jato caso fosse eleito. O Comprova encontrou manifestações públicas de Haddad que mostram o contrário. Em outubro daquele ano, o petista disse que iria dar apoio a Lava-Jato.
— Reitero a você: PF, MP, Poder Judiciário receberão apoio para fazer o que viemos fazendo até aqui: não vamos botar sujeira para debaixo do tapete. Vamos continuar as investigações em busca da verdade — afirmou em entrevista à Rádio Jornal Caruaru, de Pernambuco.
Dias depois, Haddad também disse, em entrevista ao SBT, que o ex-juiz Sergio Moro fez um bom trabalho na condução da operação, mas que a sentença contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi “um erro que vai ser corrigido pelos tribunais superiores porque ele não apresentou provas contra o presidente”.
Em contato com o Comprova, a assessoria de comunicação do governo paranaense informou, por mensagem, que a obra do viaduto não tem nenhuma relação com a Operação Lava-Jato.
A Lava-Jato e o Paraná
Em agosto de 2019, a força-tarefa da Lava Jato do Ministério Público Federal (MPF) firmou um acordo de leniência com a empresa Ecorodovias, controladora das concessionárias Ecovia e Ecocataratas, que atuam no Paraná. O acordo é referente a diversos atos de corrupção e lavagem de dinheiro relacionados a contratos firmados entre a empresa e órgãos públicos. A Ecorodovias reconheceu o pagamento de propinas para obter modificações benéficas à concessionária em contratos desde o ano 2000.
Com a leniência, a empresa deverá pagar R$ 400 milhões até o fim das concessões, que se encerram em 2021. Do total, R$ 30 milhões foram pagos como multa. Os outros R$ 370 milhões serão utilizados para reparação de danos, dos quais R$ 220 milhões para a redução do preço de pedágio de todas as praças da Ecorodovias e R$ 150 milhões serão destinados à execução de obras nas rodovias.
No dia 9 de dezembro de 2019, o governo do Paraná anunciou quais obras seriam beneficiárias do valor recebido graças ao acordo com o MPF. São elas: o Trevo Cataratas da BR-277 em Cascavel; melhorias nas vias marginais na BR-277, em Foz do Iguaçu, e terceiras faixas entre Cascavel e Guarapuava; e a duplicação da rodovia PR-407 no entroncamento com a PR-412. Uma dessas melhorias, de acordo com a Agência de Notícias do Governo do Paraná, deve acontecer em Foz do Iguaçu, nas vias marginais entre o Trevo Charrua e o Viaduto Costa e Silva, que já havia sido concluído e liberado para tráfego.
Vale ressaltar que as obras do viaduto entre a BR-277 e a Avenida Costa e Silva, alvos da investigação, foram concluídas no dia 6 de dezembro de 2019. Já o anúncio das obras que iriam receber a verba do acordo de leniência foi feito no dia 9 de dezembro de 2019 — três dias depois. Ou seja, o recurso proveniente do acordo não foi utilizado na obra verificada pelo Comprova.
A assessoria de imprensa do Ministério Público Federal no Paraná, responsável pela Lava -Jato afirmou em nota que a destinação de recursos recuperados no âmbito da operação não é de competência da força-tarefa. Informou, também, que em 2019 assinou os acordos de leniência citados acima e sugeriu que os questionamentos sobre a obra na BR-277 fossem direcionados ao governo do Paraná.
Páginas que reproduziram o vídeo
A página “Intervenção constitucional militar já brasil clama Fortaleza-ce”, que publicou o vídeo falso analisado pelo Comprova, tem 38 mil curtidas e 122 mil seguidores. Em geral, ela publica conteúdos a favor de Bolsonaro, contra a imprensa e pedindo o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF). O próprio nome da página pede uma intervenção militar constitucional o que, como mostrou o Aos Fatos, não é possível.
O vídeo possui uma marca d’água com os dizeres “Zap Bolsonaro” e o endereço de um site. Nas redes sociais, o blog citado publica notícias envolvendo o presidente Jair Bolsonaro e conteúdos correlatos. Além disso, os administradores do site possuem diversos grupos no WhatsApp para a divulgação dos mesmos conteúdos e afirmam, no site, que “os grupos são somente para distribuição de informações pré-conferidas, para evitar FAKE NEWS” e que os grupos não são abertos para discussões ou bate-papo.
Por que investigamos?
Em sua terceira fase, o Projeto Comprova investiga conteúdos sobre políticas públicas do governo federal que possam provocar desinformação nas redes sociais. É o caso do vídeo objeto desta verificação, que faz afirmações falsas sobre uma obra pública para atribuir sua realização ao presidente Jair Bolsonaro. Segundo dados da plataforma CrowdTangle, até a data de fechamento deste texto, o vídeo somava mais de 177 mil interações no Facebook, tendo sido compartilhado 89.351 vezes.
Com a proximidade das eleições municipais, vídeos como esse podem contribuir negativamente para os debates políticos no país. Quando a desinformação passa a integrar o cenário eleitoral, discussões sobre os projetos e agendas dos candidatos são prejudicadas, dificultando a escolha dos eleitores.
Postagens contendo informações falsas ou enganosas sobre obras públicas frequentemente viralizam nas redes sociais. O Comprova já verificou um boato que atribuiu erroneamente a construção de uma ponte entre os estados do Acre e Rondônia apenas ao governo Bolsonaro, uma postagem que usou fotos de outras estradas para afirmar que o Exército realizou reparos na rodovia Transamazônica e uma sequência de imagens que conferiam ao governo Bolsonaro a responsabilidade sobre obras realizadas em governos anteriores.
Falso para o Comprova é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Projeto Comprova
Depois de um período especial de 75 dias dedicado exclusivamente à verificação de conteúdos suspeitos sobre o coronavírus e a covid-19, o Projeto Comprova começou em 10 de junho a terceira fase de suas operações de combate à desinformação e a conteúdos enganosos na internet.
O objetivo da iniciativa é expandir a disseminação das informações verdadeiras. Nesta terceira etapa, o Comprova vai retomar o monitoramento e a verificação de conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal e eleições municipais, além de continuar investigando boatos sobre a pandemia de covid-19.
Este conteúdo foi investigado por Nexo e Piauí e verificado por GaúchaZH, Folha, Estadão, UOL, Band News FM e SBT.
Fazem parte da coalizão do Comprova veículos impressos, de rádio, de TV e digitais de grande alcance. É possível enviar sugestões de conteúdos duvidosos e que podem ser verificados por meio do site e por WhatsApp (11 97795-0022). GaúchaZH publicará conteúdos checados pela iniciativa. O Comprova tem patrocínio de Google News Initiative (GNI), Facebook Journalism Project, First Draft News e WhatsApp e apoio da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP). A coordenação é da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)