Legalizadas em apenas oito países do mundo, as corridas de galgos estão causando polêmica em Bagé depois que a prefeitura anunciou investimento de R$ 251 mil na construção de um centro de eventos para os criadores da raça. Defensores da causa animal reclamam de maus tratos, uso de anabolizantes e realização de apostas clandestinas na pista de corridas do município. Os criadores admitem as apostas, mas refutam qualquer maldade contra os cães.
A ordem de serviço para as obras foi assinada na sexta-feira (14) pelo prefeito Divaldo Lara (PTB). Os recursos foram obtidos junto ao governo federal, por meio de emenda parlamentar do deputado Dionilso Marcon (PT). A previsão é de que em quatro meses seja erguida no Parque do Gaúcho uma estrutura de 150 metros quadrados com salão, cozinha, banheiros e churrasqueira.
Desde 2012 o local abriga uma pista de corridas utilizada aos finais de semanas pelos criadores da raça no município. Com a proibição das corridas no Uruguai e na Argentina, Bagé acabou atraindo criadores dos países vizinhos, para realização de disputas internacionais. Também há registros de provas em Santana do Livramento, Quaraí e Uruguaiana.
Em geral, de três a cinco cães disputam cada prova, cuja extensão é de 200 metros em cancha reta. Os animais ficam dispostos lado a lado num partidor, presos pelos próprios donos. Dada a largada, os galgos saem em disparada atrás da “bruxa”, um simulacro de lebre confeccionado com um saco de milho colocado dentro de uma garrafa pet.
Presidente do Núcleo Bajeense de Proteção Animal, Patrícia Coradini diz que no último ano foram resgatados 60 galgos na cidade, a maior parte com fraturas ou ferimentos provocados durante as corridas. Há também animais com atrofia muscular causada pelo uso intensivo se anabolizantes
— Aumentou demais nos últimos anos o número de galgos abandonados. Muitos criadores não têm dinheiro para o tratamento ou simplesmente largam o cachorro porque o animal não consegue mais correr. É comum a gente chegar segunda-feira e encontrar um cão com a pata quebrada na porta do núcleo — conta Patrícia.
Vinculada à causa animal, a vereadora Beatriz Souza (PSB) diz que o parque é usado sem autorização formal por meio de convênio ou parceria com o grupo de criadores.
— Em 2017, pedi informações à prefeitura sobre o uso do espaço por uma suposta associação de criadores, mas jamais recebi resposta. Vou fazer uma representação ao Ministério Público – afirma a vereadora.
Para o presidente da Associação Bajeense de Criadores de Galgo, Tita Nogueira, a entidade é alvo de uma briga política entre as protetoras e a prefeitura. Dono do canil Irmãos Nogueira e com quatro cães em casa, um deles o galgo Trovador, bi-campeão do Mercosul no biênio 2016/2017, ele diz que jamais houve maus tratos durante as provas e de que os animais são corredores por natureza.
— São galgos puros, que correm de dois em dois meses. Termina a corrida, toma um banho e volta para casa. São cuidados como se fossem da nossa família. Já chamei as protetoras para virem aqui ver como eles são tratados, mas nunca vieram — reclama.
Nogueira conta que os animais recebem ração, creatina e aminoácidos para melhorar o rendimento, dormem dentro de casa por serem mais sensíveis ao calor e jamais são abandonados. Ele admite as apostas em dinheiro, o que considera “natural no esporte.”
— Nunca vi um galgo solto por aí. Somos cerca de 40 criadores aqui em Bagé e quando tem prova vem gente de todo o Brasil, da Argentina, do Uruguai. Cada um casa R$ 50 e quem ganha leva o bolo. No UFC, apostam milhões para ver dois homens se matar num ringue e ninguém fala nada — retruca.
Um projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados discute a proibição das corridas de galgos no país. Autor da emenda que destinou os R$ 251 mil para a criação do centro de eventos, Marcon disse que não sabia se tratar de uma obra para os criadores dos cães de corrida.
— Sei que eles têm eventos internacionais lá em Bagé com os galgos. Me pediram a emenda e eu dei, mas não sabia que era específica para isso — comenta.
Divaldo Lara afirma que a pista de galgos foi construída na gestão anterior, do PT, a mesma que pediu a emenda para Marcon. Segundo o prefeito, os recursos têm destinação específica para o centro de eventos, não podendo ser destinados para outra obra. Portanto, ele decidiu melhorar a estrutura de uma atividade que é regulamentada no município.
— Nunca tive notícia de maus tratos ou apostas, tanto que optei por construir o centro a devolver o dinheiro. Temos várias políticas de atendimentos aos animais na cidade, mas essas protetoras são de um grupo radical que atuou na gestão anterior, a mesma que pediu a emenda — comenta Divaldo.