A mais recente crise no PSL, com a ameaça velada do presidente Jair Bolsonaro de deixar o partido, pode jogar a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados numa disputa fratricida em torno dos próprios mandatos. Por trás da beligerância interna se move uma cobiça por tempo de propaganda no rádio e na TV e acesso a verbas milionárias. Na linha de frente do embate estão justamente os dois personagens com situação mais confortável diante das regras eleitorais, o próprio Bolsonaro e o presidente da legenda, Luciano Bivar.
Como é detentor de cargo majoritário, Bolsonaro não corre risco de perder o mandato em caso de troca de partido. De acordo com a legislação, somente quem se elegeu em uma disputa proporcional (deputados estaduais, federais e vereadores) estão sujeitos à perda do assento por infidelidade partidária. Dessa forma, presidente da República, governadores, prefeitos e senadores podem migrar a qualquer tempo.
Já na Câmara a situação é bem diversa. Com 53 deputados, o PSL hoje só tem menos parlamentares do que o PT. Como a próxima janela partidária só será aberta em março de 2022 — a sete meses da próxima eleição —, os descontentes que desejarem seguir Bolsonaro numa transferência para outro partido estão praticamente forçados a permanecer.
Uma fuga sem cobertura legal fatalmente levará à cassação do mandato. Nem mesmo se o presidente criar um novo partido será possível a fuga dos deputados. Essa possibilidade acabou retirada da legislação em 2015, de forma que a criação, fusão ou incorporação de agremiações não garante mais a manutenção do mandato.
— Como não consta mais na lei o dispositivo que garantia o mandato quando se tratava de ida para uma nova legenda, resta alegar perseguição política. Mas, no mundo do direito público, essa situação é uma das mais difíceis de provar. Ela não deixa rastro, é imaterial — afirma o advogado eleitoral Antônio Augusto Mayer dos Santos.
Um dos principais especialistas do Estado no tema, Mayer diz que uma alternativa para os parlamentes é sustentar diante da Justiça Eleitoral que o partido mudou sua linha ideológica. No grupo disposto a seguir Bolsonaro fora do PSL, já se discute alegar que os deputados foram eleitos à sombra da imagem do presidente, e não graças ao programa doutrinário do partido. Neste caso, como o mandato foi conquistado num movimento de culto à personalidade de Bolsonaro, não faria sentido eles permanecerem numa legenda da qual o presidente não faz mais parte.
— Essa é uma boa tese. Acredito que há uma chance considerável de prosperar — afirma o advogado.
Outra alternativa seria conseguir um salvo-conduto do partido, um documento avalizado pelo presidente ou algum colegiado de dirigentes, como o diretório ou a executiva, garantindo que o parlamentar não será alvo de demanda judicial pelo mandato. Com o PSL em clima de guerra, essa possibilidade é praticamente nula.
Seja qual for o cenário futuro, o certo é que Luciano Bivar não deve perder os R$ 480 milhões de fundo eleitoral e partidário previsto para o PSL em 2020. O cálculo da fatia de cada legenda é feito sobretudo com base no número de cadeiras conquistadas no Congresso na eleição anterior. O único caso em que o parlamentar leva consigo para a nova sigla o respectivo tempo de propaganda é quando o partido não ultrapassa a cláusula de barreira.