O nome do presidente Jair Bolsonaro aparece em uma planilha apreendida pela Polícia Federal (PF) durante a investigação de um suposto esquema de candidaturas laranjas do PSL em Minas Gerais. A planilha da gráfica Viu Mídia lista pagamentos recebidos por serviços eleitorais em uma coluna intitulada "NF" — sigla que, no entendimento dos investigadores, se refere a nota fiscal — e, em outra, com o título "out" — o que, para a PF, indica o pagamento "por fora". No documento, há referência ao fornecimento de 2 mil unidades de material eleitoral à campanha de Bolsonaro, sendo R$ 4.200 "out" e R$ 1.550 com "NF". As informações são do jornal Folha de S.Paulo.
A Polícia Federal investiga a suspeita de um esquema de desvio de verbas públicas de campanha do PSL nas eleições de 2018, que desviou recursos que, por lei, deveriam ser aplicados em candidaturas femininas do partido. A investigação resultou no indiciamento e na denúncia contra o ministro do Turismo, Álvaro Antônio, deputado federal mais votado em Minas Gerais e coordenador no Estado da campanha presidencial de Bolsonaro. Ele é acusado dos crimes de falsidade ideológica eleitoral, apropriação indébita de recurso eleitoral e associação criminosa.
A Viu Mídia prestou serviços a duas da candidatas suspeitas de serem "laranjas" do PSL. A empresa também foi contratada pelo partido e, em menor volume, forneceu material ao atual ministro do Turismo. Apesar da citação da campanha de Bolsonaro na planilha apreendida pela Polícia Federal, não há registro, na prestação de contas entregue pelo presidente à Justiça Eleitoral, de gastos com a empresa. Já na prestação de contas de Álvaro Antônio à Justiça, há registro de gasto de R$ 280 com a Viu Mídia.
"Essa análise (da planilha) demonstra indícios de que os valores pagos para produção de material gráfico para Naftali e Camila (duas das candidatas laranjas) foram utilizados para a produção de material gráfico para outros candidatos do PSL", afirma o relatório da Polícia Federal, em posse do Ministério Público de Minas Gerais.
Outra citação à campanha do presidente partiu do depoimento de um dos presos pela Polícia Federal, segundo a Folha de S.Paulo. Haissander Souza de Paula, assessor parlamentar de Álvaro Antônio à época e coordenador de sua campanha a deputado federal no Vale do Rio Doce (MG), disse em seu depoimento à PF que "acha que parte dos valores depositados para as campanhas femininas, na verdade, foi usada para pagar material de campanha de Marcelo Álvaro Antônio e de Jair Bolsonaro".
No depoimento em que aponta suspeitas de caixa 2 na campanha de Álvaro Antônio e de Jair Bolsonaro, Haissander afirma ainda que "com certeza Lilian não gastou os R$ 65 mil recebidos". A declaração se refere a Lilian Bernardino, uma das quatro candidatas suspeitas de serem laranjas. As mulheres, apesar de figurarem no topo das que nacionalmente mais receberam verba pública do PSL, não apresentaram sinais evidentes de que tenham realizado campanha. Juntas, as quatro receberam um total de R$ 279 mil de verba pública do partido e alcançaram apenas 2.074 votos.
O depoimento de Haissander, que integra os autos da investigação, foi dado nove horas depois de ele ser preso, no dia 27 de junho. A demora ocorreu devido à espera por um advogado, que não chegou a tempo. Posteriormente, no interrogatório de custódia, o ex-assessor afirmou que não confirmava as declarações que havia dado anteriormente. A defesa tentou invalidar o primeiro depoimento, mas a Justiça negou o pedido, argumentando que "todas as garantias constitucionais e legais restaram asseguradas, dentre elas a prévia ciência de permanecer em silêncio".
Contraponto
Em nota, a defesa de Marcelo Álvaro Antônio afirma que a investigação das candidaturas laranjas do PSL não apontou nenhum ato irregular do ministro. "Não concordamos com os artifícios da teoria do domínio do fato, uma vez que, em matéria de direito penal, presumir conduta é um artifício e não se compatibiliza com diversos princípios constitucionais, como o da presunção de inocência, da legalidade e da intranscendência da pena", diz o texto. Domínio de fato é a tese segundo a qual o ocupante de cargo mais alto de um esquema nem sempre atua diretamente nas fraudes, mas tem conhecimento sobre elas.
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do Palácio do Planalto afirmou que não comentaria. Haissander Souza de Paula, ex-assessor parlamentar de Álvaro Antônio, e a empresa Viu Mídia não foram localizados.