BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro (PSL) distorceu nesta quinta-feira (26) uma decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para defender uma punição para a Folha de S. Paulo.
Bolsonaro disse erroneamente, em sua live nas redes sociais, que a corte eleitoral decidiu nesta quinta que "não houve disparo em massa pelo WhatsApp pelo candidato Jair Bolsonaro".
"No ano passado, a Folha de S.Paulo, sempre a Folha, né!? Impressionante, tudo começa com a Folha. Fez uma matéria me acusando de disparar em massa WhatsApp, né, para fins eleitorais. A Folha publicou e o que o PT fez? Entrou com uma ação no TSE. E o que o TSE fez? apurou, está certo? E a decisão saiu hoje. Hoje o TSE decidiu: não houve disparo em massa pelo WhatsApp pelo candidato Jair Bolsonaro e ponto final. Então, houve o fake news da Folha. E depois deu trabalho ao TSE. Agora, tinha de ter uma punição para o PT. Tinha de ter uma punição para a Folha de S.Paulo. Não pode publicar as coisas. É comum acontecer isso daí", disse.
Não houve, porém, qualquer decisão do TSE neste sentido.
Mais tarde no Twitter, Bolsonaro voltou ao assunto e disse que havia sido "absolvido" pelo TSE, outra informação que não procede.
"O TSE decidiu hoje que não houve disparos em massa de mensagens via WhatsApp durante campanha eleitoral pelo então candidato à Presidência da República, @jairmessiasbolsonaro . Mais uma narrativa montada pelos canalhas jogada na latrina!", escreveu.
Bolsonaro se refere a uma ação movida pela coligação liderada por seu opositor na disputa, Fernando Haddad (PT), que pediu uma investigação contra o hoje presidente da República por abuso de poder econômico. A ação foi baseada na reportagem "Fraude com CPF viabilizou disparo de mensagens de WhatsApp na eleição", publicada em dezembro de 2018 pela Folha de S. Paulo.
Nela, o jornal traz relatos e documentos que detalham como operam as empresas que fazem o envio de mensagens em massa pelo WhatsApp.
A reportagem mostra ainda como a rede de empresas recorreu ao uso fraudulento de nome e CPF de idosos para registrar chips de celular e garantir o disparo de lotes de mensagens em benefício de políticos.
Entre as agências envolvidas no esquema está a Yacows. Especializada em marketing digital, ela prestou serviços a vários políticos e foi subcontratada pela AM4, produtora que trabalhou para a campanha do presidente Bolsonaro.
Trata-se de uma das duas ações que a coligação de Haddad entrou TSE sobre o envio massivo de conteúdo via aplicativo de mensagem. A segunda ação já se encontra no plenário da corte, mas houve um pedido de vista.
O relator da ação citada por Bolsonaro, o corregedor-geral de Justiça Eleitoral Jorge Mussi, de fato proferiu uma decisão nesta quinta. Mas nela Mussi negou pedidos de produção de prova feitos pelo advogados de Haddad e abriu prazo para as alegações finais de ambas as partes.
Depois dessa etapa, falta ainda manifestação do Ministério Público Eleitoral e só posteriormente o caso segue para o plenário do TSE --momento em que tanto Mussi quanto os demais ministros do tribunal eleitoral apresentarão os seus votos e haverá uma decisão da corte do tribunal sobre o tema.
Em sua live, Bolsonaro acusou a Folha de S. Paulo de publicar fake news e reafirmou que não houve disparo massivo de mensagens via WhatsApp por sua campanha.
"Eu quero ver o que os jornais vão publicar amanhã, se é que vão publicar alguma coisa sobre a decisão do TSE no dia de hoje. Repito, segundo o TSE não houve disparo em massa pelo WhatsApp por ocasião da campanha eleitoral do candidato Jair Bolsonaro. Ponto final", afirmou.
Na decisão desta quinta, Mussi negou uma série de pedidos da coligação de Haddad, autora da ação. Os advogados do petista haviam solicitado, por exemplo, que a Folha de S. Paulo entregasse arquivos e documentos citados na reportagem. Também houve pedido para que o WhatsApp fizesse o mesmo, além de requerimentos de quebra dos sigilos fiscais e telefônicos de empresas mencionadas no texto.
Foi pedido ainda a oitiva de dois repórteres que assinam o texto, além de outras testemunhas.
A defesa de Bolsonaro, por sua vez, solicitou a oitiva de uma testemunha.
Mussi negou todos os pedidos feitos pelos advogados do petista e determinou que o depoimento da testemunha de Bolsonaro fosse juntado ao processo.
Sobre a requisição de documentos à Folha de S. Paulo, Mussi alegou que isso encontra "vedação na garantia constitucional do sigilo da fonte".
Já em relação à oitiva de testemunhas, o corregedor-geral de Justiça Eleitoral disse que elas "de nada acrescentariam de útil e necessário ao esclarecimento dos fatos relatados na petição inicial".
A quebra dos sigilos, de acordo com Mussi, deve ser medida "excepcional" e não se aplica no caso, uma vez que há "fragilidade do único elemento probatório" da ação". "Representado em uma única matéria jornalística, intitulada 'Fraude com CPF viabilizou disparo de mensagens de WhatsApp na eleição".
O relator diz então que as pessoas citadas na reportagem em nenhum momento admitiram qualquer ilegalidade relativa à campanha de Bolsonaro e que houve aprovação das contas eleitorais da coligação do presidente da República.
"Dada à excepcionalidade das requisições solicitadas pela parte autora, conclui-se que inexistem fundamentos idôneos que apontem para a legalidade, a necessidade e a utilidade da quebra dos sigilos constitucionais, porquanto os fatos envolvendo as pessoas, as empresas e a campanha dos investigados estão devidamente esclarecidos nos autos", diz Mussi.
"Desse modo, além do próprio cidadão espanhol negar a denúncia, inexistem indícios materiais que sustentem as dúvidas lançadas na reportagem de dezembro de 2018, estando esses acontecimentos devidamente esclarecidos pela reportagem do jornal Folha de S. Paulo/UOL de 18.6.2019 [na reportagem "Empresas contrataram disparos pró-Bolsonaro no WhatsApp, diz espanhol"]
"Incorreria a Justiça Eleitoral, sem dúvida, no constrangimento ilegal das prerrogativas constitucionais dos cidadãos e das empresas envolvidas na reportagem se concedesse as requisições", conclui o juiz.