BRASÍLIA, DF, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro (PSL) buscou encerrar o atual capítulo da crise entre os militares e a ala ideológica de seu governo. Só que o fez defendendo o pivô da confusão, o escritor Olavo de Carvalho, o que manteve o desconforto entre vários altos oficiais.
A reportagem ouviu de alguns deles a avaliação de que a própria presença de militares no governo deveria ser reavaliada caso o que chamam de ataque institucional do bolsonarismo organizado em redes sociais se mantenha contra as Forças.
Após um evento no Palácio do Planalto, o presidente disse que "o Olavo é dono do seu nariz". "Como eu sou do meu e você é do seu. Então, liberdade de expressão. Eu recebo críticas muito graves todo dia e não reclamo", disse.
"Inclusive, olha só. O pessoal fala muito em engolir sapo. Eu engulo sapo pela fosseta lacrimal e estou quieto aqui, OK?", disse (talvez o presidente estivesse se referindo a fossas lacrimais ou a fossas nasais, já que fosseta lacrimal é um órgão sensorial de algumas espécies de serpentes).
As críticas de Olavo se repetem há semanas contra generais da reserva que integram o governo, com foco no vice-presidente, Hamilton Mourão, e no ministro Carlos Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo).
Além disso, o escritor foi acompanhado nos ataques pelo filho de Bolsonaro responsável por suas redes sociais, o vereador carioca Carlos (PSC). Não houve um enquadramento incisivo deles pelo presidente.
Assim, o Alto Comando do Exército deu seu recado por meio do ex-comandante Eduardo Villas Bôas. Na segunda, o general da reserva criticou Olavo na sua conta no Twitter, o chamando de "Trótski de direita", em referência ao líder revolucionário soviético.
Isso ocorreu após Santos Cruz quase deixar o governo no fim de semana, após queixar-se com o presidente de campanha virtual de olavistas.
Só que Bolsonaro dobrou a aposta na manhã de terça (7), postando também no Twitter um desagravo ao escritor, que chamou de "ícone".
"Continuo admirando o Olavo. Quanto aos desentendimentos ora públicos contra os militares, aos quais devo minha formação e admiração, espero que seja uma página virada", escreveu.
Horas antes, Olavo havia postado no Twitter uma frase que revoltou o alto oficialato. "Há coisas que nunca esperei ver, mas estou vendo. A pior delas foi altos oficiais militares, acossados por afirmações minhas que não conseguem contestar, irem buscar proteção escondendo-se por trás de um doente preso a uma cadeira de rodas. Nem o [ex-presidente] Lula seria capaz de tamanha baixeza."
O doente em questão é Villas Bôas, que sofre de grave mal degenerativo do neurônio motor e precisa de auxílio constante. Sua doença não afeta as faculdades mentais.
A provocação não recebeu resposta pública, de acordo com o acertado entre os comandantes das três Forças em reunião que já havia sido marcada para esta terça.
Eles almoçaram com Bolsonaro e alguns ministros. O tema principal da conversa foi como executar o já anunciado e amargo contingenciamento de R$ 5,1 bilhões das despesas não-obrigatórias da Defesa deste ano --cerca de 44% do total para investimento e custeio, valor que costuma ser revertido ao longo do ano.
Segundo relatos, todos trataram de minimizar a troca de farpas. O escritor vocaliza críticas ao que considera simpatia pela esquerda por parte dos militares que integram o governo. Além de Carlos, outro filho de Bolsonaro, o deputado Eduardo (PSL-SP), é muito próximo de Olavo.
No mesmo evento no Planalto, ele defendeu Olavo.