A determinação do presidente Jair Bolsonaro (PSL) para que as Forças Armadas promovam, no dia 31 de março, atos de celebração do golpe militar de 1964, foi o gatilho para uma batalha nas redes sociais. De um lado, os que defendem a hashtag #DitaduraNuncaMais, de outro, um exército que defende o posicionamento do capitão reformado que hoje é chefe do Executivo nacional.
A avaliação é de Raquel Recuero, professora da Universidade Federal de Pelotas e pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Mídia, Discurso e Análise de Redes Sociais (MIDIARS).
— É evidente que o ato do presidente foi o estopim. Trata-se de narrativa a respeito de um fato histórico que está há tempo no discurso dele. Quando ele se pronuncia sobre o tema, o assunto volta a ter visibilidade — analisa Raquel.
O embate virtual envolveu inclusive artistas e políticos, como Gilberto Gil, Paulo Coelho e Joice Hasselmann (PSL), além do dono da rede de lojas Havan, Luciano Hang.
— As publicações das personalidades que possuem muitos seguidores sempre repercutem as hashtags e os temas de forma geral. No dia 26, dos 172 mil tweets, apenas 20 mil são tweets originais, os outros 150 mil são retweets. E, majoritariamente, quem consegue muitos RTs são pessoas com muitos seguidores. O tweet do Gilberto Gil é o terceiro mais retweetado, ficando atrás de um tweet do Marcelo Freixo (2º) e um tweet do Paulo Coelho (mais retweetado) — afirma o pesquisador Fábio Malini, da Universidade Federal do Espírito Santo.
A pesquisadora Raquel Recuero complementa que a disputa discursiva entre quem apoia o golpe militar e quem o condena também ganha fôlego com a cobertura que a imprensa dá à essa repercussão.
— O fato alimenta uma discussão na internet.
Sobre especulações de que a atitude do mandatário da nação possa ser cortina de fumaça para tirar o foco de outros temas, a professora pondera que existe essa possibilidade, embora não seja possível afirmar que, de fato, é o que ocorreu.
— Não tenho como avaliar isso. Poderia ser, mas não é possível afirmar. Temos um governo que usa muito as redes sociais e gera polêmica com isso. Se isso é estratégia ou apenas a maneira como simplesmente agem, é difícil dizer — avalia Raquel.
Segundo análise feita pelo grupo MIDIARS, percebe-se outros desdobramentos da discussão sobre ditadura nas redes sociais. Entre eles, o de que muitos dos usuários aparecem apenas retuitando mensagens de terceiros.
" (...) Em um núcleo central com mensagens que produzem um discurso bastante homogêneo, é possível identificar diversos módulos, todos com um ou poucos usuários de grande destaque (...). Esta característica indica que muitos usuários compartilhavam mensagens de apenas um dos "influenciadores" com maior visibilidade da rede (...)", pontua o estudo.
— Hoje (quarta-feira, 27) a repercussão dos usuários tem sido sobre os casos de torturas de forma mais direta, e especialmente sobre a polêmica gerada por Lobão ao se pronunciar nas redes sociais contra a ditadura militar, como visto nos trending topics hoje: “Lobão critica ditadura militar e gera polêmica”. O tema estava presente em dias anteriores, mas dá um salto de segunda para terça — afirma Malini.
Menções à hashtag #DitaduraNuncaMais no Twitter:
- 23/03: 5 tweets
- 24/03: 30 tweets
- 25/03 (noite em que Bolsonaro pede comemorações): 2063 tweets
- 26/03: 172225 tweets
- 27/03: até a hora em que foi realizada a coleta (12:18) 19858 tweets
(dados do Labic-UFES)