Por 10 a 1, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (20) que delegados de polícia podem fechar acordos de colaboração premiada. Por maioria, os ministros também firmaram o entendimento de que não é obrigatório o aval do Ministério Público ao acordo fechado pela polícia.
A Corte retomou o julgamento de uma ação da Procuradoria-Geral da República (PGR) que contestava a possibilidade de delegados de polícia firmarem acordos de colaboração premiada. O resultado impõe uma derrota ao Ministério Público, que trava uma disputa nos bastidores com a Polícia Federal sobre o controle de investigações em curso no Brasil.
Em dezembro do ano passado, o STF formou maioria a favor da legitimidade da Polícia Federal em fechar acordos, mas o julgamento não foi concluído à época porque os ministros decidiram aguardar a composição completa da Corte, considerando a relevância da questão. Na época, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski estavam, respectivamente, cumprindo agenda no exterior e de licença médica.
— A manifestação contrária do Ministério Público não se reveste de eficácia vinculante. Cabe ao magistrado, se houver o conflito entre as posições do Ministério e da autoridade policial, se isso ocorrer, essa questão deverá ser objeto de apreciação jurisdicional. Cabe ao Poder Judiciário a função de homologar o acordo. E ao homologar o acordo, compete ao Poder Judiciário verificar se as cláusulas compactuadas são proporcionais — disse Celso de Mello.
Para a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, os mecanismos de investigação colocados à disposição do Ministério Público e da polícia, como as colaborações premiadas, "voltam-se à melhor forma de se obterem as provas necessárias para que se tenha então um esclarecimento de todos os fatos".
— É preciso que haja um entendimento das instituições, porque me parece que é da atuação conjunta, integrada, dos dois órgãos que poderemos ter, nós, sociedade brasileira, melhor eficácia no esclarecimento de crimes — disse Cármen Lúcia.
Razão
Para o ministro Luís Roberto Barroso, o Ministério Público pode eventualmente divergir do acordo de colaboração premiada firmado pela polícia, mas caberá ao juiz ver quem tem a melhor razão.
— A polícia propõe, o Ministério Público opina e o juiz decide. O Ministério Público é uma parte ativa desse debate, só não dá a palavra final — ressaltou Barroso.
Segundo a reportagem apurou, pelo menos dois acordos firmados pela PF foram homologados pelo Supremo ao longo dos últimos meses, apesar da indefinição da Corte sobre o tema - as delações do empresário Marcos Valério e do publicitário Duda Mendonça, no entanto, ainda aguardam o fim do impasse.
Dos 11 ministros da Corte, apenas o relator da Operação Lava-Jato, ministro Edson Fachin, votou no sentido de que a polícia pode participar das negociações, mas não fechar o acordo.
— Creio, guardadas as devidas proporções, que a orientação majoritária que tem neste momento, em alguma medida, no meu modo de ver, dilui o instituto da colaboração e esgarça os poderes do Ministério Público — avaliou Fachin ao final do julgamento.
Divergências
O julgamento foi marcado por divergências entre os ministros sobre a extensão do acordo da PF. Para Dias Toffoli, por exemplo, o acordo firmado pela PF pode ser homologado pelo juiz, mesmo sem aval do Ministério Público. Para o futuro presidente do Supremo, a polícia não pode dispor dos benefícios, mas sim sugerir a pena ao Judiciário, ainda que enfrente eventual oposição do MP.