Não é só o afastamento do senador Aécio Neves (PSDB-MG). O Supremo Tribunal Federal (STF) tem em mãos uma série de casos polêmicos para julgar no futuro. Cada decisão é importante: o que é decidido na mais alta Corte do país é seguido à risca por todos os juízes de tribunais inferiores Brasil afora.
Entre as decisões polêmicas, o Supremo deve discutir o aborto, a descriminalização do porte de drogas, a suspeição de Gilmar Mendes e a aplicação da Lei da Ficha Limpa. Confira estes e outros processos que estão na mira dos ministros:
Ação contra Aécio Neves
A polêmica em torno do senador Aécio Neves pode ser resolvida no próximo dia 11. O ministro Edson Fachin liberou para análise do plenário uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida por PP, PSC e Solidariedade.
A ação pede que medidas cautelares aplicadas a parlamentares que não sejam prisão (como o recolhimento noturno, imposto a Aécio) devam ser apreciadas pelo Congresso em 24 horas. O processo estava no gabinete de Fachin desde 2 de agosto, mas a crise institucional entre Supremo e Senado motivou o ministro a colocar a ação para análise.
Habeas corpus e delação de Eike Batista
A 2ª Turma do Supremo deve julgar pedido de habeas corpus feito pela defesa de Eike Batista, que no momento cumpre prisão domiciliar. O caso chegou a passar pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu, no início de agosto, que o empresário deveria cumprir a pena em regime fechado. No entanto, a defesa também recorreu ao STF, e o ministro Gilmar Mendes, relator do processo, havia concedido, em maio, habeas corpus autorizando que Eike cumprisse a pena em casa. Como a decisão de Gilmar veio antes, os ministros do STJ optaram por fazer prevalecer o resultado do STF. Mesmo assim, o habeas corpus concedido por Gilmar é provisório, e o STF deve dar um ponto final à história e precisa decidir se Eike será solto ou não.
O Supremo deve julgar, ainda, se aceita a delação premiada do empresário — preso em janeiro, acusado de repassar US$ 16,5 milhões (R$ 52 milhões) ao ex-governador Sérgio Cabral (PMDB), supostamente para obter vantagens indevidas nos negócios. No acordo, Eike deve citar o ex-presidente Lula, o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega e o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB).
Suspeição de Gilmar Mendes
A nova procuradora-geral da República, Raquel Dodge, solicitou ao STF a reanálise dos pedidos de suspeição, feitos por Rodrigo Janot, contra Gilmar Mendes. Segundo Janot, as decisões de Gilmar ao conceder habeas corpus a Eike e aos empresários Jacob Barata Filho e Lélis Marcos Teixeira devem ser anuladas. Após decisão do ministro do Supremo, todos cumprem prisão domiciliar.
No pedido, Janot argumentou que a esposa de Gilmar, a advogada Guiomar Ferreira Mendes, trabalha no escritório que defende Eike e Teixeira e que o próprio Gilmar foi padrinho de casamento da filha de Jacob Barata Filho. Agora, Raquel deve decidir se concorda ou discorda de Janot, ou ainda se não cabe ao Ministério Público Federal (MPF) questionar a conduta de Gilmar. Qualquer decisão deve passar pelo crivo da presidente do STF, Cármen Lúcia, ou pela análise dos 11 ministros no plenário da Corte.
Aplicação da Ficha Limpa
O Supremo deve decidir nesta quarta-feira (4) se as penas impostas pela Ficha Limpa (como impedimento de candidatar-se a cargos públicos) serão aplicadas a casos anteriores à aprovação da lei, em 2010. A Corte começou a julgar a ação em 2015, mas o processo só foi para análise do plenário no último dia 28, e a sessão foi adiada para esta semana. A ação foi movida pelo vereador Dilermando Soares, do município de Nova Soares, na Bahia, condenado por compra de votos em 2004.
Até agora, o placar está 5 a 3 a favor da aplicação da Ficha Limpa a políticos condenados por abuso de poder antes da vigência da lei. O relator, Ricardo Lewandowski, foi contra a aplicação ao defender que a decisão traria sanções retroativas. Por outro lado, os ministros que votaram a favor da aplicação da lei para condenados antes de 2010 defendem que é no momento da candidatura que se verificam os critérios de elegibilidade do candidato — portanto, qualquer condenação por abuso político e econômico, mesmo que anterior à lei, poderia impedir a candidatura.
Descriminalização do porte de drogas
A Corte precisa retomar a discussão do processo sobre a descriminalização de drogas, suspenso após Teori Zavascki pedir vista em 2015. Após a morte do ministro, Alexandre de Moraes (foto) herdou os processos e precisa analisar o caso para liberá-lo à análise no plenário do Supremo.
À época, o placar estava em 3 a 0 para liberar o porte de drogas para o consumo pessoal. O relator, Gilmar Mendes, votou a favor da liberação, sob o argumento de que criminalizar o consumo de drogas fere o direito à vida privada.
Lei de Responsabilidade Fiscal
Criada em maio de 2000 para impor disciplina nos gastos dos Executivos estaduais e federal, a Lei de Responsabilidade Fiscal será julgada pelo Supremo. Várias ações movidas por governadores, partidos (PCdoB, PSB e PT) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) argumentam que a lei fere a autonomia dos poderes, ao estabelecer regras para os gastos públicos. Os julgamentos estavam nas mãos de Teori Zavascki — após a morte do ministro, foram redistribuídas para seu sucessor, Alexandre de Moraes.
Aborto
Há três casos tramitando no STF. O último chegou à Corte em março deste ano, movido pelo PSOL. Para a legenda, a proibição do aborto viola preceitos da dignidade da pessoa humana, da cidadania, da não discriminação, da inviolabilidade da vida, da liberdade, da igualdade, da proibição de tortura ou tratamento desumano ou degradante, da saúde, entre outros. O processo, relatado por Rosa Weber, pede a liberação do aborto em casos de gestação de até três meses. Agora, ela prepara uma audiência pública para debater a questão.
Outro julgamento vai analisar, em plenário, decisão do ano passado tomada pela 1ª Turma, que descriminalizou o aborto até o terceiro mês de gestação ao autorizar a liberação de cinco médicos e funcionários presos em flagrante em uma clínica de aborto. A decisão vale apenas para o caso julgado, não para o resto da população.
A terceira ação, relatada por Cármen Lúcia, pode liberar o aborto para mulheres infectadas com o vírus da zika — Janot se manifestou a favor. Hoje, o aborto só é permitido se a mulher correr risco de vida por causa da gravidez, se a mulher engravidou após estupro ou se o feto é anencéfalo (sem cérebro).
Doação de sangue por homossexuais
Em 19 deste mês, o Supremo deve decidir se hospitais e bancos de sangue de todo o país podem proibir homens que fizeram sexo com outros homens nos últimos 12 meses podem ou não doar sangue. A ação foi movida pelo PSB, sob o argumento de que "essa situação escancara absurdo tratamento discriminatório por parte do poder público em função da orientação sexual, o que ofende a dignidade dos envolvidos e retira-lhes a possibilidade de exercer a solidariedade humana com a doação sanguínea". A Advocacia-Geral da União solicitou que o pedido seja negado, enquanto que a Procuradoria-Geral da República (PGR) concorda com o entendimento do PSB. O processo é relatado por Edson Fachin.
Medicamentos de alto custo pagos pelo SUS
Os 11 ministros precisam também analisar duas ações (RE 566471 e RE 657718) que exigem do SUS o fornecimento de medicamentos de alto custo e de remédios e tratamentos não autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). É a chamada judicialização da saúde, quando pacientes entram na Justiça para pedir remédios não fornecidos pelo sistema público de saúde.
Uma das ações analisa um recurso do Estado do Rio Grande do Norte, obrigado a pagar um medicamento de alto custo a uma portadora de cardiopatia isquêmica e problemas pulmonares. A outra deve julgar a ação de uma paciente contra o Estado de Minas Gerais para receber um medicamento não registrado pela Anvisa.
Suspensão do WhatsApp
O Supremo também deve analisar as decisões de instâncias inferiores que determinaram a suspensão do WhatsApp temporariamente como represália após a empresa não repassar informações de investigados à Justiça. Em junho, os ministros Edson Fachin e Rosa Weber chegaram a promover audiência pública e conversar com o cofundador do WhatsApp, Brian Acton, para verificar se o WhatsApp pode fornecer informações às autoridades — a empresa alega que não tem como. O aplicativo foi alvo de quatro pedidos de suspensão desde 2015. Agora, o caso deve ser julgado pelos ministros.