O governo do Rio Grande do Sul anunciou, nesta segunda-feira (25), que, a partir deste mês, será depositado primeiro o valor integral dos vencimentos mais baixos. Na sequência, os servidores com remunerações mais elevadas serão contemplados escalonadamente até o dia 17.
Especialistas ouvidos por GaúchaZH afirmam que a nova política adotada pelo Piratini para realizar os pagamentos de servidores abre caminho para contestações judiciais, pois os salários continuariam sendo pagos com atraso para uma parcela dos trabalhadores públicos estaduais.
No entendimento do advogado trabalhista e professor da Unisinos Guilherme Wünsch, o governo não pode pagar os salários dos servidores em outra data que não seja a estipulada pela Constituição Estadual. Caso isso ocorra, o Piratini estaria agindo contra a lei, o que abriria brecha para ações judiciais contra a medida, destacou Wünsch:
— O trabalhador não pode correr o risco de ter o recebimento de seu salário vinculado ao ganho do empregador. Para receber de maneira escalonada, o servidor também teria de trabalhar de maneira escalonada. No entanto, não é isso que ocorre. O servidor está à disposição do governo, cumprindo sua carga horária, sua jornada mensal de trabalho — afirmou.
Para o advogado, os pontos citados pelo governo para explicar a nova modalidade de pagamento — justiça social, proteção ao salário de menor valor e capacidade econômica e no decreto de estado de calamidade financeira —, são apenas justificativas e não amparo legal:
— Não se pode usar esses argumentos para justificar sucessivos atrasos nos salários.
A doutora em direito administrativo e professora da Escola de Direito da PUCRS Regina Linden Ruaro entende que o governo utiliza o princípio da reserva do possível para descumprir o pagamento em dia da folha. No entanto, afirma que essa justificativa não tem amparo legal, pois os servidores têm o mesmo direito perante a lei, independentemente do valor de seu vencimento:
— Essa medida fere o princípio da igualdade. Da isonomia, porque, em realidade, todos são servidores, independentemente se ganham mais ou menos. Uma coisa é o justo, outra coisa é o legal — diz a advogada, destacando que, no seu entendimento, a política adotada pelo Piratini pode ser encarada como um ato de solidariedade com quem recebe menos, mas não é legal.
Desde o início dos parcelamentos de salários, o governo descumpre diversas decisões judiciais que o obriga a pagar os salários em dia. Algumas categorias amparadas por medidas que garantem o sequestro de recursos das contas do Estado para o pagamento integral dos vencimentos, como ocorre com os auditores fiscais, devem continuar recebendo "em dia".
Regina explicou que, no direito administrativo, o princípio da reserva do possível é bastante utilizado para usar a falta de recursos para justificar os descumprimentos de medidas legais.
A professora também concorda que o ato do governo abre brecha para futuros mandados de segurança coletivos. No entanto, segundo Regina, não há garantia de que o Piratini vá cumprir novas decisões em favor de servidores por causa do critério de reserva do possível.