A Operação Étimo, deflagrada na manhã desta quarta-feira (16) pela Polícia Federal, investiga esquema de propina e lavagem de dinheiro envolvendo consultorias-fantasma e empreiteiras atuantes do Rio Grande do Sul, responsáveis, de 2000 a 2011, por grandes obras do Estado realizadas com recursos federais. Conforme a PF, dois investigados, que são irmãos, estão envolvidos no desvio de recursos, por meio de contratos fictícios com as consultorias, e lavaram pelo menos R$ 30 milhões no Panamá e na Suíça.
Em entrevista coletiva na manhã desta quarta, os delegados não revelaram quais obras estão sendo investigadas – apenas revelaram que elas já foram concluídas. Também não foram apontados os envolvidos. No entanto, Zero Hora levantou que os alvos da Operação Étimo são dois irmãos: o doleiro Antônio Cláudio Albernaz Cordeiro (conhecido como Tonico Cordeiro) e o engenheiro Athos Albernaz Cordeiro.
Conforme os investigadores, grandes empreiteiras responsáveis por obras rodoviárias no RS, financiadas com verbas federais, pagavam contribuições sindicais para duas associações de empresas do ramo. O valor da contribuição era um percentual calculado sobre o valor de cada obra, o que despertou a desconfiança dos investigadores – entidades como a Ordem dos Advogados (OAB), por exemplo, não cobram contribuição sindical com base nos honorários advocatícios de seus associados.
Leia mais:
Relembre as ações da Operação Lava-Jato realizadas no RS
Quem são os alvos da etapa da Lava-Jato deflagrada nesta quarta-feira no RS
O que é a Operação Xepa, que deu origem a Lava-Jato no RS nesta quarta
Feito o pagamento, as associações de empreiteiras contratavam de forma fictícia serviços de assessoria financeira de ao menos três consultorias de fachada. Todas tinham o mesmo sócio, que atuava como doleiro. ZH apurou que o doleiro é Tonico.
Segundo os investigadores, as consultorias-fantasma tinham pouco funcionários, de baixa qualificação, e estrutura física pequena, o que não condizia com os valores recebidos e serviços prestados – até agora, a PF sabe que as supostas consultorias receberam pelo menos R$ 30 milhões.
Os valores, então, eram sacados por Tonico, em espécie, e enviados para contas no Panamá e na Suíça.
– É o mesmo esquema descoberto na Lava-Jato, com a novidade das entidades associativas – disse o delegado Alexandre Sbarrola, delegado-chefe da Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros. – Essas entidades foram usadas para dificultar o rastreamento do dinheiro – declarou.
A Polícia Federal ainda não descobriu a origem dos R$ 30 milhões nem o que foi feito com os valores. Mas a delegada responsável pela investigação, Ilienara Cristina Karas afirma que o a grande quantidade de dinheiro remetida ao exterior indica que deve existir o envolvimento de funcionários públicos.
Há ainda a possibilidade da existência de fraudes em obras feitas com recursos do Estado, uma vez que as empresas que são alvo das investigações tinham histórico de firmar contratos com o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem do Rio Grande do Sul (DAER). Além disso, os investigadores não descartam que o esquema tenha continuado após 2011, de outra forma.
A Operação Étimo, desencadeada nesta quarta no RS, usou informações compartilhadas por investigadores da Lava-Jato. Os inquéritos já estavam instalados – a novidade é que agora foram expedidos os mandados de busca e apreensão (não houve mandado de prisão), em Porto Alegre, Canoas, Glorinha e, fora do RS, em Brasília.
A expectativa da PF era de reaver cerca de R$ 2 milhões em espécie, mas, como as equipes ainda estavam na rua, não havia a confirmação de quanto os policiais conseguiram recuperar. Segundo testemunhas ouvidas por ZH, oito agentes da Polícia Federal chegaram às 6h da manhã para realizar as buscas no oitavo andar Edifício Coliseu, na Praça Oswaldo Cruz, no centro de Porto Alegre. Até 9h30min, duas viaturas estavam no local para efetuar as buscas e levar o material.
Estão instaladas no local duas entidades que reúnem empreiteiras: uma delas é a Associação Riograndense de Empreiteiros de Obras Públicas (Areop), alvo da operação. Athos já foi presidente das duas.
Os dois investigados, suspeitos de corrupção ativa e passiva, devem prestar depoimento. Os próximos passos, agora, são analisar toda a documentação e concluir o inquérito em até 60 dias.
Quem são os investigados
Tonico é proprietário das três consultorias que prestaram assessoria para as empresas responsáveis pelas obras no RS. Ele foi um dos presos pela Operação Xepa, desdobramento da Lava-Jato que detalhou, em 2016, corrupção praticada pela empreiteira Odebrecht. Ele seria encarregado de pagamentos de propina a políticos que beneficiavam a construtora em contratos. Responde a inquérito na PF, por esse motivo. A suspeita é de que, além de ser operador financeiro de empresas implicadas na Lava-Jato, ele também operava com empresas gaúchas.
Já seu irmão, Athos, é ex-presidente do Sindicato da Indústria de Construção de Estradas, Pavimentações e Obras de Terraplanagem do Estado (Sicepot-RS) e da Associação Riograndense de Empreiteiros de Obras Públicas (Areop). Ele também é ligado à STE Engenharia (Serviços Técnicos de Engenharia), com escritório em Canoas e responsável por projetar diversas grandes obras no Rio Grande do Sul.
Athos e Tonico já foram investigados em outros procedimentos da PF. Athos foi réu em processo da Justiça Federal que investigava fraude em licitações na barragem de Taquarembó (entre Dom Pedrito e Lavras do Sul, na Campanha). Ele acabou absolvido, em 2016, mas quatro pessoas foram condenadas no episódio, incluindo outros construtores e ex-secretários do governo Yeda Crusius. Procuradores recorrem contra a absolvição.
O que diz Antonio Tovo, advogado de Antônio Cláudio Albernaz Cordeiro, o Tonico Cordeiro:
"Ainda é cedo para falar, precisamos ver todo o inquérito. Pela ordem de busca deu para perceber que se refere a fatos antigos, já explicados. Vamos nos manifestar após conhecer detalhes".
O que diz Alexandre Wunderlich, advogado de Athos Albernaz Cordeiro:
"As atividades empresarias dele são absolutamente regulares. Está ao dispor das autoridades para todos os esclarecimentos".