Passado um mês da queda do avião com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, em Paraty (RJ), a família do magistrado mantém a cobrança por uma investigação profunda sobre o caso. Força Aérea Brasileira (FAB), Polícia Federal (PF) e Ministério Público Federal (MPF) apuram as circunstâncias que levaram o bimotor King Air C90 a mergulhar no mar, matando o então relator da Lava-Jato na Corte e mais quatro pessoas no dia 19 de janeiro.
– Continuamos defendendo que se investigue tudo até o final para que seja afastada qualquer possibilidade de dúvida sobre as causas do acidente – reforça Francisco Zavascki, um dos filhos de Teori.
Leia mais
PF pede mais 60 dias para investigar Renan na Lava-Jato
PSOL recorre da decisão de ministro do STF que manteve Moreira Franco ministro
MPF pede a Moro que determine prisão de ex-diretor da Petrobras por mentir em delação
Francisco e os irmãos Liliana e Alexandre participaram em Brasília, nesta sexta-feira, de uma missa na catedral em homenagem ao ministro. A viagem também serviu para recolher os pertences de Teori no antigo gabinete no Supremo e no apartamento funcional. Levado para Porto Alegre, o acervo fechou mais de 120 caixas com livros e documentos.
A família ainda aproveitou a ida à capital federal para conversar com as autoridades e receber atualização sobre o andamento das investigações. Procurados por Zero Hora, FAB, PF e MPF não deram detalhes do caso, cujo sigilo foi decretado pela Justiça. Além de Teori, que tinha 68 anos, morreram o piloto Osmar Rodrigues, o empresário Carlos Alberto Filgueiras, dono do avião, a massoterapeuta Maíra Panas e sua mãe, Maria Panas.
Nos bastidores, a hipótese de desorientação espacial do piloto continua com mais força para explicar o choque da aeronave nas águas do litoral fluminense. Como chovia no momento do acidente e no aeródromo de Paraty só é possível realizar pousos visuais, Rodrigues teria perdido noção de espaço com a baixa visibilidade e caído no mar.
A possibilidade ganhou força na semana seguinte ao acidente, com a análise preliminar do áudio extraído do gravador de voz da cabine do bimotor, feita pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), vinculado à FAB. Os dados não apontaram "anormalidade nos sistemas da aeronave", segundo a avaliação inicial.
Filha de Teori, Liliana teve acesso ao áudio, no qual o piloto não relata problemas no King Air. Também não há registro de discussões, gritos ou outro sinal de agitação entre os passageiros. Na gravação, Osmar indica tentativa frustrada de pouso. Ao tentar nova aproximação, ele afirmou "estou na final" e instantes depois é possível ouvir o barulho da queda no mar.
A investigação realizada pela FAB passa por outras análises, como perícia técnica na aeronave, em especial dos motores. Os destroços seguem no Rio de Janeiro, para onde foram levados após a retirada do mar. Essa apuração, que costuma contar com auxílio de especialistas estrangeiros, é dividida em três etapas – coleta de dados, análise e apresentação dos resultados.
A coleta envolve aspectos distintos, entre eles verificações nos sistemas e projeto do King Air, condição médica e psicológica do piloto, rota do voo e condição meteorológica no dia da tragédia. Os especialistas pretendem traçar, a partir de dados recuperados do GPS, a exata rota percorrida pelo bimotor.
A FAB não estima data para divulgação do relatório final, que deve ser utilizado no trabalho da PF e do MPF. O conteúdo tem caráter preventivo, a fim de evitar novos acidentes em condições similares. Na morte do então candidato à Presidência Eduardo Campos, entre a queda da aeronave com o político e a apresentação dos resultados se passaram 17 meses. O acidente com o helicóptero que matou o ídolo colorado Fernandão, em junho de 2014, teve relatório divulgado em setembro de 2015.
Lava-Jato ainda sem sobressaltos
Com a força-tarefa empreendida pela presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, e por assessores do antigo gabinete de Teori Zavascki, a Lava-Jato, até o momento, não sofreu atrasos projetados após a morte do magistrado. Um mês depois, as delações da Odebrecht estão homologadas, Edson Fachin assumiu a relatoria da operação e paira a expectativa de que uma leva de pedidos de abertura de inquéritos contra políticos chegue à Corte depois do Carnaval.
As semanas posteriores à morte de Teori foram agitadas. Superado o luto, Cármen Lúcia deu aval à equipe do ministro para ouvir os delatores da Odebrecht e homologou em 30 de janeiro, 11 dias depois da queda da aeronave, os 77 acordos. Na mesma semana, Fachin migrou para a 2ª Turma da Corte, que julga a Lava-Jato, e foi sorteado relator.
No último dia 6, o presidente Michel Temer indicou seu ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, para a vaga de Teori no Supremo. A sabatina do escolhido na Comissão de Constituição e Justiça do Senado está marcada para terça-feira, e a tendência é de aprovação tranquila no colegiado e no plenário da Casa.
Das mudanças provocadas pelo acidente, a mais lamentada foi o pedido de desligamento do juiz Márcio Schiefler, braço direito de Teori. Considerado o "arquivo" da Lava-Jato no STF, ele retornou à Justiça de Santa Catarina. Relatos indicam que estaria desgostoso com o futuro da investigação. Seu trabalho facilitaria a análise de Fachin dos próximos pedidos de abertura de inquéritos formulados pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Desde a homologação das delações, a Procuradoria-Geral da República trabalha para formular a segunda versão da "lista do Janot" – a primeira saiu em março de 2015. Deputados, senadores, ministros de Estado, governadores e ex-governadores estarão entre os alvos. O procurador pretende solicitar a Fachin, junto com o início das investigações, o fim do sigilo de boa parte dos acordos. Ficarão em sigilo casos nos quais o conteúdo poderá atrapalhar as apurações. No Congresso, circula o comentário de que seriam liberados trechos de 65 das 77 delações. Também virão pedidos para remeter à primeira instância casos que envolvem pessoas sem foro privilegiado.