Na recepção do primeiro hospital veterinário público do Estado, uma imagem de São Francisco de Assis parece suplicar para que as portas de vidro do prédio de 1,6 mil m² sejam abertas definitivamente. Plásticos recobrem as 23 poltronas da sala de espera, onde duas plantas murchas resistem. Após a extinção da Secretaria Especial de Direitos dos Animais (Seda), a Unidade de Medicina Veterinária Victória, na zona leste da Capital, tem futuro incerto, dizem ativistas e entidades ligadas à causa animal.
Criada em 2011 com a missão de "estabelecer e executar políticas públicas destinadas à saúde, proteção, defesa e bem-estar animal em Porto Alegre", a Seda entrou para a lista de órgãos em extinção do governo de Nelson Marchezan (PSDB) no último dia 2. Na última quinta-feira, cerca de 40 funcionários – a maior parte deles terceirizados – seguia trabalhando normalmente na Unidade Médica Veterinária, que fica no mesmo terreno que o hospital Victória. No local, há cerca de 300 cães e gatos em tratamento ou à espera de adoção – alguns estão sob tutela da Seda, pois são bravios ou doentes.
Na gestão de José Fortunati, o plano inicial era que os atendimentos realizados no local– hoje, são 10 por dia – migrassem para a instituição, que foi erguida em tempo recorde de seis meses, com um investimento de R$ 6 milhões do empresário Alexandre Grendene. A inauguração ocorreu há quase dois meses. Com capacidade para atender 270 animais, a nova unidade abriga cinco salas de cirurgia, quatro consultórios, alas para internação, setores de quimioterapia e de exames de imagem e laboratório de análises clínicas.
– O clima é de apreensão e insegurança. Todos os protetores que participam do Brechocão (evento realizado pela Seda) dependem das vendas para pagar o tratamento de animais – avaliou Gelcira Teles, que se dedica à causa animal há 26 anos.
Vice-presidente do Sindicato Médico Veterinário do Rio Grande do Sul (Simvet-RS), Ricardo Capelli classificou como "um retrocesso" a extinção da Seda, em um "momento em que o órgão estava demonstrando um excelente trabalho", com a realização de programas de adoção, educação em escolas e capacitações. Ele também está preocupado com o futuro do hospital e com a continuidade de atividades desempenhadas pela pasta.
– Existe um resultado difícil de mensurar, relacionado à saúde pública. Sabemos que existem muitas zoonoses, problemas como sarna, raiva e leptospirose. O trabalho da Seda também auxilia nesse controle – destacou.
Procurado pela reportagem, o gabinete do prefeito Marchezan indicou a secretária-adjunta de Direitos dos Animais, Fabiane Tomazi Borba, para falar sobre o assunto. Segundo ela, que permanece no cargo para auxiliar no processo de transição, a pasta deve virar um departamento na Secretaria Municipal de Sustentabilidade. Ela afirma que a expectativa é a de que haja continuidade nas atividades realizadas pela Seda, como castrações e atendimentos veterinários gratuitos. Sobre o hospital, afirmou que a nova gestão tem interesse que a unidade funcione e estuda a forma de manutenção, que pode ser por meio de parceria público-privada. A abertura oficial ainda da depende da aprovação do plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (PPCI), que é indispensável para a obtenção do habite-se.
– Acho que a nova gestão não têm intenção de retroceder – disse Fabiane.
CAUSA ANIMAL
A Secretaria Especial dos Direitos Animais (Seda) foi criada em 2011 com a missão estabelecer e executar políticas públicas destinadas à saúde, proteção, defesa e bem-estar animal em Porto Alegre.
Em cinco anos, a Seda realizou:
- 1.681 adoções pelo programa Me Adota?
- 18.870 atendimentos veterinários
- 8.414 cirurgias não eletivas
- 28.626 castrações
- 28 mil ações de fiscalização contra abandono e maus-tratos