Sob uma redoma de sigilo, o governador José Ivo Sartori dá contornos finais a um pacote de medidas que prevê aumento da contribuição previdenciária do funcionalismo, incluindo uma sobretaxa, além de privatizações, extinção de fundações, demissão de servidores e redução de repasses ao Legislativo e ao Judiciário.
Prestes a completar dois anos de administração, Sartori está convicto de que somente uma drástica redução na máquina pública e um incremento na arrecadação podem estancar a agonia financeira do governo, que deve fechar 2016 sem pagar o 13º salário e com rombo superior a R$ 2 bilhões em caixa.
– Não se constrói um novo Estado sem uma mudança profunda na atual estrutura – justifica um dos mais próximos assessores de Sartori.
Leia mais:
União estuda "adiantar" fatia de repatriação para ajudar Estados
OAB-RS protocola pedido de CPI da Segurança na Assembleia
Piratini autoriza obras em 251 quilômetros de estradas na Região Central
Serão pelo menos 20 medidas, entre decretos, projetos de lei e mudanças constitucionais. As iniciativas serão apresentadas aos deputados na próxima segunda-feira e, no dia seguinte, anunciadas à população durante um evento no Palácio Piratini. Para tentar justificar a necessidade de cada ação, um painel didático está sendo preparado pelos técnicos do governo.
O objetivo é mostrar o impacto financeiro de cada proposta e como podem se reverter em benefícios em áreas essenciais, especialmente segurança e saúde.
Os estudos irão exibir, por exemplo, quantos brigadianos poderão ser contratados a partir da extinção de um órgão. Neste caso específico, o pacote prevê o fechamento de 10 das 19 fundações estaduais e a posterior demissão de servidores, uma vez que não têm estabilidade.
O governo pretende ainda revogar a lei que exige a realização de plebiscito para se privatizar estatais, como a CEEE, e alterar a legislação que fixa o repasse do duodécimo. Pelo modelo atual, Assembleia, Judiciário, Ministério Público, Defensoria e Tribunal de Contas recebem todo mês uma parcela do orçamento do Estado previsto no ano anterior – e não o valor correspondente à real arrecadação. Com a mudança proposta, o índice a ser repassado pelo governo seria atrelado ao que realmente entrou nos cofres públicos, descontadas as transferências obrigatórias, como o pagamento da dívida com a União.
– Não tem mais de onde tirar dinheiro. O orçamento para 2017 já prevê um déficit de R$ 2,9 bilhões – afirma um servidor da Fazenda.
Expectativa de forte resistência
Embora Sartori tenha clareza de que pode estar sepultando seu futuro político a partir da gravidade das medidas, está disposto a enfrentar a resistência das corporações, inclusive do Judiciário. No Piratini, quem teve acesso ao conteúdo do pacote já prevê a necessidade de se empregar a cavalaria da Brigada Militar no dia em que as propostas mais polêmicas forem votadas na Assembleia Legislativa.
A que mais deve mobilizar o servidores é o aumento na contribuição previdenciária do funcionalismo. Atualmente, o desconto nos contracheques é de 13,25%. O governo pretende elevar esse índice para 14% – máximo permitido pelo Supremo Tribunal Federal – e implementar uma sobretaxa com prazo determinado de vigência, a exemplo do que está sendo proposto no Rio de Janeiro. O governador fluminense Luiz Fernando Pezão deseja cobrar 30% de alíquota: 14% fixas e 16% por 16 meses.
– O Rio precisa aprovar essa medida e lá o déficit da previdência é de 15% da receita corrente líquida. Aqui no Estado, é de 28%. Só em 2016, o rombo nas contas será de R$ 9 bilhões. Então imagina o quanto a gente precisa mexer nisso – resume um interlocutor de Sartori.
Para evitar a mobilização antecipada das categorias, Sartori baixou lei do silêncio no Piratini. Apenas o vice José Paulo Cairoli e os secretários mais próximos estão a par de todos os dados do pacotes. Nas sucessivas reuniões, assessores e chefes de gabinete têm sido convidados a deixar a sala para evitar o vazamento de qualquer informação.
– É a lógica do Sartori, só colocar as coisas na rua quando tudo estiver maduro – diz um assessor.
Veja o que está em estudo pelo governo do RS e deve estar no pacote a ser enviado à Assembleia
Fundações
A meta é extinguir 10 das atuais 19 fundações – assim, servidores seriam demitidos, pois não têm estabilidade. O governo pretende também eliminar níveis intermediários e sobreposição de funções. A Fundação Zoobotânica, por exemplo, deixaria de existir tendo seus encargos assumidos pela Secretaria do Meio Ambiente. Outra ação vinculada ao funcionalismo é a fusão de secretarias e a extinção de cargos em comissão.
Previdência
Atualmente, os servidores pagam 13,25% de alíquota previdenciária. O Piratini estuda elevar esse índice para 14%, contribuição máxima permitida pelo Supremo Tribunal Federal. Outra medida cogitada é a criação de uma sobretaxa a ser paga por um período determinado. A meta é diminuir o rombo na Previdência, estimado em R$ 9 bilhões em 2016, e reduzir o custo da folha de pagamento.
Duodécimo
Mudança na fórmula de cálculo do duodécimo de Judiciário, Legislativo, Tribunal de Contas, Ministério Público e Defensoria. Hoje, o valor tem por base o orçamento aprovado pela Assembleia. Mas as receitas costumam ser superestimadas, pois a lei não permite que o orçamento preveja déficit, e o repasse do duodécimo é feito pelo valor aprovado em vez do que entra no caixa do Tesouro.
Privatização
O governo pretende enviar proposta de emenda à Constituição derrubando o dispositivo que exige a realização de plebiscito para a venda de algumas estatais. O Piratini deseja especificamente privatizar a CEEE, a CRM e a Sulgás. O processo de venda ficaria para uma segunda etapa – o governo ainda não tem pronto o modelo de negócio a ser proposto à iniciativa privada. O objetivo é reduzir custos e reforçar o caixa.