Dois anos e meio após ser deflagrada, a Operação Lava-Jato fez nesta quarta-feira sua 50ª e mais explosiva denúncia. Ao apontarem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como o "comandante máximo" do esquema de corrupção da Petrobras, os procuradores do Ministério Público Federal acusaram o petista de receber R$ 3,7 milhões em propina da empreiteira OAS.
O ex-presidente foi denunciado junto com a mulher, a ex-primeira-dama Marisa Letícia, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto e cinco executivos da OAS, entre eles o ex-presidente da empresa Leo Pinheiro. Lula foi denunciado quatro vezes por lavagem de dinheiro e três vezes por corrupção. No entendimento do MPF, ele teria recebido vantagens indevidas, dissimuladas na forma da aquisição, reforma e decoração de um triplex no Condomínio Solaris, no Guarujá, litoral de São Paulo.
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Somente nessa operação, o petista teria sido beneficiado com R$ 2,4 milhões. Outro pagamento de propina teria ocorrido no custeio do armazenamento de seus bens pessoais. Tão logo deixou a Presidência da República, Lula precisou de 11 contêineres para retirar sua mudança do Palácio da Alvorada. A mudança e o depósito dessa carga foram pagos pela OAS, ao custo de R$ 1,3 milhão.
A força-tarefa pediu que Lula, Marisa Letícia e os demais denunciados tenham os bens bloqueados até o alcance da soma de R$ 87 milhões, cifra considerada o valor total dos prejuízos à Petrobras nos crimes supostamente praticados pelo grupo. O MPF pediu ainda que a União seja ressarcida em outros R$ 87 milhões. De acordo com os procuradores, esse valor foi desviado em contratos da OAS com a petrolífera para obras nas refinarias Presidente Vargas no Paraná, e Abreu e Lima, em Pernambuco.
A denúncia foi protocolada no início da tarde desta quarta na 13ª Vara Federal de Curitiba, onde tramitam os processos da Lava-Jato. A expectativa dos investigadores é de que o juiz Sergio Moro aceite a denúncia até a próxima segunda-feira. Se isso ocorrer, Lula será réu pela segunda vez na Lava-Jato. Ele já responde criminalmente por obstrução da Justiça em processo que corre na Justiça Federal de Brasília.
Os termos das acusações contra Lula formalizadas nesta quarta foram exaustivamente discutidos pelos procuradores nos últimos dias. Eles viraram a última madrugada para concluir a peça judicial. Alguns assessores deixaram a sede do MPF quando começou a amanhecer em Curitiba, voltando pouco antes do meio-dia. Um dos temas em discussão foi se cabia um pedido de prisão preventiva do ex-presidente, o que acabou não sendo requerido ao juiz Sergio Moro.
– Ainda não há elementos para prisão preventiva. Pelo menos, por enquanto não cabe – disse a ZH um dos integrantes da força-tarefa.
Apesar da precaução adotada na discussão de medidas cautelares, os procuradores não pouparam o ex-presidente na entrevista coletiva em que resumiram a denúncia. Coordenador da Lava-Jato, o procurador Deltan Dallagnol chamou Lula de "maestro da orquestra criminosa" e "grande general do esquema". Para Dallagnol, Lula conduziu uma propinocracia, "um governo regido pelas propinas", com o objetivo de obter governabilidade, perpetuação criminosa no poder e de enriquecer ilicitamente.
O procurador diz que Lula tinha papel central não só no petrolão, mas também no mensalão, e que os esquemas de corrupção são similares e formatados para beneficiar a ele próprio e ao PT. Numa sequência de slides projetados, a força-tarefa apresentou 14 evidências de que Lula tinha conhecimento de que indicações políticas eram feitas para promover um assalto aos cofres públicos.
Ele também afirmou que o petista tinha uma "relação conveniente" com os presidentes de empreiteiras, como Marcelo Odebrecht e Leo Pinheiro, que despachavam seus interesses diretamente com o ex-presidente. Em determinado momento da exposição, Dallagnol comentou as reiteradas tentativas de Lula de desqualificar e obstruir as investigações da Lava-Jato, comparando-o com um assassino que executa sua vítima e depois tenta comprar o silêncio das testemunhas. Na ação em que Lula é réu em Brasília, ele é acusado de tentar comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró.
A denúncia contra Lula surge seis meses após ele ter sido levado sob coerção a prestar depoimento à força-tarefa da Lava-Jato. Agora, a expectativa dos procuradores é de que o caso seja julgado por Moro até março do ano que vem.