Presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA) não podia ter seguido mais à risca o recado que deu em encontro com deputados na manhã da última sexta-feira.
– Vocês vão se surpreender comigo.
Três dias depois, o deputado – aliado de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mas declaradamente contrário ao impeachment de Dilma Rousseff (PT) – anulou as sessões da Câmara que votaram o afastamento da presidente, atendendo a um pedido da Advocacia-Geral da União (AGU).
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Confira a íntegra da decisão de Waldir Maranhão
A decisão de Maranhão foi costurada por governistas durante o fim de semana. O presidente interino voltou de São Luís (MA) neste domingo de Dia das Mães. No voo de volta a Brasília, a bordo de um jatinho da FAB, também estava o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB). Aliado de Dilma, Dino já era apontado como o responsável por ter levado Waldir Maranhão a se posicionar contra o impeachment – e, agora, é visto como articulador da anulação do processo de afastamento da presidente pela Câmara.
Não se sabe com quais outras autoridades Maranhão se encontrou no fim de semana, já que ele fugiu da imprensa nos últimos dias e sua assessoria também não deu informações. Por trás do "sigilo" da agenda de encontros estaria o "problema" que Maranhão enfrenta com seu próprio partido desde que decidiu contrariar a posição do PP e votar contra o impeachment no plenário da Câmara.
O voto foi considerado um gesto de fidelidade a Flávio Dino, com quem deve compor chapa como candidato ao Senado em 2018, além de ter a promessa de assumir uma secretaria de Ciência e Tecnologia.
A desobediência lhe custou o comando do PP no Maranhão. O diretório estadual do partido passou a ser presidido pelo deputado André Fufuca (PP-MA), por decisão da executiva nacional. Indignado, Maranhão chegou a acionar a Justiça para tentar retomar o comando regional do partido. Não conseguiu. Para os encontros desse fim de semana, Fufuca e deputados próximos a ele não foram convidados.
Comportamento de Maranhão na Câmara é inconstante
Aliado de Eduardo Cunha, Maranhão tem um comportamento oscilante na política da Câmara. Exemplo disso é o voto contra o impeachment. Em seu terceiro mandato como deputado federal, ele já passou pelo PDT, PSB, PTB e PP. Na Operação Lava-Jato, Maranhão foi citado pelo doleiro Alberto Youssef como um dos parlamentares que recebiam propina nos esquemas da Petrobras. A investigação corre em sigilo. Ele nega as acusações.
Seu nome também aparece na lista de contas eleitorais reprovadas pelo Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão (TRE-MA). Ao analisar a prestação de contas de 2010, quando ele disputava a cadeira de deputado, o tribunal concluiu que houve irregularidades, por recebimento de dinheiro de fonte não identificada. Maranhão recorreu, mas perdeu. Sua ficha inclui ainda uma ação do Ministério Público Eleitoral, por causa de captação irregular de recursos.
Descrito por reportagem da revista IstoÉ em fevereiro de 2015 como "um parlamentar sem muita visibilidade em Brasília e com atuação discreta na área de educação", Maranhão não é dos mais ativos da Câmara. O site Atlas Político destaca quatro pontos ideológicos que marcam sua atuação: a defesa da exploração privada do petróleo, o posicionamento contra o aborto, o ambientalismo e o apoio ao parlamentarismo. O mais recente projeto de lei apresentado foi em maio de 2014, quando pediu alterações em uma lei de 1997 "para assegurar ao usuário (de celular) o direito de ser informado, antes de a chamada ser completada, sobre a incidência de despesas de interconexão".
Os últimos pronunciamentos em plenário antes da votação do impeachment foram em 2015: em 24 de novembro, pediu respostas sobre o desastre de Mariana; cinco dias antes, declarou como "urgentes" medidas para a redução do consumo de drogas no Brasil; em outubro, homenageou o Bumba Meu Boi; em setembro, mostrou preocupação com os índices de violência no Maranhão e homenageou São Luís no aniversário de 403 anos da cidade.
Tornou-se vice-presidente da Câmara por meio de um grande acordo partidário no qual o PP ficou com a vaga. É filiado ao partido desde 2007 – antes, esteve no PDT (1985 a 1986), duas vezes no PSB (1986 a 1988 e 2005 a 2007) e no PTB (1988 a 2005).
Descrito por interlocutores como um dos muitos aliados de Cunha no Congresso, Maranhão não assume a pecha. A assessoria do deputado diz que ele não externa posicionamento sobre o presidente afastado – ainda que tenha sido eleito vice com o apoio do peemedebista. Em seu voto contra o afastamento da presidente Dilma, referiu-se a Cunha como "meu presidente querido".
Desde que assumiu, na quinta-feira passada, a presidência da Câmara dos Deputados, Maranhão passou a ser alvo de disputa entre o Palácio do Planalto e o PMDB do vice-presidente Michel Temer.
Líderes aliados de Cunha passaram a articular a renúncia de Maranhão e também de Giacobo (PR-PR), segundo-vice-presidente da Câmara, na tentativa de provocar a realização de uma nova eleição na presidência da Casa. Maranhão manteve a ideia de permanecer no cargo.
Diante do número significativo de parlamentares, principalmente da oposição, que dizem que o deputado não tem condições de presidir a Câmara por sua inabilidade política, além de dizer que iriam “se surpreender” com ele, pediu que fosse organizada uma "pauta leve" em sua semana de estreia no comando. Os colegas riram e explicaram então que, no atual momento de turbulência, não haveria espaço para isso.