Nas eleições municipais de 2020, o Rio Grande do Sul conta com mais de 33,2 mil candidatos das mais variadas características: de 17 a 92 anos de idade, brancos, negros, indígenas e asiáticos, divididos entre homens e mulheres.
Embora pareça uma multidão heterogênea que espelha fielmente a sociedade que os concorrentes buscam representar, na verdade o perfil típico de quem disputa o eleitorado gaúcho é bem pouco diversificado. De cada 10 desses candidatos, nove são autodeclarados brancos, e dois terços são homens.
Apesar de esforços e debates para aumentar a participação política de grupos atualmente sub-representados nos parlamentos e nas prefeituras do Estado, a situação é praticamente a mesma em comparação com a eleição de quatro anos atrás. Especialistas avaliam que a participação eleitoral reflete as desigualdades sociais.
Na eleição de 2016, as mulheres equivaliam a 32% dos registros de candidatura, e pretos e pardos, somados, 9,4%. Na corrida atual pelo voto, o cenário mudou pouca coisa: elas são 34% de quem tenta o cargo de prefeito, vice ou vereador, e os negros totalizam 12% — cifra ainda muito distante da fração que ocupam na sociedade gaúcha, onde são um quinto da população.
Esse desequilíbrio provoca algumas situações peculiares. Em apenas um município, por exemplo, há igualdade entre homens e mulheres na eleição: em Linha Nova, no Vale do Caí, há 12 concorrentes de cada gênero. Em todas as demais 496 cidades, o sexo masculino predomina. E em apenas 29 há pelo menos 20% de candidatos negros — média de sua participação na composição étnica no Estado. Já em outras 70 localidades, não há ninguém preto ou pardo lutando por votos.
— Isso reflete o fato de que a desigualdade no indicador de desenvolvimento humano entre brancos e negros é maior no Rio Grande do Sul do que a média nacional. Além disso, a disparidade econômica dificulta ainda mais a participação nas campanhas eleitorais — avalia o integrante da Coordenação Nacional do Movimento Negro Unificado e mestrando em Direito Gleidson Renato Martins Dias.
Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) do ano passado confirmam que o Índice de Desenvolvimento Humano do Estado é de 0,810 entre os brancos e de 0,725 entre os negros (em uma escala que chega a 1) — segunda maior diferença do país, atrás apenas de Roraima.
Dias avalia que a recente discussão sobre a oferta de cota racial na distribuição do fundo partidário (que formou maioria de votos no Supremo Tribunal Federal para valer a partir deste ano) poderá estimular mais candidaturas de pretos e pardos.
Coordenadora de Programas da ONG Themis (dedicada ao fortalecimento das mulheres), Renata Jardim afirma que a sub-representação política feminina também está ligada ao cenário geral de desequilíbrio da sociedade.
— Avançamos no sentido de transformar essa desigualdade em uma pauta mais pública, mais discutida. Por outro lado, vivenciamos retrocessos em relação a estratégias para reduzir desigualdades. Não um orçamento específico para essa área, por exemplo — avalia Renata.
Os números indicam, ainda, pouca tendência de renovação em relação à faixa etária independentemente do sexo. A proporção de jovens abaixo de 25 anos sofreu um leve recuo em comparação com 2016: somavam apenas 3,2% dos registros de candidatura na eleição passada, patamar que caiu para 2,9% agora.
— O problema de termos pouca diversidade é que os homens brancos de classe média terminam por ser a representação da moral e da civilidade — avalia Dias.