Em sua terceira tentativa de chegar ao Legislativo, os 2.171 votos obtidos fizeram de Andressa Marques a primeira mulher eleita vereadora pelo PCdoB em Caxias do Sul, no dia 6 de outubro. Moradora do bairro Cruzeiro, onde atendeu a reportagem junto de parte da equipe que considera fundamental para construir coletivamente sua candidatura, a parlamentar quer ser, a partir de janeiro, defensora incansável de parte da população que não se sente representada pelos ocupantes dos assentos da Casa do Povo.
- O povo olha para o Parlamento e não se enxerga nele. Pessoas que não são de classes privilegiadas ou de famílias conhecidas precisam quebrar muitas barreiras para ocupar um espaço como a Câmara, e isso só é possível com um trabalho coletivo, feito com pessoas que tenham uma visão parecida sobre o que precisa mudar. Esta foi a minha terceira candidatura, mas de algum modo considero a primeira, porque nas duas anteriores participei mais como uma necessidade do partido do que por iniciativa própria de construção de um projeto - avalia.
Ao se debruçar sobre as razões que a fizeram ter um aumento de 50% de votos em relação à eleição de 2020, quando ficou como primeira suplente do partido e assumiu a cadeira durante uma licença de 15 dias do vereador Renato Oliveira, Andressa considera que esta foi uma campanha mais madura. Além de mais experiência profissional, no trabalho como assistente social formada, pôde aprofundar sua vivência no movimento comunitário, principalmente como integrante do Conselho Municipal de Assistência Social, do Comitê POP Rua e da diretoria da UAB, a União das Associações de Bairro.
- Quero ser uma porta-voz das pautas do movimento comunitário, representando desde os estudantes até as associações de reciclagem, debatendo pautas polêmicas, como a questão das pessoas em situação de rua. Acho importante que meu trabalho sirva para potencializar as comunidades para além das possibilidades do meu mandato de vereadora _ pontua.
Ao reiterar diversas vezes o caráter coletivo da campanha que a elegeu, Andressa também exalta o papel de lideranças de bairro que ajudaram a abrir portas para ela em diferentes regiões de Caxias escolhidas como foco da campanha: além do Cruzeiro, caminhou muito pelo Serrano, Monte Carmelo, Campos da Serra, Belo Horizonte e Euzébio Beltrão de Queiroz. Em todos, a moradia foi a pauta primordial com que se comprometeu a batalhar:
- Optamos por focar a campanha em bairros mais populares, contando sempre com o apoio de lideranças comunitárias que ajudaram a tornar os moradores mais receptivos a alguém que está vindo de fora. Em todos esses lugares pude escutar muitas demandas sobre direito à moradia digna e também sobre transporte público e educação infantil, que contribuíram para que eu escolhesse estas bandeiras como as principais do meu mandato.
Com a responsabilidade de integrar uma bancada de oposição ao governo de Adiló Didomenico, a comunista de 28 anos diz que sua defesa será sempre pelos historicamente excluídos e por uma Caxias do Sul que se desenvolva tendo as pessoas como prioridade
- Temos uma política ainda muito polarizada, em que qualquer articulação de oposição é vista como jogar contra, não querer que o governo dê certo. Pelo contrário. Eu gostaria e ficaria feliz se a gestão que foi reeleita olhasse mais para as demandas da população. Claro que vou apoiar projetos importantes para a construção da nossa cidade, mas, do jeito que está, vejo que a cidade parou no tempo. Quando me elejo, é para dar voz a quem precisa e para defender a minha ideia da cidade, que é a visão das pessoas historicamente excluídas.De quem discorda de uma terceirização ou da privatização de um serviço público que é básico, de investir menos. Respeito o prefeito Adiló (Didomenico) e respeitaria o (Maurício) Scalco caso fosse ele o prefeito eleito, mas, ao mesmo tempo, sei que não devo nada pra ninguém que não seja a população que eu represento.
Tendo a experiência dos próprios pais, que saíram de Itaqui, na Fronteira Oeste, em busca de uma vida melhor em Caxias do Sul, Andressa diz que irá priorizar pautas que levem Caxias a ser uma cidade em que as pessoas possam ter uma vida para além do trabalho, garantindo também acesso a serviços públicos e a opções de lazer para crianças e adultos:
- Minha família é de uma das regiões mais pobres do Estado e veio pra cá por conta das oportunidades de trabalho e estudo para os seis filhos. É maravilhoso que as pessoas ainda venham para Caxias por esse mesmo motivo, mas fato é que os serviços públicos não acompanham essas oportunidades. Faltam opções de lazer, de esporte, de descanso, como se a vida fosse apenas trabalhar sem parar, muitas vezes por um salário que não dá conta do sustento da família.
PRINCIPAIS PROPOSTAS
Habitação
"O acesso a uma moradia digna é uma pauta essencial, porque a gente vê que é praticamente impossível um trabalhador ter acesso a esse bem em Caxias do Sul. Mesmo as políticas habitacionais que existem ainda são insuficientes, como o Campos da Serra é um exemplo. Queremos apresentar propostas e debater muito essa questão, além da regularização fundiária que é outro imbróglio na cidade."
Transporte público
"O transporte público é um problema que afeta a maioria das grandes cidades, e Caxias não é diferente. Nós queremos debater passe livre, tarifa zero, caminhos para construir isso, como fazer para que a nossa população possa contar com um transporte público eficiente no seu dia a dia, porque vai chegar o momento em que não vai mais caber carros na nossa cidade."
Educação infantil
"Uma grande questão na cidade, que se relaciona com outros níveis educacionais. Sem acesso a uma educação de qualidade desde a infância, mais tarde ela (criança) seguirá sendo prejudicada. E esse direito é negado às famílias. Muitas vezes, são as mulheres as mais afetadas por isso, que acabam tendo de ficar em casa ou 'se virar nos 30' para dar conta sozinha de um dever que deveria ser compartilhado."
QUEM É
Perfil: 28 anos, natural de Itaqui, mora em Caxias do Sul desde a infância.
Trajetória: graduada em Serviço Social. Concorreu a vereadora nas eleições de 2016, quando fez 848 votos; em 2020, quando fez 1.360 votos e ficou como primeira suplente; e agora em 2024 se elegeu com 2.171 votos. Se fosse uma eleição por soma simples de votos, ficaria com a 23ª e última vaga na Câmara.
Referências: Manuela D'Ávila, por ter sido a mulher jovem que abriu caminho para outras mulheres jovens, como eu, entrarem na política. Também gosto muito do Guilherme Boulos, que não é um deputado de gabinete, além das nossas deputadas gaúchas Bruna Rodrigues e Daiana Santos, ambas mulheres negras que têm uma trajetória na periferia e romperam barreiras.
Pessoal: Gosta de jogar futebol de salão desde criança. Joga em dois times, o Apolo e o Base Feminina. É fã da Seleção Brasileira, especialmente das mulheres que abriram caminho na modalidade, como Marta, Formiga e Cristiane.