Foi aprovada por 12 votos a 7 a abertura do processo de cassação contra o vereador de Caxias do Sul, Lucas Caregnato (PT). A decisão foi tomada pelos vereadores na sessão da Câmara de Caxias do Sul na manhã desta terça-feira (2). O pedido de cassação foi protocolado na sexta-feira (28) pelo eleitor Lucas Ribeiro Suzin, que acusa Caregnato de quebra de decoro parlamentar após tumulto na última audiência pública sobre o complexo da Maesa, em 25 de abril. Não votaram os vereadores Rafael Bueno (PDT) e Tatiane Frizzo (PSDB), em representação por viagem a Niterói (RJ), Felipe Gremelmaier (MDB), que estava ausente da sessão, além do presidente da Casa, Zé Dambrós (PSB), que não vota.
A sessão começou às 8h50min. Após cerca de 10 minutos, o presidente da Câmara, vereador Dambrós, suspendeu a sessão e solicitou uma reunião fechada com todos os parlamentares, para alinhamento dos trâmites a respeito da votação para abertura do processo de cassação. A sessão ficou suspensa por aproximadamente 40 minutos, retomando às 9h43min com a leitura do documento externo que pede a cassação de Caregnato.
Caregnato teve 10 minutos para fazer a sua defesa oral. Na manifestação, ele disse que a peça que pede sua cassação é "frágil" e que a Câmara não pode "banalizar um instrumento sério como a legislação" que trata da cassação. Além disso, ele destacou sua atuação como vereador em prol de Caxias.
— Meu perfil é de fazer falas e posicionamentos objetivos, aguerridos, em face do que eu acredito. Eu faço política com racionalidade, não faço com ódio, nem com rancor, faço para a cidade que eu quero. Nesse sentido, foram inúmeros os projetos que esse vereador e a bancada votou junto com o governo, junto com a cidade. A minha atuação resultou em inúmeros emendas parlamentares para a nossa cidade. Me permita, (vereador Sandro) Fantinel, usar seu exemplo. Ano passado, como presidente da comissão de ética, mesmo com todas divergências que temos, o senhor foi alvo de duas representações na comissão e eu arquivei as duas porque não havia legalidade nas denúncias. Não podemos banalizar um instrumento sério como a legislação — disse Caregnato.
Na sequência, o vereador disse que não se pode "abrir precedente" para que se averigue o caso de um vereador com "o que se tem de mais pesado", e o que vai acontecer é a "espetacularização de uma medida que rasga a democracia".
— Tenho certeza que tem uma coisa que é mais cara para todos nós, que é o Estado Democrático de Direito. Não podemos coadunar com atos que restrinjam, que cassem, que cerceiem a democracia. É uma peça absolutamente questionável do ponto de vista legal. Não podemos abrir precedente para que se averigue o caso de um vereador, amplamente discutido pela mídia e falado aqui, com o que se tem de mais pesado que é cassar o mandato de um vereador. O que vai acontecer é a espetacularização de uma medida que rasga a democracia. Esse vereador hoje tem seu mandato questionado por uma peça que é frágil, por motivos que não são a matéria discutida aqui, e que amanhã pode ser com outro vereador ou até o prefeito. Não se justifica a admissibilidade do processo de cassação — finalizou.
No final da sessão, a comissão processante ficou definida com: Alexandre Bortoluz (PP) será o presidente, Sandro Fantinel (sem partido) será o relator e Clóvis Xuxa (PTB) será o vogal (integrante). Essa comissão tem cinco dias a partir de hoje para notificar o vereador Lucas Caregnato da abertura do processo, com cópia da denúncia e documentos relativos ao processo.
Para concluir todo o processo, incluindo o parecer da comissão processante e a votação em plenário, são 90 dias contados a partir da notificação. O vereador perde o seu mandato se, na votação final, tiver o voto favorável à cassação de pelo menos dois terços dos parlamentares (16 de 23).
Próximas etapas
Após a definição da comissão processante, o presidente Alexandre Bortoluz concedeu coletiva de imprensa na Câmara. Em uma resposta protocolar, o vereador reforçou os prazos e os trâmites da atuação da comissão em relação ao processo de cassação que se inicia a partir de hoje.
— Agora temos que reunir a comissão processante para desenvolver a notificação, e após a notificação começa a correr os 90 dias para a instrução, em que serão feitas as oitivas das testemunhas. Também solicitaremos, de acordo com o pedido, imagens do fato, vamos pedir à Polícia Civil se há boletim de ocorrência, dentre outros procedimentos — declarou.
Estou muito tranquilo. Se alguém acha que usar uma representação no sentido de tentar cassar meu mandato vai me calar, está enganado.
LUCAS CAREGNATO
Vereador de Caxias do Sul, alvo de processo de cassação
À Rádio Gaúcha, em entrevista no seu gabinete após a sessão, o vereador Lucas Caregnato afirmou que a decisão da Câmara "avilta o Estado Democrático de Direito" e lamentou admissibilidade do processo ao dizer que contava com o bom senso dos colegas para não aprovar uma tentativa de cassar o mandato de um vereador "sem uma prova e sem um fato efetivo".
— Estamos nos deparando aqui com uma atitude que avilta o Estado Democrático de Direito, na medida que um eleitor, que não estava presente no dia do ocorrido, apresenta uma representação baseada em uma legislação de 1967 para cassar o mandato de vereador, que, diga-se de passagem, faz oposição sistemática ao governo municipal, e que trata de temas como combate ao racismo e machismo. Contava com o bom senso dos colegas no sentido de não banalizar e não aviltar a democracia. A tentativa de cassar o mandato de um vereador sem uma prova, sem um fato efetivo, não agride apenas o mandato e os eleitores do vereador Lucas, mas sim nossa Casa e a história que esse parlamento representa — afirmou.
Caregnato também afirmou estar "muito tranquilo" com a admissibilidade do processo de cassação.
— Já fui vitima de violência política, racismo e (recebi) ameaças dentro dessa Casa. Estou muito tranquilo. Se alguém acha que usar uma representação no sentido de tentar cassar meu mandato vai me calar, está enganado, porque vamos seguir com a mesma altivez e galhardia, defendendo uma cidade melhor para todos e para todas — concluiu.
Passo a passo do processo de cassação
- A comissão processante tem cinco dias a partir da abertura do processo de cassação para notificar Caregnato, com cópia da denúncia e documentos. Após ser notificado, o vereador tem o prazo de 10 dias para a apresentação de defesa prévia, por escrito.
- Após a apresentação da defesa prévia, a comissão processante emite parecer prévio no prazo de cinco dias, opinando pelo prosseguimento ou arquivamento da denúncia. Em caso de arquivamento, o parecer será submetido ao plenário, que poderá confirmá-lo ou rejeitá-lo.
- Em caso de prosseguimento, o presidente da comissão processante dá início à instrução e determinará os atos, as diligências e as audiências que se fizerem necessários, como oitivas das testemunhas apontadas pela defesa e depoimento do próprio vereador. Encerrada a fase de instrução, Caregnato terá o prazo de cinco dias para apresentar razões escritas.
- Depois da apresentação das razões escritas, a comissão processante começa a elaborar o relatório do caso e emite parecer final, pela procedência ou improcedência da acusação, e solicitará ao presidente da Câmara, Zé Dambrós (PSB), a convocação de sessão para julgamento. A decisão da comissão processante não é decisória, e serve apenas como embasamento e sugestão aos demais vereadores.
- Na sessão de julgamento, os vereadores poderão se manifestar pelo tempo máximo de 15 minutos cada um. Caregnato ou o seu procurador tem o prazo máximo de 2 horas para defesa oral. Concluída a defesa, serão feitas votações nominais de acordo com a quantidade de infrações contidas na denúncia. Caregnato é afastado do cargo se houver voto favorável para cassação de dois terços dos parlamentares.
- Concluído o julgamento, o presidente da Câmara informa o resultado e, se houver condenação, expedirá o decreto legislativo de cassação do mandato de vereador. Se o resultado da votação for pela absolvição, Dambrós determinará o arquivamento do processo. Em qualquer caso, o resultado é comunicado à Justiça Eleitoral.
Relembre o caso
Na última audiência pública sobre o projeto de ocupação e gestão do complexo da Maesa, que ocorreu no dia 25 de abril no auditório da prefeitura, alguns manifestantes protestavam do lado de fora do espaço, que estava com a porta fechada e com assentos disponíveis. Além de se posicionarem contrários ao projeto da prefeitura que estava sendo apresentado, o grupo pedia para entrar no espaço e participar do evento. Neste momento, os vereadores Lucas Caregnato e Rose Frigeri, também do PT, foram até a entrada do auditório, e um servidor da prefeitura tentou impedir quando Lucas abriu a porta.
Caregnato e Rose dizem ter sido empurrados pelo CC, o que irritou o vereador petista, que começou a discutir de forma exaltada inicialmente com o secretário Cristiano Becker e, na sequência, com a chefe de gabinete. Caregnato afirmava aos secretários que havia sido agredido e ofendido pelo servidor da prefeitura, e demandava que ele fosse retirado do local.
Na sessão da Câmara de quinta (27), a vereadora e procuradora especial da mulher na Casa, Tatiane Frizzo (PSDB), levou ao plenário um vídeo com um trecho do tumulto e repudiou a forma como Caregnato discute com Grégora, classificando como "violência verbal contra a mulher". Na sequência, mais colegas do Legislativo comentaram o conteúdo, e lamentaram as atitudes do petista. Um dia antes, na quarta (26), a prefeitura de Caxias divulgou uma nota de repúdio contra o tumulto "causado por um pequeno grupo de manifestantes", e citou Caregnato dizendo que ele "forçou a porta para permitir acesso irrestrito, danificando-a e insultando verbalmente aqueles que tentavam manter a ordem".
Em nota, publicada no último sábado (29) em um vídeo em redes sociais, Lucas Caregnato diz que recebeu com "surpresa" o pedido de cassação do seu mandato por um "eleitor que não estava presente no tumulto". Além disso, ele ressalta que é papel do vereador defender o cidadão e que sua atitude no momento foi uma "ação reativa sem direcionamento pessoal". Por fim, ele afirma que sempre atuou na defesa do cidadão e que "não há dúvida que essa denúncia não terá prosseguimento".