Neste sábado, Leonel de Moura Brizola completaria 100 anos de idade. Um dos ícones incontestáveis da história política brasileira, Brizola deixou legados, não só de valores, como no conceito de ordem 'brizolista' que entusiastas se autodenominam, mas também de governabilidade. Aos 36 anos, foi eleito governador do Rio Grande do Sul, de 1959 a 1963, período em que revolucionou a educação no Estado, criando 6,3 mil novas escolas, as chamadas brizoletas, que geraram 688 mil novas matrículas e 42 mil novos professores.
A política de expansão educacional se repetiria em seu governo no Rio de Janeiro, para o qual foi eleito em 1982 (e depois reeleito, em 1990). Lá, Brizola executou o programa de construção de cerca de 500 Centros Integrados de Educação Pública (Cieps), que atendiam em turno integral. Inevitavelmente, Brizola passou a ser vinculado à bandeira da educação, o que se constitui como sua principal marca, até nos dias de hoje.
Brizola foi ainda deputado estadual pelo PTB no Rio Grande do Sul e federal em 1954. Foi ele quem também liderou o histórico movimento da Campanha da Legalidade que, em 1961, defendeu o direito de João Goulart governar o Brasil após a renúncia do então presidente Jânio Quadros. Foi a mobilização que garantiu a manutenção temporária da democracia no Brasil.
Apesar do crescimento das dimensões nacional e internacional que o nome de Brizola representou gradativamente na política brasileira, o ex-governador sabia a importância de manter articulações em todas as esferas, o que acabou criando vínculos com Caxias do Sul. No município, tinha relação especialmente com Bruno Segalla, de quem era amigo, e contato com lideranças do PDT, partido que criou em 1979, incluindo mais tarde o ex-prefeito de Caxias, Alceu Barbosa Velho (PDT).
— Tive a honra de ter conhecido pessoalmente o Leonel Brizola e ter convivido por alguns instantes em várias situações. O grande cara era o Segalla, ele queria muito bem o Segalla. Tinha uma amizade grande. Tinha o velho (Ruben) Bento Alves, que deu nome à perimetral, foi um grande amigo dele. E entre tapas e beijos, era o (ex-prefeito) Mansueto Serafini. Eles não se entendiam, mas se admiravam mutuamente — revela Alceu.
O ex-prefeito conta que teve maior contato com Brizola quando o ex-governador veio a Caxias, durante a Festa da Uva de 1998, quando era candidato a vice-presidente na chapa encabeçada por Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que acabou derrotada por Fernando Henrique Cardoso (MDB).
Embora tenha ensaiado algumas vezes o retorno efetivo à política, após encerrar o segundo governo no Rio de Janeiro, em 1994, Brizola disputou as eleições de 1998 e ao Senado em 2002, mas não se elegeu. Morreu em 21 de junho de 2004, aos 82 anos.
Apesar das relações, o município conta com poucas referências em homenagem a Brizola. Atualmente, uma escola municipal (sem sede fixa, contradizendo os valores brizolistas) implantada em 2014 possui o seu nome, assim como área de lazer e o largo da rótula do Estádio Centenário, no bairro Marechal Floriano.
POUCAS HOMENAGENS EM CAXIAS
- Decreto do prefeito Alceu Barbosa Velho, em 2014, cria e denomina Escola Pública Municipal de Ensino Fundamental Governador Leonel Brizola. A escola nunca teve sede própria.
- Lei ordinária de autoria do vereador Gustavo Toigo, de 2005, denomina área pública localizada no bairro Marechal Floriano de Largo Governador Leonel Brizola (na rótula do Estádio Centenário, incluindo área de lazer).
- Decreto do Poder Executivo, de junho de 2004, decretou luto oficial pela morte de Leonel Brizola.
- Decreto assinado pelo ex-prefeito Mansueto Serafini em 1980 outorgou o título e a Medalha de Caxias ao Engenheiro Leonel de Moura Brizola.
fonte: Câmara de Vereadores
Relação de amor e ódio
Uma relação ambígua com liderança política local foi a de Brizola com o ex-prefeito de Caxias, Mansueto Serafini. Mansueto foi eleito vereador pelo PTB em 1963, na época, mesmo partido de Brizola. Após a volta do exílio, Brizola criou o PDT em 1979, e esperava a filiação de Serafini, que no entanto, decidiu voltar ao PTB, no ressurgimento do partido trabalhista conforme se avançava o processo de redemocratização. Nas eleições municipais de 1988, Serafini, representando, a UDC (que reunia PSDB, PL, PFL e PTB), travou intensa rivalidade com o PDT, o que acirrou o desentendimento entre ele e Brizola.
— Ganhamos eleição de 1988, enfrentando Germano Rigotto (MDB), Nadyr Rosseti (PDT) e nessa campanha veio a Caxias o Brizola e me chamou de "traidor". E eu respondi que Caxias nunca foi atrás de um caudilho e tive um rompimento com o Brizola, que só se recuperou muitos anos depois. Foi um período difícil, o Brizola fez tudo para me derrotar como candidato a prefeito. No fim, fizemos as pazes. Mas nunca houve aproximação política, apenas ficamos amigos — revela Mansueto.
Contemporâneos a essa relação afirmam que a admiração era mútua, apesar do amor e ódio oscilarem. O próprio Mansueto hoje reconhece Brizola como um dos maiores governadores da história do Rio Grande do Sul:
— Não se pode negar que o Brizola, apesar dos problemas pessoais que tive, foi um grande governador do Rio Grande do Sul. Um secretário do Brizola, quando ele era governador do Rio de Janeiro, dizia que eu e o Brizola não nos entendíamos pois pensávamos igual, éramos dois teimosos.
O QUE DIZEM
"O centenário do Brizola é muito importante para todos nós, lembramos toda a vivência dele, a história de luta desde a infância, vindo de família humilde, foi a Porto Alegre, começou a trabalhar, se virou como pôde e depois ingressou na política. Com muita sensibilidade social, sempre trabalhou pelo povo, essa é a grande qualidade do Brizola, que o diferencia de muitos políticos, ele gostava das pessoas, queria ver o Brasil prosperar. Conseguiu a façanha de ser governador em dois Estados, do Rio Grande do Sul nos anos 60 e no Rio de Janeiro na década de 80 (e também 90). Acho que ninguém nunca conseguiu isso. Uma vez, Fernando Henrique (Cardoso) questionou o Brizola sobre modelo de educação que ele queria implantar e o Brizola respondeu: 'cara mesmo é a ignorância'. Ele era obstinado. E claro, quando se fala em benefício à população mais carente, gera o ódio da elite. Então ele nunca foi bem visto pelos poderosos, as elites, o sistema financeiro e parte da imprensa." Lucas Diel, presidente do PDT caxiense
"Ele é o farol individualmente para a gente. Quando pensei em me filiar a algum partido fui olhando e a conclusão foi que tinha que ser com ele, eu, como educador e pretendendo que algo fosse feito para a sociedade em relação à educação. O maior legado dele é relacionado à educação. Ele tinha uma percepção dos fatos políticos que não vejo depois dele alguém que tenha tido igual. Ele tinha uma clareza natural do que deveria ser feito, de tal forma que todas as ações dele foram muito objetivas, muito claras. Imagina hoje um político que estivesse no poder e fizesse 10% de escolas que ele fez. (...) Se o atual presidente nacional do PDT realmente tivesse a percepção que o Brizola tinha, nós não seríamos hoje, como somos, um puxadinho de partido. Estou um tanto triste, pois nós hoje poderíamos ser a referência nacional como partido por termos a maior bandeira que a sociedade precisa: educação. Como partido, hoje, estamos apequenados." Agenor Basso, ex-secretário do governo de Alceu Barbosa Velho e liderança do PDT municipal