Como um banho de água fria no crescente engajamento de seus apoiadores à causa, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) recuou na postura afrontosa com relação ao Supremo Tribunal Federal (STF) que alimentava — com mais intensidade — nas últimas semanas, em especial no Sete de Setembro. Em nota divulgada na quinta-feira (9), ele negou que teve a intenção de agredir quaisquer dos poderes em suas posições e declarações recentes e que divergências decorrem das decisões adotadas pelo ministro do STF Alexandre de Moraes acerca do inquérito das fake news. Segundo o presidente, as ameaças contra o STF foram proferidas "no calor do momento" — embora ele próprio tenha instigado as manifestações em nível nacional.
Após a divulgação do posicionamento, que teve como mentor o ex-presidente Michel Temer (MDB), a repercussão foi controversa, mas desta vez também entre defensores mais ferrenhos do presidente.
Porém, no dia seguinte, muitos dos apoiadores desiludidos repetiram o gesto do presidente e recuaram, voltando a defender Bolsonaro. O Pioneiro buscou posicionamento de bolsonaristas notórios em Caxias, que reiteraram estar firmes no apoio ao presidente.
O vereador Sandro Fantinel (Patriota), que se autoproclama a pessoa mais próxima do presidente em Caxias, não negou desapontamento inicial, mas disse que, horas depois, passou a achar a postura de recuo positiva:
— Eu estava meio aborrecido. Não queria que ele desse golpe, mas que pelo menos rolasse a cabeça daquele Alexandre de Moraes, porque o problema no STF é aquele lá. Mas hoje conversei com um pessoal, troquei uma ideia aqui e ali... E com mais tranquilidade vejo o recuo de forma positiva, o mais importante é que foi dada uma mensagem para todos os poderes de que grande parte da população apoia o presidente — acredita.
Fantinel confirma que o episódio marcou a primeira decepção dele com o presidente, mas que está otimista no que a atitude de Bolsonaro pode representar.
— Tem a esquerda dizendo que o cara era um leão e virou um gatinho, mas vamos esperar os próximos 15 dias. Daqui a pouco temos algumas surpresas, que nem sei quais são, nada de golpe, mas tem coisas que vão acontecer em favorecimento da democracia. Ouvi comentários da própria saída do Alexandre de Moraes por decisão própria.
Os decepcionados e o ressurgimento de Temer
Fantinel, que organizou um dos protestos (o tratoraço) no Sete de Setembro, e que vinha insinuando a disposição de apoiadores a medidas mais drásticas, nega que apoiasse, embora reconheça que temia, a execução de um golpe.
— Eu estava preocupado. Eu não queria que (Bolsonaro) chutasse o pau da barraca, eu não quero ditadura, eu só quero que as coisas funcionem. Ninguém quer ditadura, ninguém quer golpe, essas coisas hoje em dia já eram, é coisa de país de quinto mundo.
O sentimento de traição, inclusive, ele acredita ter afetado justamente os que apoiam a intervenção militar.
— Quem se sentiu traído foi aquela turma que vivia nas ruas, na frente do quartel, pedindo intervenção militar. Eu nunca pedi intervenção militar, mas esse pessoal mais radical se sentiu meio que traído, mas acho que é uma questão de tempo até eles enxergarem que cada poder faça seu trabalho, se é que isso vai acontecer — avalia.
Sobre a também contestada influência do ex-presidente Michel Temer, Fantinel também enxerga como algo positivo.
— Eu gosto do Temer. No pouco tempo que ele esteve dentro, ele fez um ótimo trabalho. Na época da reforma trabalhista, eu tinha uma empresa e escapei de tomar um monte de processo, de me incomodar, graças à reforma dele. Acho que é uma pessoa com experiência e pode colaborar, trazer uma ajuda, pois quando descemos perau abaixo agarramos o primeiro ramo na frente, mesmo que esteja cheio de espinho.
O QUE DIZEM
"Digno de uma pessoa que soube reconhecer que falou demais. Não ia prejudicar só ele como toda a sociedade. O que ele fez foi o melhor pro país, pra ele, pro STF. Ele recuou com uma conversa com o Alexandre de Moraes, que também vai rever posições. Foi um grande acordo. Vão mudar as relações (com o Supremo) daqui para a frente. Foi um ato de grandeza para os dois lados. Isso aí vai ser uma lição pra ele. Uma lição boa." Mauro Pereira, ex-vereador
"Não entendemos como um recuo, mas um ato de grandeza, em favor da democracia e da harmonia entre os poderes da República. Em nenhum momento as manifestações ocorridas no último Sete de Setembro, inclusive da qual participei, a pauta tenha sido "antidemocrática", pois se assim fosse, não contariam com a minha presença." Adriano Bressan (PTB), vereador
"Não vejo o gesto do presidente Bolsonaro como recuo. Vi sim ele mostrando claramente que não é contra nenhum dos poderes. Mas sim contrário ao arbítrio de qualquer um deles, principalmente por decisões monocráticas. Como também achei louvável o tom mais moderado possibilitando que as pessoas (todos) reflitam melhor." Milton Corlatti (DEM), ex-candidato a prefeito de Caxias
"Em prol da manutenção da harmonia e independência entre os poderes, entendo como uma medida adequada e pensada visando atenuar os ânimos exaltados, decorrentes dos atos legítimos do Sete de Setembro, com os poderes Judiciário e Legislativo, sobretudo com o primeiro, haja vista a pública contrariedade com as questionáveis decisões proferidas pelo ministro do STF Alexandre de Moraes." Alexandre Bortoluz (PP), vereador
"Fiquei inicialmente aborrecido e perplexo, mas hoje vejo como positivo o recuo. De qualquer forma, o presidente mostrou que trabalha dentro das quatro linhas (da Constituição). O Moraes não atua dentro das quatro linhas. Não mudou absolutamente minha opinião com ele. Ele continua sendo capitão e eu sou soldado." Sandro Fantinel (Patriota), vereador