Monica Mattia é presidente do Corede-Serra, o Conselho Regional de Desenvolvimento, desde novembro de 2019. Atualmente, a entidade coordena grupo de trabalho responsável por analisar o programa de concessões de rodovias do governo do Estado e propor alternativas de mudanças do projeto que prevê a instalação de seis praças de pedágio na região.
Ao Pioneiro, ela falou sobre o processo de debate sobre o tema. Confira trechos da entrevista:
Qual nível de envolvimento do Corede na discussão do programa de concessões?
Em 2015, o governo do Estado conveniou com os Coredes para elaboração do Plano Estratégico de Desenvolvimento Estratégico 2015-2030. Um dos capítulos de apresentação das demandas foi justamente a questão da infraestrutura logística, onde se apresentaram então as demandas na área rodoviária, ferroviária, portuária e aeroviária. Em 2016, já destacávamos como uma das alternativas para resolver o grave problema das rodovias da nossa região a concessão das rodovias, quando não se falava sobre essa possibilidade, até em função dos traumas do processo de concessão dos anos 90. Tudo começou ali. Fomos uma força que se somou com outras iniciativas e agora culminou com a possibilidade de participar de um processo que envolve diversas entidades, um grupo de trabalho para avaliar com profundidade o impacto deste plano nas mais variadas áreas.
Mas estão participando ativamente?
O Corede-Serra participa de uma governança junto com outras seis entidades, que estão atuando na busca da melhoria do plano de concessão. O Corede-Serra coordena um grupo de trabalho formado por essas instituições, e esse grupo vai estar estudando os diversos capítulos do plano de concessão. E, a partir da semana que vem (desta semana) ou na outra, teremos uma reunião mensal com equipe técnica de governo aprofundando a compreensão sobre cada uma das partes do plano. E o Corede-Serra faz coordenação executiva deste grupo.
Existe resistência contra a ideia em si do pedágio. Como convencer a população?
Avaliamos a importância de termos rodovias melhores. Já se identificou que o governo não tem orçamento a não ser para fazer um péssimo tapa-buraco. O que poderíamos dizer no sentido de sensibilizar é a questão dos acidentes, das mortes, o custo no deslocamento que as pessoas fazem indo e voltando no nosso território. O custo tanto para pessoas físicas quanto para o transporte. Temos custo de transporte na região mais elevado que a média nacional. Pagamos essa conta seja em função dos deslocamentos, desgaste de pneu, problema na dinâmica do carro. Quando ocorre acidente, nem se fala. Mas o custo de vida da nossa região é mais elevado em razão das rodovias que temos. Ouvimos na Câmara de Vereadores as manifestações dos grupos que contrariam a concessão. Mas qual alternativa existente? O que esses grupos propuseram ao longo desses 15 anos em que não temos mais os pedágios? Qual foi a luta desses grupos? Se de fato o governo não tem orçamento para trazer melhoras, qual alternativa que temos a não ser processo de concessão que seja com decisões mais próximas daquilo que a sociedade deseja?
Afetar o bolso, então, e inevitável?
Sim, e para o usuário é mais barato pagar pedágio do que arcar com os custos das vidas perdidas, custos hospitalares que sofrem acidentes e do custo que está embutido no preço do produto que afeta o bolso de todo mundo.
E sobre o projeto em si, quais são os pontos mais complicados?
Além das questões colocadas com mais ênfase por todos os setores, que é localização das praças, a tarifa, compreender melhor o impacto da outorga, para verificar o quanto pesa ou se não pesa na tarifa e outros aspectos como período de investimentos das rodovias, quando haverá a duplicação e triplicação. Questões econômicas e financeiras vamos estar avaliando, o seguro obrigatório que a concessionária terá de fazer garantindo compromisso de 30 anos de colocar toda a infraestrutura que dê conta de atender todas as demandas da região. Estão previstas seis reuniões a partir da semana que vem, com a equipe técnica do governo. Vamos tentar entrar num entendimento entre posição da região e aquilo que o governo tem de flexibilidade para mudar ou dizer por que não tem como mudar.
Deputado Pepe Vargas disse que foi apresentado um 'prato feito', sem tempo adequado para analisar o projeto em toda sua complexidade. E comentou sobre nunca ter sido feito um estudo de viabilidade de a EGR (Empresa Gaúcha de Rodovias) assumir o pedágio. Na sua leitura, haveria outras formas?
Na minha visão, aí nem falo em nome do Corede, temos uma Assembleia Legislativa estruturada, que discutiu todas essas questões de manter ou não manter uma EGR, de alguma forma possibilitar ao governo construir essa proposta ou não. Esse plano que chega agora é consequente de decisões tomadas no âmbito do Legislativo estadual. Enquanto grupo de trabalho, o nosso objetivo é melhorar a proposta que está colocada.
Mas há algum ponto mais incômodo do projeto que o Corede deve se empenhar para mudar?
Ouvindo as abordagens da reunião pública realizada pela Câmara, me parecem que todas as colocações são pertinentes, pois estão vindo da sociedade. Mas nossa análise é a partir dos dados. 'Ah, a tarifa está elevada'. De fato, ela parece elevada, mas não temos argumento para verificar por qual motivo está elevada. Se vai haver obras em toda a região, como é possível fazer investimentos elevados com obras bastante complexas sem que tenha uma tarifa que dê conta disso. Não temos como nos posicionar se é caro ou barato, até que se possa efetivamente avaliar. O importante é que percebemos que o governo tem intenção de acolher aquilo que tem de ser acolhido. Respeitando a posição do deputado que disse que é um prato feito, sim, a gente recebeu um plano pronto, pois o governo do Estado contratou o BNDES para produzir um plano. Qual seria a outra alternativa se não essa? Nós, enquanto sociedade, parece não termos capacidade técnica para produzir um plano de tamanha complexidade.
Chegou a comandar Corede no período pré-pandemia, então pode notar a articulação dos Municípios antes e depois. Considera que houve melhoria na organização regional?
Achamos que está sim num momento maduro, temos trabalho forte do MobiCaxias, mas também a Amesne (Associação dos Municípios da Encosta Superior do Nordeste) e a CICs Serra (Associação das Entidades Representativas da Classe Empresarial da Serra Gaúcha). Todas as entidades estão atingindo grau de maturidade maior no sentido de perceber que olhar somente para o local não resolve, os problemas são regionais e a cooperação é fundamental para esse processo. E a pandemia aproximou a todos nesse sentido.
Que outro projeto o Corede está engajado atualmente?
Outro tema importante é que apoiamos o Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento (Sustentável) da Serra (Gaúcha, o Cisga) e Associação dos Municípios na busca de uma solução para os resíduos urbanos. Esse projeto é importante, pois é uma demanda de 30 anos dos Municípios. Empresas trazem ideia de implantação de usinas para queimar resíduos urbanos, mas existem legislações fortes federal e estadual que exigem a presença de uma unidade de pesquisa desenvolvendo a rota tecnológica antes de implantar uma usina. Aí buscou-se a Universidade de Caxias do Sul (UCS), que tem cientistas que dominam bem o conteúdo. Essa solução já foi apresentada aos Municípios, 28 deles já aderiram. É um projeto que levará três anos até encontrar uma solução definitiva. Depois, os Municípios poderão definir pela concessão dos resíduos urbanos que vão se transformar de lixo a matéria-prima, gerando energia e outros produtos da queima ou uso da biodigestão.