A Câmara de Caxias completa três meses de atividades de uma legislatura atípica. Não só em termos de formato, com variação de sessões presenciais e híbridas, mas quanto à própria organização dos blocos políticos, muita coisa ainda é incerta e muitos dos papéis ainda não foram assumidos efetivamente pelos parlamentares.
A divisão entre situação e oposição ainda é nebulosa. Em tese, quatro vereadores do PT e PCdoB se constituem como oposição e seis parlamentares de PSDB e PTB assumem como base governista — cinco, se não contarmos Velocino Uez (PTB), atual presidente do Legislativo e que, portanto, não tem poder de voto. Nenhum dos grupos, entretanto, soma maioria, uma vez que, na teoria, 13 vereadores se postariam como independentes.
— Havia uma unidade maior no bloco de situação em outras legislaturas. Hoje, temos um bloco governista, que é o PTB e o PSDB, e os demais ocasionalmente podem estar de um lado (ou de outro). Tem um grupo crítico ao governo, pode ser tímida, mas ali para frente pode se tornar uma oposição em alguns assuntos, maior até que já tivemos (como oposição) — avalia Denise Pessôa (PT).
Na visão da parlamentar, liderança da oposição, atualmente, o Legislativo seria constituído de quatro grupos:
— Tem os neoliberais, que vão se alinhar ao governo nas pautas neoliberais, mas também não são do governo. Eu diria que dá para separar em quatro grupos a Câmara hoje: situação, oposição, neoliberais e independentes.
Felipe Gremelmaier (MDB), um dos vereadores mais experientes da atual legislatura e que representa o grupo dos "independentes", concorda com a divisão observada por Denise e reafirma um cenário atípico na atual conjuntura.
— Ainda está tendo muita indecisão, não conseguimos perceber a configuração do plenário, claro, pouco tempo ainda, não tivemos tantas sessões presenciais para ter essa leitura. E é difícil pela grande mudança que teve também (de composição) — acredita o emedebista.
Nos bastidores, outros cenários se formam na configuração da Câmara, que enxergam, inclusive uma divisão na própria base governista. Para refletir sobre a composição do tabuleiro legislativo, o Pioneiro ouviu representações dos supostos grupos em formação (ou consolidação).
As duas alas governistas
A base de apoio de Adiló Didomenico (PSDB) na Câmara é comandada pelo novato Olmir Cadore (PSDB) como líder de governo e Adriano Bressan (PTB) como vice-líder, função que não existia na última legislatura. Embora os partidos sejam aliados políticos da composição eleitoral, nos três meses de atividades, não houve unidade percebida no plenário. Cadore e Bressan negam que haja qualquer tipo de divisão na base governista, embora Bressan admita que a união esteja se fortalecendo. O que chama atenção, contudo, é o relativo pouco entrosamento da base formal governista e uma afinidade muito maior de Adriano Bressan com outro grupo de vereadores, a "não-oficial" frente anti-PT articulada pelo vereador Mauricio Marcon (Novo) desde o primeiro dia da atual legislatura. Ela é formada por Bressan, Marcon, Maurício Scalco (Novo), Alexandre Bortoluz (PP), Sandro Fantinel (Patriota), Ricardo Daneluz (PDT) e o apoiador com certa autonomia, Juliano Valim (PSD).
— Eles têm um grupo fechado, um grupo à parte, isso todo mundo vê, mas tenho relacionamento muito bom eles. Não tive dificuldades de pedir apoio e ter esse apoio —admite Cadore.
Bressan também reconhece o grupo consolidado, porém, nega que isso signifique a divisão da base em duas alas:
— Não há divisão nenhuma. Tenho aproximação muito boa com pessoal do Novo, Bortola, Fantinel, Daneluz, Valim. Tenho ótimo relacionamento com eles. Temos uma linha política e de pensamentos bem próximos, mas cada um vota como quer. Isso nos dá uma boa condução dentro de plenário e fora dele. Mas a nossa base, PSDB e PTB, está unida sim.
Independente da unidade ainda estar em formação, ambos ressaltam que consideram a capitalização de apoio segura até o momento:
— Temos um grupo seguro de vereadores ao nosso favor. A gente tem tido apoio e isso me realiza como líder. Temos base sólida de vereadores.
— A oposição realmente é composta pelo PT e PCdoB, mas os demais não vejo nenhuma oposição. A base do governo está formada por PTB e PSDB, mas não estamos tendo dificuldades de consolidar o apoio, tanto que todos projetos que vieram do Executivo foram aprovados — destaca Bressan.
Diferente postura
De postura mais discreta em plenário, Olmir Cadore se assume como articulador de bastidor. Inclusive, o tucano ressalta manter diálogo pacífico com a própria oposição, o que muitas vezes não se observa na relação entre oposição e a ala de Bressan.
— É perfil de cada um. Se observar Marisol (Santos), Tatiane (Frizzo), eu, o próprio Daneluz, somos vereadores com perfil mais equilibrado, mas sensatos. Esse grupo do Bressan, que envolve Marcon especialmente, eles têm um perfil mais agressivo, mais explosivo. Aí o embate com a oposição se dá mais com esse grupo. Há um confronto de ideias muito mais radical com a oposição — considera.
Ele, no entanto, diz ainda não saber se a postura "mais tranquila" pode representar melhores resultados políticos:
— Eu sempre fui de muito diálogo, de discordar com certa elegância. Talvez existam resultados mais imediatos no perfil tanto da oposição quanto do grupo do Bressan, mas a minha caminhada é mais no sentido de construir ao longo do tempo. Uma palavra mais populista pode ter resultado imediato melhor, mas, ao longo do tempo, isso pode não se consumar.
SEM RECEIO DE DIVISÃO
Cadore, no entanto, não vê risco de divisão efetiva na base do governo:
— Confio nele (Bressan) como parceiro. É confiável como aliado, só que tem o perfil dele, ele mesmo diz que acerta, erra, mas se expõe. Acho que confiável ele é, tenho como aliado, com certeza. Jamais vou dizer que tanto o perfil do grupo 1 ou grupo 2 seja pior ou melhor, defino o meu como de centro, pessoa mais sensata, equilibrada. Vou expressar opinião dentro de um posicionamento que considero mais maduro, não estou dizendo que o deles não seja, considero o Bressan um companheiro confiável só com perfil diferente do meu — ressalta.
A frente anti-PT e os "neutros"
O grupo mais consolidado surgido nesses três meses se configura como a inicialmente denominada frente anti-PT, idealizada por Mauricio Marcon e que, de acordo com o próprio é composta por ele, Scalco, Bortola, Bressan, Daneluz, Fantinel e Valim. Marcon considera expressiva a unidade.
— São sete votos — afirma.
O vereador ressalta que a afinidade se deu de maneira natural, em razão do alinhamento ideológico:
— Dentro do grupo, temos perfis, o Valim não se intitula de direita nem de esquerda, não gosta de rótulo, disse que quer ajudar, a gente também, então ele está com nós. O Daneluz também é um cara totalmente de direita, mas tem restrições de partido, o PDT é um partido de esquerda. Mas ele é totalmente alinhado na questão das ideias. De resto mesmo, eu, Scalco, Bortola, Fantinel, Bressan, aí é o pessoal de direita raiz mesmo. Dentro do grupo, a gente se dá bem, todo mundo pode votar como quiser, mas temos votado mais ou menos juntos — pontua.
Marcon, porém, insiste que a bancada do Novo adota postura independente e que, apesar de ter boa relação com a base, não existe "compromisso" com a administração.
— Não é uma postura de governo "mandou a gente faz", Temos uma postura bem independente. Se vierem projetos ruins, vamos votar contra e fazer campanha contrária. Não tem nada que nos prenda ao governo — alega.
A posição neutra, inclusive, é ressaltada pela grande maioria dos 13 parlamentares que não compõem situação ou oposição. No entanto, Cadore lista parlamentares que considera apoiadores:
— Nosso apoio permanente praticamente, na maioria dos projetos, é o Novo, o Bortola, Fantinel, PSB tem nos apoiado muito, às vezes não na unanimidade, mas têm nos apoiado muito, o Valim também, o Felipe, a bancada do MDB. Tanto o MDB, como PSB, Novo, o Progressista, (Elisandro) Fiuza também... O próprio PDT, não sempre, mas tem nos apoiado. Então a gente tem uma posição tranquila da aprovação dos nossos projetos.
Ele reconhece que o cenário "pode mudar", mas destaca o bom relacionamento até então para conseguir apoio aos projetos do Executivo.
A oposição e o potencial de capitalização
A oposição, composta majoritariamente pelos três vereadores do PT, vê como único aliado externo o vereador Renato Oliveira, do PCdoB. Na visão de Denise, entretanto, o grande número de parlamentares de postura neutra pode reforçar, em médio e longo prazo, a base de contestação do governo municipal.
— Dependendo o assunto, conseguimos trabalhar melhor (no atual cenário). Já fui oposição sozinha praticamente, então hoje percebo como tem mais partidos para dialogar — salienta.
Denise também avalia a oposição que a própria oposição enfrenta, por ser composta por partidos de esquerda, especialmente diante do cenário macropolítico:
— Analisando a política brasileira, a última eleição, (o perfil de vereadores) estava dentro da conjuntura que elegeu Bolsonaro e que cresceu muito na oposição ao PT. Por isso, era esperado que tivéssemos reflexo disso. É natural termos esse campo, pois reflete a representação da sociedade, mas também não é maior parte da Câmara, tem sua expressão, mas tem um teto, pois não vai crescer fazendo política para uma cidade contra um partido, isso não é política que se pensa para um município.
Denise diz esperar que a antipatia pelo partido não desvirtue a função política dos vereadores.
— Esse discurso (contra o PT) tem limite, não dá para ser contra por ser contra. Eu sou oposição há 13 anos, não é por isso que não aprovei projetos que foram importantes para a cidade. Agora porque é do PT tem de achar ruim? Perde coerência — defende.
QUEM É QUEM
Situação oficial (Partidos aliados na coligação eleitoral)
- Olmir Cadore (PSDB) / Tatiane Frizzo (PSDB) / Marisol Santos (PSDB) / Adriano Bressan (PTB) / Clóvis Xuxa (PTB) / Velocino Uez (PTB)*
* Atualmente presidente da Câmara, portanto, com participação limitada.
Oposição
- Denise Pessôa (PT) / Lucas Careganto (PT) / Estela Balardin (PT) / Renato Oliveira (PCdoB)
Apoiadores "não-oficiais"
- Sandro Fantinel (Patriota): já afirmou em mais de uma ocasião que dificilmente deve se opor à gestão de Adiló.
- Alexandre Bortoluz, o Bortola (PP): tem proximidade política com partidos que integram o governo e sempre apoiou projetos do Executivo.
Apoiadores não-declarados
- Mauricio Marcon (Novo): embora ressalte não ser governista e admitir votar contra quando necessário, sempre votou favorável ao Executivo e é reconhecido pela base como aliado.
- Mauricio Scalco (Novo): semelhante a Marcon, mas mais discreto em plenário, Scalco também é reconhecido como apoiador e vota em favor dos projetos do governo.
Neutros, mas apoiadores recorrentes
- Ricardo Daneluz (PDT): até por compor a frente anti-PT acaba normalmente alinhando voto com grupo de apoio ao governo. Ainda assim, por filiação partidária, não assume totalmente apoio.
- Juliano Valim (PSD): também já reafirmou que não tem rabo preso com o governo, mas apoia geralmente projetos do poder público e elogia publicamente secretários. É reconhecido como apoiador pela base.
- Wagner Petrini (PSB): em tese, independente, porém, já saiu em defesa enfática ao governo em assuntos polêmicos, como a concessão do transporte coletivo. Vota seguidamente a favor de projetos do Executivo.
Neutros
- Gladis Frizzo e Felipe Gremelmaier (ambos MDB): afirmam a bancada como independente, embora tenham apoiado maioria dos projetos do governo. Gladis, no entanto, já se manifestou contrária a alguns posicionamentos da administração.
- Gilfredo De Camillis (PSB): não se vinculou a nenhum grupo, até o momento votou favorável à maioria dos projetos do governo, mas se reafirma como posição independente.
- Zé Dambrós (PSB): neutro, já questionou governo em algumas ocasiões, apesar de também ter apoiado maioria dos projetos.
- Rafael Bueno (PDT): mais discreto do que na última legislatura, é neutro, embora conteste esporadicamente posicionamentos do Executivo.
- Elisandro Fiuza (Republicanos): transita e tem boa relação com todos os grupos, mas assume posição independente, embora geralmente apoie projetos do governo.