Os impactos da pandemia do coronavírus terão efeito cascata. Em meio à articulação incessante em relação às demandas sociais e econômicas, surgiu a declaração do ministro da Saúde, Henrique Mandetta, no último domingo (22), considerando uma "tragédia" a realização das eleições municipais este ano, com a consequente prorrogação dos governos vigentes.
Embora partidos e políticos sejam praticamente unânimes em afirmar não ser o momento oportuno para a discussão, propostas de Emenda à Constituição (PEC) já estão sendo protocoladas por parlamentares no Congresso em respaldo à alternativa. Entre as medidas cogitadas está, inclusive, a realização da eleição de prefeitos e vereadores no mesmo ano em que ocorre o pleito para deputados, governadores e presidente, ou seja, o processo seria protelado para 2022.
Apesar de não ser a grande preocupação do momento, a mera cogitação redefiniria todo o processo eleitoral democrático brasileiro.
Em Caxias do Sul, a situação é ainda mais excepcional. Sob o comando de um governo tampão, a gestão de Flávio Cassina (PTB), que duraria em torno de um ano, se estenderia mais do que o previsto, e se, num cenário hipotético, houvesse deliberação para eleições unificadas em 2022, o governo provisório exerceria o mesmo tempo de mandato do prefeito cassado, Daniel Guerra (Republicanos), de três anos.
O mandato do governo eleito indiretamente, entretanto, previa encerramento da administração Flávio Cassina e Elói Frizzo (PSB) em 31 de dezembro de 2020. No entanto, segundo o chefe da 169ª Zona Eleitoral de Caxias do Sul, Edson Borowski, caso fosse alterada a data do processo eleitoral, a mesma medida de prorrogação dos mandatos seria aplicada no município.
— Tecnicamente não existe mandato tampão. É um governo eleito indiretamente dentro do que está previsto na Constituição e a Lei Orgânica. É um governo como qualquer outro. Portanto, tudo que se aplicar para prefeitos em exercício de mandato, vai se aplicar em qualquer ocupação nesses quatro anos — explica.
Borowski ressalta ainda a repercussão de Rodrigo Maia (DEM), presidente da Câmara dos Deputados, com relação à possibilidade de adiamento das eleições:
— O próprio Maia já comentou que é preciso aguardar os desdobramentos da pandemia para somente depois cogitar discutir essa possível prorrogação.
O Pioneiro buscou contato com presidentes de 12 partidos que pretendem apresentar candidatos no próximo pleito. A maioria afirmou que a discussão não é prioritária, mas reconheceu a prorrogação aceitável, caso sejam mantidas as medidas de retidão social e prioridade administrativa ao enfrentamento à pandemia. A reportagem não conseguiu contato com os presidentes do MDB, Ari Dallegrave, e do PSB, Adriano Boff. Como representantes dos partidos, falaram os vices Carlos Búrigo (MDB) e José Dambrós (PSB).
Os cenários
A SITUAÇÃO
:: Em razão das incertezas com a propagação do coronavírus no país, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, sugeriu o adiamento das eleições municipais deste ano, previstas para o primeiro domingo de outubro. Antes mesmo de a possibilidade ser projetada, deputados e senadores já ventilavam a alternativa no Congresso.
AS POSSIBILIDADES
:: Para ser viabilizada a mudança, seria necessário deputados federais e senadores aprovarem uma emenda à Constituição. Entre as possibilidades, se cogita suspender o pleito, adiar por tempo a ser definido ou prorrogar de forma a unificar com eleições federal e estadual de 2022.
POSIÇÃO DO TSE
:: O vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, que irá assumir o TSE em maio, defendeu a manutenção da eleição. Em nota, afirma que o adiamento só deveria ocorrer "apenas pelo prazo necessário e inevitável para que as eleições sejam realizadas com segurança para a população" e que as "eleições periódicas (são) um rito vital para a democracia." Ainda assim, o ministro ressaltou que a decisão cabe ao Congresso.
Os partidos
CONCORDAM COM O ADIAMENTO
"Sem dúvida irá influenciar na organização do partido, pois estamos trabalhando há bastante tempo. Mas, se for para o bem da comunidade, eu não vejo problema nenhum em mudar a data das eleições. Acredito que irão ser realizadas, que até outubro isso esteja resolvido." Milton Corlatti, presidente do DEM
"O pleito tem de ser protelado. Não é nem o caso de conseguir ou não desenvolver um bom trabalho na campanha, mas de concentrar esforços, toda a sociedade, inclusive o meio político, a buscar soluções, não só na saúde, mas à crise financeira e social devido a essa parada. Será (o adiamento) independente ao impeachment e à condição que o prefeito (Flávio Cassina, do PTB) assumiu a prefeitura de Caxias, que não é por sua vontade." Gilberto Meleti, presidente do PTB
"Essa situação de saúde interfere nos prazos políticos, dificulta. O momento agora é de aguardar. O TSE já tomou a decisão de reconhecer como válido os prazos de filiação até 4 de abril. Encerrado isso, a questão do adiamento deve ser tratada no Congresso com mais propriedade. Sobre a organização do PCdoB, tivemos a vantagem de nos articularmos com antecedência, com uma candidatura na majoritária consolidada, nossas nominatas praticamente montadas e plano de governo avançado. Mas, a prioridade é a vida da pessoas." Paulo Freitas, presidente do PCdoB
"A gente está aguardando a determinação. A prioridade não são as eleições, é o nosso povo, a nossa saúde. Seria melhor adiar, deixar passar isso tudo e, na medida do possível, fazer a eleição o mais rápido possível. Outra coisa que daria para fazer é converter o que se gasta nas eleições para a saúde. Temos muitas formas de fazer campanha em vez de utilizar esse valor." Renato Nunes, presidente do PL
"Eu acho que, se continuar a situação do jeito que está, é correto que se adiem as eleições. Todos os prazos estão correndo e as pessoas paradas, em casa. O ponto de vista democrático é importante, mas a saúde das pessoas está acima disso. Além do calendário, temos a situação dos gastos eleitorais. Neste momento, os recursos têm de ser aplicados em saúde. Devemos repensar o Fundo Eleitoral." Maurício Flores, presidente do PDT
"Sob o ponto de vista da saúde pública e do controle da pandemia, é óbvio que a vida das pessoas e a segurança da população vêm sempre em primeiro lugar. Se for necessária esta medida (de adiar as eleições), infelizmente Caxias do Sul ficará mais tempo nas mãos de usurpadores irresponsáveis totalmente despreparados para administrar o município. Este cenário causa incerteza em todos. De qualquer forma, estamos prontos e preparados para qualquer cenário, pois nossas propostas de governo para as pessoas de Caxias do Sul são claras, objetivas e já aprovadas pela população com os três anos de administração do prefeito Daniel Guerra." Júlio César Freitas da Rosa, presidente do Republicanos
"A prioridade é o combate ao coronavírus. A questão eleitoral fica em segundo plano. Com essa nova realidade, é impossível colocar esse tema na ordem do dia. Se a situação avançar segundo semestre adentro, não haverá clima para a eleição." Antonio Feldmann, presidente do Podemos
"Depende lá de cima, do Congresso, mas primeiro tem que se pensar na população, em primeiro lugar vem a saúde. Se o país continuar nesta situação, tem de usar os recursos das eleições no SUS. A população neste momento não quer falar de eleições, quer trabalhar, quer ter a liberdade de sair de casa." José Dambrós, vice-presidente do PSB
"Eu falo por mim, o Ari Dallegrave é o presidente do MDB, ele falaria pelo partido. Mas estamos com um objetivo que é diminuir a epidemia do coronavírus. Acho que é muito cedo falar sobre isso, mas, se tivermos epidemia nos níveis de países europeus, é evidente que precisa ser repensado, não há clima para eleições. Se se estender até julho, agosto, setembro, não terá como. Temos também os recursos que podem ser canalizados para o enfrentamento ao coronavírus, para equipar hospitais e dar condição de atender às pessoas." Carlos Búrigo, 1º vice-presidente do MDB
"Nunca havíamos vivenciado algo desta dimensão, por isso não sabemos quanto vai durar, por isso é prudente termos cautela com relação às eleições. Temos tempo ainda, é muito cedo para tomar atitude de remarcar eleição. Se precisar, sou a favor de transferir, dentro do possível para dentro do mesmo ano. Se for comprovadamente necessário não sou contra, mas de preferência realizar ainda este ano." Márcio Tadeu Amaral, presidente do Solidariedade
DISCORDA DO ADIAMENTO:
"Eu vou deixar para o presidente nacional decidir. O que eles acharem lá em cima a gente vai ter que acatar. Para mim, não tem problema nenhum (manter a eleição para outubro). Seria bom que a eleição acontecesse, esse problema de ficar 15, 20 dias em casa não atrapalha em nada. Todo mundo pode continuar fazendo política da mesma forma. Isso de adiar é papo de quem quer se perpetuar no poder. O meu partido já está organizado. E esse negócio de realocar recurso para nós não vai fazer a diferença, porque a gente não tem recurso nenhum". João Dreher, presidente do Patriota
SEM POSIÇÃO
"Agora não é o momento para discutir isso. Nós temos que cuidar da vida, das pessoas. A questão eleitoral é uma pauta para depois. Temos de estar todos envolvidos em pensar em alternativas para combater esse vírus. A discussão da eleição fica para adiante. Se precisar ser discutido ou não, fica para depois." Joceli Veadrigo, presidente do PT
"São duas questões: um primeiro movimento, ainda na semana passada, foi no sentido de usar o Fundo Eleitoral na saúde. É uma coisa que o Novo apoiou desde o início. Com relação ao adiamento, não temos posição oficialmente ainda. É evidente que a informação disponível hoje poderia fazer sentido, por outro lado, é um pouco prematuro tomar uma decisão dessas neste momento, na medida que não temos clareza do cenário. Não temos, como partido, posição oficial, mas, na minha opinião, o assunto deve ser discutido, embora não seja o momento oportuno ainda. O esforço tem de ser no sentido de conter a crise, seja econômica ou social." Marcelo Ayala, presidente do Novo