Dos dois mandatos em que atuou como prefeito de Campo Bom, Faisal Karam se destacou por projetos de melhorias na educação do município. A experiência como gestor e os resultados obtidos na área motivaram o convite do governador Eduardo Leite (PSDB) para ser o titular da Seduc, a Secretaria de Educação do Estado.
Em quatro meses de trabalho, Karam enfim consolida uma equipe formada em grande parte pelo antigo quadro da gestão de José Ivo Sartori (MDB) para gerir a terceira maior rede estadualizada do país, que conta com mais de 60 mil professores, em torno de 880 mil estudantes e um orçamento enxuto de cerca de R$ 1 bilhão mensal. Ao Pioneiro, o secretário falou dos desafios e das perspectivas.
Como está sendo a adaptação à pasta?
Fizemos várias ações para tentar entender o tamanho da secretaria em si, que é gigantesca, tem maior orçamento do Estado, mas também tem uma das maiores despesas em termos de folha de pagamento. São R$ 9,1 bilhões de orçamento e uma folha prevista para este ano na ordem de R$ 8,1 chegando a R$ 8,3, R$ 8,4 bilhões. O que resta, infelizmente, são poucos recursos para investimento. O que estamos fazendo com a Seduc é a reestruturação do quadro funcional, a busca pelo recadastro, desde alunos, professores e demais colaboradores. Possuímos números assustadores que dizem que são mais de 3 mil turmas com menos de 7 alunos, são mais de 7,4 mil turmas com menos de 15 alunos. Então, o que está se fazendo é um reestudo, um agrupamento na otimização de recursos humanos.
E a falta de professores?
Hoje o Estado tem 60.340 professores. Sendo nomeados/efetivos/concursados 41.857 e mais de 18 mil contratos. Só que 4.392 contratos hoje possuem licença saúde, o que é decorrente do esgotamento dos profissionais, das questões salariais. De dezembro para cá, tivemos 1,3 mil novas aposentadorias. Além disso, tivemos acréscimo de quase 31 mil alunos comparado a 2018. Nos últimos nove, 10 anos, vínhamos perdendo média de 30 mil alunos. Já neste ano, para nossa grata surpresa, tivemos acréscimo de 30 mil alunos. Então essa questão de aumentarmos número de alunos e aumentarmos aposentadorias criaram necessidade de reajuste para as escolas não ficarem sem professores. Existem faltas eventuais. Porque existe excedente de horas de professores dentro das escolas, o que muitas vezes significa falta de professores dentro das escolas. Então há uma readequação dessa grade estrutural.
E como evitar que não ocorra carência de professores no próximo ano como ocorreu neste?
É uma questão polêmica. Por exemplo, termos de tirar professores que estão dentro de bibliotecas. O Tribunal nos apontou, em estudo, que mais de 2,2 mil professores estão dentro de bibliotecas. Isso não significa que biblioteca não seja importante, pelo contrário. Mas também não pode ter dentro da biblioteca professores que fazem falta dentro da sala de aula. Eles foram chamados para estarem dentro da sala de aula, e não na biblioteca. Hoje o Estado gasta 53% de tudo o que arrecada com folha de pagamento entre inativos e ativos, é impossível colocar dentro da biblioteca profissionais que foram convocados para serem professores. As bibliotecas serão fechadas? Não, só se a escola quiser, a Seduc não fecha biblioteca, a Seduc inclusive estimula seus professores a levarem seus alunos e fazer atividades dentro das bibliotecas. Só se fecha biblioteca se não houver interesse de se manter a biblioteca.
Mas a reorganização da rede, o senhor acredita que seja um sistema suficiente para esse problema?
Temos que saber exatamente por que o professor não está na sala de aula. A prioridade é professor na sala de aula. Hoje a desorganização está ocorrendo, não nego. A grande maioria maciça das nossas escolas está andando. Há escolas com disciplinas específicas com falta de carga horária de professores, como é o caso da região de Caxias. Mas temos até o fim de abril para tornar essa regularidade normal. Estamos contando alunos, professores e demais pessoas que compõem quadro técnico para fazermos ajustes.
E com relação ao recurso de R$ 30 milhões que estava previsto para o Instituto Cristóvão de Mendoza?
Esse valor não vai ser utilizado porque não dispomos esse valor. Foi sempre dito que esse recurso seria do Bird (Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento). Esse recurso nunca foi empenhado para a escola. O recurso termina agora em 31 de maio. Acho que sempre houve erros de comunicação, infelizmente. O projeto dos R$ 30 milhões é belíssimo, mas é fora da realidade financeira do Rio Grande do Sul . Nós temos que usar pouco recurso que temos do Tesouro, do salário-educação para atender situações prioritárias.
Mas o que ficou definido então com relação à escola?
Estamos fazendo trabalho com a nova direção e o CPM (do Cristóvão). Estiveram aqui nesta semana (semana passada) e ficou definido que vão mandar para o Estado um projeto elétrico para a reabertura do auditório. Estão buscando parceria com profissionais de engenharia elétrica e com bombeiros para verificar quais prioridades de manter auditório aberto, sem riscos. A partir do momento que o projeto vier para a Seduc, vamos fazer a tramitação para o processo licitatório da parte elétrica do auditório, da parte de reforma e da hidráulica. Deve demandar mais de R$ 200 mil. Isso vai ser licitado ainda neste ano, acredito.
E das questões estruturais da escola no geral?
Próximo passo é a Coordenadoria Regional de Obras fazer levantamento das prioridades para avaliar as rachaduras nas paredes, afundamento de piso, entre outros. Essas (questões) serão levantadas com ordens prioritárias e emergenciais do governo para que se façam as correções o mais rápido possível. Num futuro próximo, quem sabe, possamos investir mais nessa escola, mas para que isso aconteça a comunidade também precisa entender que uma escola que tem menos de mil alunos, com espaço físico que possui, escola de línguas, Uergs... essa escola tem de passar por reformas e ter comprometimento de buscar mais alunos.
Então haverá uma resposta neste ano?
Da parte do prédio que envolve o auditório, sim. Para as reformas prioritárias de problemas estruturais, dependo da agilidade da Secretaria de Obras e Habitação do Estado. Mas a partir do momento que houve determinação do governador (para fazer levantamento), há cerca de 15 dias, isso irá ocorrer o mais rápido possível. Queremos fazer no segundo semestre deste ano o processo licitatório para essas correções. Não vamos poder construir três quadras, prédio de línguas de três andares com estacionamento embaixo, como o projeto prevê. Isso foge da realidade de qualquer escola do Estado, lamento dizer. O pouco do dinheiro que temos de investir tem de ser redistribuído dentro da demanda que atenda o máximo de escolas.
Os R$ 30 milhões serão distribuídos?
Os R$ 30 milhões não existem. Não tem como redistribuir. O que vamos tentar é investir R$ 4 milhões, R$ 5 milhões na escola nos próximos meses para fazer correções básicas e ficar brigando com o Tesouro e a Secretaria da Fazenda por mais recursos para investir nas outras escolas. Não estou tirando R$ 30 milhões do Cristóvão e alocando para outras escolas. Os R$ 30 milhões não existem no Tesouro. Se ele fosse do Bird, era outra situação, mas ele não existe.
Sobre o ajuste fiscal e seu efeito na remuneração do magistério... Não haverá aumento aos professores durante o Governo Eduardo Leite?
Eu posso falar do primeiro ano. O compromisso do governador ficou claro desde o início: botar em dia folha de pagamento para depois começar discussão de reposição salarial ou aumento real. Enquanto não houver readequação estrutural do Estado, não tem como discutir aumento ou reposição. Agora, se no segundo ano, terceiro ano, quarto, tivermos possibilidade... Temos que valorizar funcionários públicos, mas não temos como valorizar com limite financeiro que te estrangula. Se isso (Estado) fosse uma empresa privada, teria fechado há muito tempo, há 30 anos pelo menos, devido ao grau de irresponsabilidade de fazer gestão pública. Não podemos privilegiar determinadas categorias em detrimento de outras.
E como diminuir índices de evasão num cenário deficitário de educadores...
Um dos itens que contribuem para a evasão é a questão estrutural da rede, desde estrutura física até escassez do profissional que muitas vezes cria desestímulo ao aluno. A Seduc está propondo uma ação que o governo vai lançar em maio ou junho, um grande programa na área de tecnologia que já foi dado início em 300 escolas de Ensino Médio de Porto Alegre. Muitas vezes a Seduc só era informada que aluno evadiu quatro ou cinco meses depois. Com esse instrumento, passaremos a corrigir o fluxo em tempo real. A partir do momento que aluno não esteja frequentando aula, estaremos acionando Ministério Público informando sobre a evasão. E essa ferramenta vai nos permitir comunicação com os pais dos alunos. Agora, se a família não tomar providências, caberá ao MP a comunicação de abandono de sala de aula, coisa que só ocorre hoje quando o MP nos convoca. São correções de fluxo que diminuirão número de evasão e, quem sabe, de repetição.