A determinação do presidente Jair Bolsonaro (PSL) ao Ministério da Defesa para que realize as “comemorações devidas” nos quartéis de todo o país pelos 55 anos do golpe militar que deu início a uma ditadura militar reacendeu a discussão sobre o regime. O anúncio feito na segunda-feira, dia 25, pelo porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, despertou reações favoráveis e contrárias. O ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e a cúpula das Forças Armadas assinaram um documento que seria lido nas unidades militares.
Diante da repercussão negativa, Bolsonaro mudou o tom e disse que o objetivo é rememorar e não “comemorar”.
– Não foi comemorar. Rememorar, rever, ver o que está errado, o que está certo. E usar isso para o bem do Brasil no futuro – disse Bolsonaro.
Na quarta-feira, 27, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou que os comandos do Exército e da Marinha se abstivessem de realizar atos em alusão à data no Estado de São Paulo. Já no início da noite desta sexta-feira, a 6 ª Vara da Justiça Federal em Brasília decidiu que o Governo Bolsonaro está proibido de comemorar o golpe militar de 1964 neste domingo. Segundo a juíza Ivani Silva da Luz, o governo não deve celebrar a data sob pena de multa.
Diante da polêmica, o Pioneiro ouviu a opinião de políticos apoiadores de Bolsonaro e representantes de entidades ou instituições sobre a determinação inicial de “comemorações devidas”, disparada por Bolsonaro. Em Caxias, o comandante do 3º Grupo de Artilharia Antiaérea (3º GAAAe), coronel Leandro Fernandes Moraes, garantiu que não haverá nenhuma comemoração no quartel caxiense.
O ex-prefeito Alceu Barbosa Velho (PDT), que apoiou Bolsonaro na eleição de 2018, disse que não concorda com a decisão do presidente. Já o ex-governador José Ivo Sartori (MDB), que virou “Sartonaro” na reta final da eleição, evitou comentar a determinação do presidente.
O presidente da Câmara Municipal, vereador Flavio Cassina (PTB), e o presidente do DEM, Milton Corlatti, preferiram não comentar. O vereador Arlindo Bandeira (PP) disse que não tinha opinião sobre o assunto.
Dos ouvidos pelo Pioneiro, o único que apoiou explicitamente a decisão de Bolsonaro foi o ex-presidente do PSL caxiense, Sandro Fantinel.
NA HISTÓRIA
:: Em 31 de março de 1964, o presidente de República, João Goulart, foi afastado e os militares tomaram o poder. Dias depois, o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco foi alçado à condição de presidente. A perseguição violenta também atingiu movimentos de esquerda, de trabalhadores e de estudantes.
:: A ditadura militar no Brasil cassou congressistas, governadores, sindicalistas, diplomatas e ministros. A onda de repressão iniciou-se com a prisão, por exemplo, do então governador de Pernambuco, Miguel Arraes, e a cassação de Leonel Brizola, deputado pelo PTB pelo Estado da Guanabara (hoje no Rio de Janeiro), que buscou exílio no Uruguai.
:: Em 20 dias, a ditadura atingiu a 5ª legislatura da Câmara Municipal de Caxias do Sul (1964-1968) e cassou o mandato do vereador Percy Vargas de Abreu e Lima e dos 17 suplentes: Henrique Ordovás Filho, José Antonio Finimundi, Nilo José Corte, Andradina M.O. Gonçalves, Leovegildo Nery de Campos, João da Silva Ramos, Ernesto Bernardi, Luiz Pizzetti, Darcy Gonçalves, Ruy da Silva Britto, Alaor Irani Rocha, Renato Tarciso Viero, Antonio Lisboa da Silva, Enio Fávero, Armin Damian, Clóvis Antonio Sperandio e Pedro Myrtes de Lima Vargas, sob a alegação de serem comunistas.
:: Em 7 de maio de 1964, a ditadura atinge outro caxiense: Bruno Segalla, deputado estadual suplente, teve seu mandato cassado.
:: Em dezembro de 1968, o presidente Arthur da Costa e Silva publicou o Ato Institucional número 5, o AI-5, que decretou o fechamento do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras de Vereadores. A ditadura no país prendeu, torturou e matou presos políticos. Estabeleceu ainda censura prévia à imprensa e a artistas.
:: Em março 1976, a ditadura atingiu outro caxiense. Dessa vez, o deputado federal Nadyr Rossetti, do MDB, teve o mandato cassado.
:: A série de governos militares durou 21 anos até a posse de Tancredo Neves, que venceu as eleições indiretas em janeiro de 1985.
FALAM AS ENTIDADES
"Não, não teremos nada (nenhuma comemoração). Embora eu pareça velhinho, sou de 71. Não vivenciei essa época. O que a gente sabe é o que está nos livros de história. Não temos nenhuma atividade." Leandro Fernandes Moraes, comandante do 3º Grupo de Artilharia Antiaérea (GAAAe)
"Melhor andar com farol para frente do que olhar para o retrovisor. Precisamos ter medidas mais concretas e parar de olhar para trás. Vamos chegar em 2040 e vamos estar pensando em 1964. É preciso que a Presidência saiba que a liturgia do cargo é maior do que a pessoa que ele está se comportando." Ivanir Gasparin, presidente da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) de Caxias do Sul
"Não recebemos qualquer orientação por parte do comando da Brigada Militar. A recomendação do presidente foi voltada às Forças Armadas, nós não comemoramos essa data." Comandante do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM), Jorge Emerson Ribas
:: O Pioneiro tentou contato com o presidente da subsecção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Caxias do Sul, Rudimar Brogliatto, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.