O Brasil inicia um novo ciclo a partir deste 1º de janeiro. Após um período turbulento, com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e de um governo de transição, comandado pelo vice eleito, Michel Temer (MDB), Jair Bolsonaro (PSL) assume com a expectativa de colocar o país "nos trilhos". É o que esperam, ao menos, os 57,8 milhões que o elegeram.
As promessas de forte combate à corrupção e de medidas para revigorar a economia entusiasmam. A ida do juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça é um exemplo do tom que o governo pretende imprimir. No entanto, para muitos, coloca em xeque a continuidade da Operação Lava-Jato.
Diante do programa de governo apresentado durante o período eleitoral e dos anúncios já feitos desde o resultado da eleição, já se imagina o que virá pela frente nos próximos quatro anos. Para saber o que se pode esperar no novo presidente, o Pioneiro conversou com algumas lideranças e especialistas. Confira:
O QUE ESPERAR
"Que Deus ilumine, que Deus ajude, eu torço para que dê certo. Pelas pessoas que já foram nomeadas até agora, é um ministério muito qualificado, e a presença de nada mais nada menos que Sergio Moro no ministério, nos dá uma tranquilidade, uma garantia de seriedade, e é isso que o Brasil precisa". Alceu Barbosa Velho, ex-prefeito de Caxias do Sul
"Tudo o que ele falou em campanha, vai tentar fazer. Claro que precisa de maioria no Congresso. A única pauta que podemos ter dificuldade é a da Previdência. Ele não quer ser aquela pessoa que falou uma coisa para o povo e fez outra. Ele quer enviar (os projetos) para o Congresso e, se não for aprovado, a culpa não foi dele. A Previdência é o coração. Vai gerar economia e garantir direito para quem tem direito, vai ajudar quem merece. E a segurança pública vai ser levada muito a sério". Sandro Fantinel, presidente do PSL de Caxias do Sul
"Nas áreas onde atuo mais diretamente e onde realizo meus estudos, especialmente na segurança pública, penso que o Governo Bolsonaro poderá passar à história como um período marcado por um expressivo aumento na letalidade policial e no número de policiais mortos; pelo aumento exponencial nas taxas de encarceramento sem qualquer investimento na qualidade da execução penal e na ressocialização, o que poderá abrir uma agenda de motins, rebeliões e atos de violência nas ruas, como resposta das facções criminais e pelo aumento dos chamados crimes de ódio, especialmente casos de misoginia, racismo e homofobia. Isso tende a ocorrer porque o discurso de Bolsonaro e os valores daqueles que estarão no poder são francamente favoráveis à violência como resposta pública, o que inclui o apoio explícito à tortura e à ação de grupos de extermínio. Esse comprometimento público com a barbárie, simbolizado no gesto de disparar uma arma, é traduzido como um "sinal verde" para a violência dos agentes do Estado, que tendem a ser também vítimas dessa dinâmica. No mais, teremos uma agenda regressiva em todas as áreas, com especial gravidade no meio ambiente e na educação. O Governo Bolsonaro estimulará o desmatamento da Amazônia e a exploração de riquezas minerais em áreas indígenas. Na Educação, a proposta do "homeschooling" (educação em casa) avançará no Congresso, o que será outro retrocesso histórico. Uma tristeza, em síntese". Marcos Rolim, doutor em Sociologia, membro fundador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e presidente do Instituto Cidade Segura
"Eu não tenho uma avaliação otimista. Uma política econômica de cunho neoliberal que já foi desenvolvida no Brasil na década de 1990, com péssimos resultados, baixo crescimento, aumento da pobreza. Até acho que pode ter um crescimentozinho um ano ou outro, mas não acredito, infelizmente, que vai ter uma recuperação vigorosa da economia. Vamos ficar com níveis de desemprego alto, massa salarial baixa e aumento, infelizmente, da pobreza. As políticas sociais vão ter sérias dificuldades. Já estão tendo. O financiamento da saúde, da educação, da assistência social, inclusive, os jornais falam que eles vão fazer um pente fino nos subsídios que o governo vem dando a vários setores e fala-se, inclusive, em cortes nas políticas sociais para fazer ajuste fiscal. Novamente, os mais pobres é que vão ser prejudicados. Uma política externa extremamente equivocada, marcada por um viés ideológico completamente fora da tradição brasileira de buscar o multilateralismo e a busca de parceiros comerciais e mais pelas visões ideológicas de alguns membros do governo, do próprio presidente e do ministro da Relações Exteriores, e isso tem um reflexo na economia também. E um governo com um viés autoritário. Maior parte dos seus membros, quando se expressa, sempre expressa um viés com certo desapreço às regras democráticas, inclusive com certo discurso beligerante com relação a quem pensa diferente deles. Espero que, no governo, façam tudo ao contrário do que disseram nos últimos dois meses". Pepe Vargas, deputado federal e presidente estadual do PT.
"É um governo que passou por uma transição diferente do que vínhamos acostumados. Montou uma equipe diferente. E politicamente rompeu com um ciclo que já estava em uso há algum tempo no país. É difícil fazer uma previsão de efetividade no que diz respeito a políticas públicas. Dada essas diferenças, imagino que seja um governo que pelo menos almeje _ não quer dizer que vai concretizar _ trilhar um caminho incomum à luz do que vínhamos tendo até o momento. Há desafios importantíssimos em matéria política, como fazer a condução no Congresso, e assim aprovar as agendas de reformas que estão na pauta do presidente. Há demandas sociais muito importantes, como é o caso da segurança pública. Há expectativas muito grandes, como é o caso do Ministério da Justiça, do juiz Sergio Moro. Há o problema econômico e o novo rumo que vai ser adotado pelo Ministério da Fazenda sob a gestão do ministro Paulo Guedes, vai ser algo inédito depois da redemocratização com viés mais liberal. Então, a expectativa mais plausível é de que vai haver modificações, mas é difícil ter qualquer prognóstico se serão ou não efetivas. Teremos uma dualidade no Governo Bolsonaro. Por um lado, um fortíssimo apelo popular no que diz respeito a temas de ordem moral e da ordem pública, um maior rigor no combate à criminalidade, à defesa de certos valores tradicionais da sociedade. Agora o viés econômico e a tentativa de enxugar a máquina pública e transformar a administração pública com uma cara mais liberal a gosto do ministro Paulo Guedes, isso pode ferir interesses há bastante tempo enraizados e chocar um pouco a população criando algum desgaste, e vamos ter isso logo no início, com a tentativa de passar (aprovar) a Reforma da Previdência. Marcos Paulo dos Reis Quadros, cientista político