Algumas palavras-chave ajudam a resumir os 12 primeiros meses de José Ivo Sartori (PMDB) no governo do Rio Grande do Sul: cortes, desconfiança, greves, insegurança, parcelamentos. São termos recorrentes em avaliações prós e contrárias ao trabalho do governante que assumiu o Palácio Piratini sob a desconfiança de uma campanha vazia em propostas, mas repetindo que colocaria a casa em ordem. Porém, talvez nem o gringo soubesse o quanto a missão seria complicada, principalmente em um ano de grave recessão econômica e crise política em Brasília.
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O parcelamento no salário dos servidores estaduais, que redundou em paralisações de três dias em agosto, é o grande fato que marcou o primeiro ano da gestão Sartori. Um episódio que quase torna periféricas outras tantas providências polêmicas: aumento de ICMS; proposta de extinção de fundações; sanção de aumentos para altos cargos do Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público e "calote" em dívidas com a União, que fizeram o governo federal bloquear R$ 60 milhões da conta do Estado.
Em meio a uma série de ações impopulares, defendidas por aliados como necessárias para reequilibrar as finanças, e a dificuldade em apresentar obras de impacto e atrair investimentos para um Estado que flerta com a falência, o peemedebista encerra o primeiro ano de mandato longe da consagração como "Sartorão da massa", alcunha surgida durante a campanha eleitoral. E sem qualquer segurança de que terá tranquilidade em 2016, ano que irá iniciar com as repercussões da votação da lei de responsabilidade fiscal estadual, prevista para o próximo dia 28, em sessão extraordinária na Assembleia.
Ao longo da última semana, o Pioneiro pediu a algumas lideranças serranas para que avaliassem o primeiro dos quatro anos do governo de José Ivo Sartori. Confira o que dizem os entrevistados:
Alceu Barbosa Velho (PDT), prefeito de Caxias do Sul
- É muito difícil avaliar um ano de um novo governo, principalmente um ano de dificuldades tão grandes como o que o governador está enfrentando. Não há dinheiro para pagar a folha salarial, isso resume tudo. Não é que ele não queira pagar, pelo contrário. Está fazendo o possível, mas não tendo dinheiro, não há o que fazer. Vejo uma prioridade muito grande do Sartori em economizar e fazer uma gestão que torne a situação menos caótica. Foi um ano de muito esforço, acima de tudo, para colocar as coisas nos eixos. Medidas impopulares nenhum político gosta de tomar, mas na dificuldade não adianta, tem que fazer. Para 2016, não vejo perspectivas de uma situação muito diferente. Continuará fazendo o estritamente necessário, talvez conseguindo avanços nas parcerias público-privadas. Para uma avaliação mais ampla, é preciso dar tempo. O tempo é o senhor da razão.
Guilherme Pasin (PP), prefeito de Bento Gonçalves
- Foi um ano positivo, em que o governador se propôs a fazer o necessário para iniciar o endireitamento do Estado. Porém, faltou ser mais agressivo no uso das ferramentas para esse saneamento, porque o primeiro ano de governo é ideal para isso. No segundo há eleições municipais, o terceiro é o de colocar projetos em prática e o quarto é de eleições estaduais. A máquina pública precisa ser enxugada, de forma a tornar o estado mais leve. A folha de pagamento é o grande gargalo. O Estado precisa reduzir suas áreas de atuação, para poder se responsabilizar com prioridade total em saúde, educação e segurança. A questão das rodovias, por exemplo, é melhor não pagar pedágio ou ter estradas mais seguras, que preservem a vida? Os repasses à saúde precisam ser uma prioridade, assim como fazer investimentos que não gerem custos para o Estado e são perfeitamente exequíveis. Por exemplo, agilizar permutas com os municípios de áreas que não estão sendo utilizadas. Em Bento, oportunizamos a parceria para a construção do presídio, mas é algo que ainda está em trâmite e precisa ser prioridade. Que se faça um levantamento dessas áreas e coloque-as à disposição para construção de escolas, postos de saúde. Em resumo, acho que ele poderia ter sido mais ousado. Mas já conversei muitas vezes com o governador, sei que ele foi um prefeito muito positivo para Caxias e tenho certeza que em 2016 ele vai pode encaminhar mudanças maiores.
Claiton Gonçalves (PDT), prefeito de Farroupilha
- O Sartori conseguiu desatar alguns nós importantes nesse ano, que começou com um déficit muito importante nas finanças. Mas quem pagou a conta foram os policiais e os professores, e essa forma de agir é ruim politicamente, além de perigosa. Tivemos uma onda de insegurança crescente no Estado. Apesar de os policiais afirmarem que trabalhariam da mesma maneira, a gente viu que a energia arrefeceu e os índices de violência aumentaram. Nas escolas, podemos ver crescer uma geração com forte desconfiança política. O Estado já vem combalido historicamente, com estratégias erradas nas finanças e evasão de riquezas, e vivemos um ano de expectativa sobre que caminhos o governador vai seguir. Meu voto é de confiança no amigo Sartori, mas é preciso que ele reavalie sua estratégia, para que não pendure a conta novamente nos professores e nos policiais. Uma medida necessária para retomar o melhor rumo é mexer no quadro de secretários. Isso já muda o clima, gera otimismo e a população aplaude se enxergar que está sendo feito para o melhor. Não tem que ter medo de mudar secretários apenas por terem estado juntos na caminhada até o governo. A remodelação precisa ser feita.
Edson Vinicius Morello, presidente da Cics/Serra
- Foi um ano de muita dificuldade, principalmente pelas condições em que o governador recebeu o Estado. Ele precisou tomar providências que vinham sendo proteladas e claro que isso está sendo pesado para a população e refletindo diretamente na economia. As obras não estão andando, o Estado não recebe novos investimento de vulto, as empresas estão demitindo. E não há nem a quem recorrer, porque a União parece que esqueceu do Rio Grande do Sul. Estamos muito preocupados, porque o quadro não é bom e o pessimismo deixa todos com medo de investir. O país está estagnado. Sai um ministro que entende de economia e entra um político para repetir o mesmo discurso. Então que deixasse o anterior, que pelo menos entendia. A equipe do governador é boa, já conversei com secretários e a gente percebe que as coisas não acontecem porque o cofre está vazio. Espero e torço muito para que ele acerte na mosca nas medidas que está tomando, senão a situação vai ficar muito mais complicada, com o Estado sem conseguir atrair empresas. Não posso dizer que eu esteja otimista.
Mauro Corsetti, Diretor de Economia, Finanças e Estatística da CIC de Caxias do Sul
- O governador enfrentou uma herança muito ruim, pegou o Estado numa situação delicada. Houve aumentos expressivos de gastos, com salários e outras despesas, e as fontes de recursos foram todas esgotadas, sem capacidade de contrair empréstimos e com os depósitos judiciais praticamente zerados. Com a recessão, devido à política econômica adotada pelo governo federal, a situação se agravou ainda mais. A questão de salários atrasados e parcelados é perfeitamente compreensível. Eu acho que tem muitos pontos positivos. Foram várias etapas que farão efeito a longo prazo, principalmente a questão da mudança na aposentadoria do funcionalismo, que é moralizadora e vai ajudar a sanar as contas do Estado. Como ponto negativo, destaco o aumento do ICMS. Falando do ponto de vista técnico, quando há um aumento de alíquota, isso não significa aumento da arrecadação. Em algum momento a receita inclusive cai, pelo aumento da sonegação e pela diminuição da circulação das mercadorias, que ficam encarecidas. O que o Estado precisa é apresentar um plano claro e transparente de como vamos estar no fim do ano que vem. O governador não pode ser apenas o gerente de pagamento da folha salarial, tem que gerir o Estado todo. E precisa ajudar Caxias a ter um retorno maior dos quase R$ 5 bi anuais em impostos que pagamos.
Getúlio Fonseca, presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Caxias do Sul (Simecs)
- Antes de avaliar como bom ou ruim, é preciso dizer que o governador teve um primeiro ano de muitas surpresas. A cada porta que abriu, encontrou um monte de problemas. Acho que ele precisa planejar o que vai fazer daqui pra frente e ser mais claro ao afirmar o que irá oferecer à população. As estradas em boas condições nesse fim de ano, por exemplo, matéria de capa no Pioneiro, foi uma surpresa. Mas os problemas na área da saúde, por exemplo, quanto tempo vão levar para ser resolvidos? Isso ele tem que deixar claro.
Acredito que o Sartori precisa voltar a fazer a revitalização do Estado a partir de uma agenda muito clara entregue por empresários ainda no início da gestão de Tarso Genro (PT). O ex-governador trabalhou essa agenda no início do mandato, mas depois ficou esquecida. E o documento segue disponível na Fiergs. Ele pode retomar essa agenda para ter um norte.
Professora Dra. Terciane Ângela Luchese, coordenadora do mestrado em Educação da UCS
- Todo final de ano é propício para o desejo de colocar na balança nossas ações, projetos e avaliar acertos, erros, avanços e mesmo retrocessos. Quando se trata do Rio Grande do Sul e seu governo, creio ser necessário pensar para além do Executivo, somando o Legislativo e o Judiciário como responsáveis pelas ações do Estado. Viemos somando dificuldades na administração pública nas últimas décadas. Todos sabemos dos limites que existem para administrar quando o saldo é negativo. Mas se quisermos construir qualquer condição futura de prosperidade e desenvolvimento, é preciso investir em planejamento de Estado e não de governos para a educação. Olhar com atenção para a carreira do magistério, para as condições de trabalho e para as propostas pedagógicas e infraestruturas disponíveis nas escolas é primordial. Não há soluções mágicas ou rápidas para a educação. Um ano pode ser pouco, mas não podemos ser lenientes com as crianças e jovens que estão nas salas de aula. Eles não podem esperar pelo aumento orçamentário, pelas reformas que não aconteceram, pelos professores que não chegaram... Há prejuízos inatingíveis quando pensamos nisso. Mas temos conhecimento acumulado e o Rio Grande do Sul conta com diversas universidades federais e comunitárias - somos o Estado do Brasil com a maior rede de universidades comunitárias - isso não é pouco quando se pensa no conjunto de pesquisas e conhecimentos acumulados sobre escolarização. O governo precisa priorizar alguns setores. Parece que a educação não é o principal. Mas deveria. E não parece ser em parcerias com o setor privado a melhor solução. Não quando se quer uma educação pública, gratuita e de qualidade para todos.
Coronel Antonio Osmar da Silva, comandante do CRPO/Serra
- Foi um ano em que passamos por tudo aquilo que o governador avisou lá no início. Dificuldades enormes, que interferiram direto na atuação da Brigada Militar. Mas cumprimos com o nosso desafio, que foi conseguir fazer mais com muito menos. O recuo financeiro nos fez revisar alguns procedimentos. O principal foi transformamos em programa o que era um projeto, o Avante, que nos permitiu perceber alguns retrabalhos, gastos desnecessários e fazer economias. Um exemplo prático foi deixar imóveis alugados e reverter o valor gasto com aluguel em horas extras para nossos servidores. Fomos criativos para sair da zona de conforto, mas sem fazer aventuras. Não temos nada a comemorar quanto a índices de criminalidade, mas celebramos a maior produtividade que tivemos esse ano, com aumento do número de prisões e registros criminais. Isso em um ano muito difícil, principalmente nos meses de agosto e setembro, com as paralisações, o corte de horas-extras. Conseguimos crescer em meio à crise.