Medo de ser morto pelos sequestradores. Esse foi o primeiro pensamento que Osmir Rodrigues dos Santos, 67 anos, teve ao ver estranhos entrando em seu quarto na madrugada de 27 de agosto. Os homens, que teriam sido contratados pela própria enteada dele, foram os responsáveis por levá-lo de Vale Aurora, interior de Bento Gonçalves, até uma clínica de reabilitação em Osório, no Litoral Norte gaúcho.
Era por volta das 5h quando os sequestradores chegaram na residência, entraram no quarto que o idoso dormia e anunciaram que ele seria tirado dali. Segundo Santos, eles usavam capuzes que cobriam os rostos.
— Eles disseram: "Nós viemos te buscar, velho." Aí eu disse: "Me buscar para quê?" Eles só responderam que vieram me levar. Eu pedi quem eles eram. Me responderam que eram adictos em recuperação (dependentes químicos). Pedi que autoridade tinham para fazer isso, e eles disseram que qualquer pessoa poderia me levar – conta.
Na sequência, um dos sequestradores pegou o pescoço de Santos e começou a apertá-lo. Ao notar que não conseguiria se desvencilhar, ele fingiu um desmaio. Nesse momento, Santos conta que ouviu um dos homens ordenar que as mãos dele fossem amarradas.
O idoso foi conduzido para fora da casa e colocado em um carro, possivelmente uma caminhonete. Ao deixar a residência, ele lembra de ver a esposa caindo no chão, pedindo que ele fosse solto.
Dentro do carro, Santos ouviu os sequestradores cobrarem da enteada uma quantia. Conforme ele, cerca de R$ 1,9 mil. Foi nesse momento que ele teve certeza do envolvimento da mulher.
Na sequência, o carro deixou o Vale Aurora. Santos saiu de casa com uma sacola com roupas, que conforme ele, foi preparado pela esposa sob as ordens da enteada.
— Sentei no banco de trás, com dois homens do meu lado. O carro foi para Garibaldi, seguiu na direção do (bairro) Borghetto. Até esse momento eu pensei que eles iam me matar. Só parei de pensar nisso quando eles acessaram a rodovia (BR-470) – relata.
Durante o trajeto, os sequestradores não conversaram com Santos e nem informaram para onde ele estava sendo levado. Os homens também deram medicamentos para ele. Contudo, Santos descartou os comprimidos sem ser notado.
A permanência na clínica
Santos só descobriu o que estava acontecendo quando o veículo chegou em Osório. Próximo da clínica ele foi desamarrado. Dois dos sequestradores o acompanharam para dentro do local.
Segundo Santos, os sequestradores e os funcionários da clínica pareciam se conhecer. Isso porque ao chegar no local, os homens trocaram cumprimentos e abraços.
— Primeiro me mostraram onde seria meu quarto. Perguntei se alguém tinha pedido minha internação e eles responderam que foi minha enteada. Aí eu entendi que não tinha mais jeito, tinha que entrar na deles – relata.
Após responder um questionário de doenças e medicamentos, Santos assinou o termo de internação voluntária. A permanência forçada de Santos durou 13 dias. Nesse período, ele conta que foi atendido por uma suposta psicóloga. Durante a consulta, Santos negou ser alcoólatra.
— Não faltou comida e não sofri agressão. Para ficar bem com eles, falei que tinha, sim, problema com álcool. Depois de alguns dias também comecei a fazer as atividades da casa, orar com os outros. Mas quando eles rezavam, eu pedia para Deus me tirar dali – se emociona.
Durante a permanência, ele não pode pedir ajuda por duas razões: a clínica só permitia contato com a família após 21 dias; e o único contato que a clínica tinha era da enteada.
O resgate de Santos pela Polícia Civil aconteceu no último domingo (8). Agentes de Bento Gonçalves o localizaram em Osório e o trouxeram de volta para Bento Gonçalves.
— Quando vi eles, comecei a chorar. Foi muito angustiante ficar naquele lugar. Mas eu sabia que os meus filhos iam me procurar, eu tenho uma família forte, estruturada.
Agora em casa, o idoso se recupera física e psicologicamente dos acontecimentos. Conforme ele, a única coisa que espera é que os desdobramentos da polícia impeçam que casos como o dele voltem a se repetir.
— O meu pedido é que não permitam que dependentes químicos saiam pegando pessoas por aí, aleatoriamente. Mesmo que a pessoa tenha necessidade de internação compulsória, que venha uma autoridade, um policial, devidamente fardado, devidamente treinado para conversar e convencer a pessoa aí, não levar de arrasto que nem um animal.
A suspeita está presa preventivamente em Bento Gonçalves desde o dia 31 de agosto. Em nota, a advogada Roselaine Leal, que representa a suspeita, afirma que ela é "inocente e nada tem a ver com os fatos, que serão esclarecidos pela equipe de investigação". A Polícia Civil está investigando o crime.