Por dois dias, a alta cúpula da Brigada Militar (BM) esteve em Flores da Cunha discutindo resultados e planejando novas ações. O encontro técnico-operacional conta com 34 oficiais, incluindo os comandantes dos 16 Comandos Regionais existentes no Rio Grande do Sul. Além de ser o primeiro em 2022, este foi o primeiro conselho após a posse do novo comandante-geral coronel Cláudio dos Santos Feoli, que assumiu na última sexta-feira (18).
O encontro aconteceu na empresa TKA Guindastes Indústria e Comércio, que cedeu seu auditório. A movimentação de viaturas chamou a atenção de quem passava pela RS-122, mas não alterou o trânsito ou a rotina do município de 31 mil habitantes. A escolha das cidades para as reuniões e é uma forma de aproximar o comando da BM das comunidades no interior gaúcho.
São nestes encontros periódicos que são traçados os planos de trabalho da instituição, com o foco principal sendo a redução dos indicadores criminais. Esse sistema de gestão de resultados, ações de inteligência e troca de experiências é visto como a principal forma de fazer mais com menos, afinal a BM ainda enfrenta uma histórica defasagem de efetivo.
Na tarde desta quarta-feira (23), o novo comandante-geral conversou com a reportagem de GZH. O coronel Feoli explica que o encontro na Serra não teve a intenção de anunciar novidades, mas sim manter as boas práticas que têm dado resultados nos últimos anos. Confira a entrevista na íntegra:
GZH: O que é esta reunião técnico-operacional do comando da Brigada Militar?
Coronel Cláudio dos Santos Feoli: Temos uma governança de gestão por resultados. Com alguma periodicidade, cerca de 45 dias, escolhemos um Comando Regional para sediar o nosso encontro onde verificamos o atingimento de metas e, eventualmente, revemos algum processo e verificamos como ajudar aquele comando que não atingiu sua meta. Felizmente, ultimamente temos conseguido atingir as metas propostas nesse sistema.
Por que a escolha por Flores da Cunha?
A escolha foi do comando regional (da Serra, conforme o revezamento de regiões), do coronel (Alexandre) Brite. A Serra é sempre um ambiente aprazível e que nos faz ter uma imersão sobre o assunto. Esses momentos de encontros se valem para conhecermos as regiões. A Serra, normalmente, conhecemos. Mas temos aqui o Comando Regional das Missões, que irá sediar em algum momento um encontro. O próximo será em Frederico Westphalen. Propicia que esses gestores possam verificar quais são as potencialidades e até dificuldades de atendimento das comunidades por parte dos colegas e possam, eventualmente, trazer soluções que esses colegas não consigam enxergar em razão do cotidiano. É uma estratégia de boas práticas.
Então, não é que tenha uma notícia positiva ou negativa para a Serra?
É uma questão de organização. Creio que a Serra tenha o que comemorar. Os índices estão cada vez mais baixando na região, fruto do trabalho de todos os brigadianos aqui da Serra. Ultimamente, temos um investimento robusto em segurança pública. São viaturas que já vem com a semiblindagem, propiciando segurança para o policial. Estamos trocando, e a Serra foi uma das primeiras regiões, o arsenal de pistolas. Em Caxias do Sul, no 12º BPM, já trocamos todas as pistolas. E devemos trocar de toda instituição até o final do ano. Isso significa segurança a mais para quem presta segurança. Temos pistolas com mais de 20 anos de uso. Agora, por ser o mesmo modelo 9mm, teremos a possibilidade de intercambiar a pistola. Hoje, há seis modelos diferentes na instituição. Ou seja, num tiroteio, um policial não pode passar um carregador (com novas munições) para outro porque será incompatível.
E o recurso humano? Como está o enfrentamento à falta de policiais militares no Estado?
Temos uma reposição de efetivo nos últimos três anos. Temos um concurso em andamento e hoje recebi o resultado dos exames médicos. Temos pouco mais de 4 mil selecionados e já vemos que não atingiremos o esperado, que eram 4 mil no final do processo seletivo. Teremos menos, mas existe essa expectativa de completamento do efetivo. Temos, efetivamente, um déficit histórico. A medida que temos ingressos regulares, cerca de 1 mil por ano, chegamos perto do efetivo estipulado. Mas, pela deficiência histórica, ainda estamos aquém. É um déficit bastante acentuado. O que tivemos em alguns momentos foram grandes ingressos (de novos policiais) em um ano só, o que dificulta a gestão, porque dificilmente um governador irá repetir esta medida. O que precisamos é deste ingresso regular. (Sobre números), nos reservamos para que o nosso inimigo comum, da Brigada e da sociedade, não saiba.
Oficialmente, o seu comando iniciou na última sexta-feira. Qual é a primeira missão da sua gestão?
O maior desafio é manter a redução dos índices criminais em todo o Estado. Para isso, precisamos valorizar os nossos policiais. Eu, como comandante-geral, posso fazer isso através de programas internos e com o reaparelhamento citado. Mas, é importante que as pessoas, nas suas comunidades, também valorizem o policial. Por vezes, temos um policial numa esquina e parece que ele está dissociado daquela comunidade. Pelo contrário, ele faz parte daquela comunidade. Um cumprimento, uma medida de apoio, isso tudo valoriza um policial e faz ele trabalhar com mais efetividade.
A Serra foi o berço do policiamento comunitário, que regrediu pela falta de efetivo. Por outro lado, a região ganhou um Batalhão de Choque, que é treinado e focado na repressão. Como o novo comandante vê esta questão?
Dissociar as duas modalidades de policiamento é desconhecer o contexto. Eles são complementares. No momento que podemos fazer o policiamento comunitário, é de interesse institucional. Quanto mais próximo tivermos a comunidade, mais teremos informações que subsidiarão a alocação de recursos humanos e materiais. Mas, complementar a isto, temos uma criminalidade violenta que não pode ser deixada de lado por quem é gestor da instituição. Tivemos, por exemplo, um episódio em Criciúma, no Estado vizinho, em que uma cidade foi sitiada por mais de duas horas porque se demorou a ter um aporte de efetivo local para atender aquela demanda. Hoje, a capilaridade que temos nos Batalhões de Choque, que chamamos de repressão qualificada, faz com que esses comandantes que estão aqui, das 16 regiões policiais, consigam ter o atendimento desta repressão qualificada em uma hora, na pior das hipóteses. Não entender que uma coisa complementa a outra é de um amadorismo que, por vezes, vemos até integrantes da instituição falarem.
Sobre a queda dos crimes no Estado: os oficiais da BM explicam os benefícios do trabalho de gestão com estatísticas, inteligência e troca de informações com outros órgãos de segurança. Até onde pode chegar esse modelo?
A Brigada Militar já trabalha com sistema de gestão por resultados há oito anos. Agora, temos um sistema que perpassa instituições, um processo já consolidado nos órgãos de segurança do Estado. Sempre há possibilidades de melhoria. O importante é que se compreendeu que essa melhoria depende também de investimentos. Fazer mais com menos tem limite, sobretudo na área policial. Temos que ter a presença do policial. Temos que ter viaturas adequadas, como hoje temos. Equipamentos adequados para o soldado na rua ter opções de menor letalidade. Do contrário, não seremos tão efetivo quanto poderíamos ser. Essas reuniões de governança, como esta de hoje, se valem a isso. Que possamos rever processos e melhorar cada vez mais.
Há algum resultado que será divulgado desta reunião?
Estamos fazendo a gestão de números, verificando onde cada Comando Regional conseguiu atingir metas e por que, eventualmente, chegou no limite ou não conseguiu atingir, pois temos alguns. Mas, no global do Estado, temos os resultados positivos que sempre conseguimos apresentar a comunidade e a imprensa após o final de mês, o que é feito pela Secretaria Estadual de Segurança Pública. Mas, novidade efetiva, não teremos desta reunião.