Com um universo de 128.675 processos ativos na comarca de Caxias do Sul, o Fórum local contabiliza a falta de quatro juízes (de um total de 82 em aberto em todo o Rio Grande do Sul) e 33 servidores. O resultado: sobrecarga de trabalho e demora no andamento das demandas judiciais, o que agrava a sensação de impunidade no país. A falta de pessoal afeta, por exemplo, ações de reconhecimento de paternidade, pedidos de pensão alimentícia e disputa de guarda de crianças uma vez que o juiz Ilton Bolkenhagen precisa atender aos 12,8 mil processos que tramitam nas duas Varas da Família. O Tribunal de Justiça (TJ) não tem previsão para preenchimento das vagas no município.
A substituição mais recente ocorreu em junho do ano passado, quando foi instalada a Vara de Execuções Criminais Regional da Serra, que reuniu os cumprimentos de pena da região. A magistrada Milene Fróes Rodrigues Dal Bó optou por ser a responsável por esta nova unidade e, assim, deixou a titularidade 1ª Vara Criminal — que é cuida de crimes contra a vida e a realização de júris.
O preenchimento das vagas é feito pelo TJ, e a escolha leva, em média, quatro meses. Contudo, o tribunal precisa gerenciar a abertura de editais para a movimentação de pessoal em razão do número reduzido de juízes no Rio Grande do Sul (631 magistrados e 34 pretores). O receio é que uma região fique muito prejudicada.
— O costume é juntar várias vagas em um mesmo edital e a cada determinado tempo. Por que, às vezes, não é interesse abrir imediatamente? Porque temos muitos cargos de juízes vagos. Daqui a pouco, por exemplo, abre uma vara em Caxias e vem alguém de Bento. Isso, porém, agravaria a situação em Bento, onde deveriam haver seis juízes, há três e ficariam apenas dois. O Tribunal tem esse cuidado para preenchimento das vagas — explica o juiz Silvio Viezzer, titular da 5ª Vara Cível e diretor do Fórum de Caxias.
A expectativa é que em março seja resolvida a titularidade do Juizado Especial da Fazenda Pública, que hoje é substituída pela juíza Maria Aline Vieira Fonseca, da titular da 2ª Vara Cível Especializada em Fazenda Pública.
Juizados vagos:
:: 1º juizado da 1ª Vara Cível
:: 1ª Vara Criminal
:: Juizado Especial da Fazenda Pública
:: 1ª Vara de Família
COMPARAÇÃO
Apesar do grande número de processos, a situação de Caxias não é a pior. Joinville, a maior cidade de Santa Catarina e que tem população semelhante, concentra mais processos. Confira:
:: Caxias do Sul - 128,6 mil processos para 504 mil habitantes
:: Joinville - 195 mil processos para 583 mil habitantes
:: Canoas - 103.489 para 344,9 mil habitantes
:: Pelotas - 82.709 para 341,6 mil habitantes
:: Bento Gonçalves - 39.231 para 119 mil habitantes
:: Vacaria - 24.701 para 65,8 mil habitantes
:: Farroupilha - 17.817 para 71,5 mil habitantes
:: Flores da Cunha - 10.746 para 30,4 mil habitantes
:: São Marcos - 6.648 para 21,4 mil habitantes
ENTREVISTA: SILVIO VIEZZER, DIRETOR DO FÓRUM
"Juiz não consegue trabalhar o dobro"
Pioneiro: A falta de magistrados é um prejuízo para a comarca?
Juiz Silvio Viezzer: É corriqueiro, sempre tem juízes na comarca com mais de uma unidade, em substituição. É o dobro de serviço, só que o juiz não consegue trabalhar o dobro. Ele vai trabalhar horas a mais, mas o juiz não consegue trabalhar o dobro. Pega uma unidade com 7 mil processos cível e vai substituir outra com 7 mil, você fica com 14 mil processos. Na unidade em que é substituto, você trabalha as questões mais urgentes. Dá o andamento comum, mas produz um menor número de sentenças, que é o julgamento final do processo. É um acúmulo de serviço que faz com que a vara que está em substituição tenha um desempenho mais lento. A unidade que tem um juiz de férias tem de ter um responsável para decidir uma tutela de urgência.
É um dos fatores para a morosidade da Justiça?
A sobrecarga de trabalho realmente cria um pouco de morosidade, é o acúmulo. A questão da morosidade advém, em parte, pelo excesso de trabalho dos magistrados e dos servidores também. Nas varas cíveis, temos um quadro de cinco servidores por unidade, que é um número que está estagnado há mais de década. O número de processos 10 anos atrás, porém, era inferior. Outros fatores são o número de recursos possíveis: são inúmeros no âmbito de 2º grau, no STJ (Superior Tribunal de Justiça) e STF (Supremo Tribunal Federal). O que chama atenção e se noticia são os casos de atraso, as situações que não se resolvem. A imprensa trabalha com base no que a sociedade reclama, e a sociedade não reclama do processo que termina rápido, aquele que o juiz fez uma audiência em três meses, conversou, explicou as possibilidades e saíram as partes contentes com um acordo. Não vira notícia porque a sociedade não reclama. Esta morosidade vem também da reclamação de casos diferenciados. Outro fator é a Constituição de 1988, que permite que qualquer causa seja colocada no Judiciário. Temos processos que entram na Justiça comum cobrando R$ 200 ou R$ 300. Ou seja, o custo do processo é maior do que a parte está cobrando.
Caxias precisa da abertura de novas varas?
Há uma demanda dos juízes caxienses, que está sob análise na Corregedoria Geral de Justiça, para a criação de uma 5ª Vara Criminal. Entendemos que as outras três varas para crimes em gerais são insuficientes, que os colegas estão sobrecarregados e a pauta de audiência se aproxima de um ano de distância. Há uma sobrecarga invencível na área criminal e pleiteamos a 5ª Vara. Além de resolver o problema de sobrecarga de serviço, é uma resposta para a cidade. À medida que temos um processo criminal mais célere, as testemunhas sendo ouvidas em meses e não um ano depois, a eficácia do processo criminal é maior. Cria uma maior sensação de segurança na cidade.