Há 18 anos, a família Correia espera por justiça. No dia 4 de dezembro de 1999, Loreci Correia Fragata dos Santos, na época com 38 anos, foi assassinada com cinco tiros pelo marido, Pedro Fragata dos Santos, 57, no bairro Serrano, em Caxias do Sul. Após confessar o crime e ser autorizado a responder ao crime em liberdade, o autor desapareceu e, sem o réu, o processo nunca começou. Passadas quase duas décadas, a família de Loreci se sente esquecida e impotente.
— Sabemos que não vai trazer ela de volta, mas a prisão dele traria um conforto para a gente. Foi muito difícil. Ele destruiu nossa família. A vida dela tinha muito valor para gente — afirma Crenocir Correia, 43 anos, uma das irmãs da vítima.
— Tentei ir atrás (do investigado) e conseguir informações do paradeiro dele. O problema é que a nossa "Justiça" quer um endereço completo ou não vão atrás. Estamos de mão amarradas, impotentes. Ninguém faz nada. A morte da minha irmã está impune, foi esquecida — aponta o irmão Eloir Correia, 49.
Os irmãos contam que o casal era uma das companhias mais disputadas por familiares no final de semana. As guloseimas preparadas por Loreci eram as preferidas dos sobrinhos. Pedrão, como era conhecido o cunhado, era bom de conversa e era ajuda certa para qualquer obra. Quando estava em casa, porém, o ciúme o tornava um homem violento.
— Ela me contava (das surras) e a gente aconselhava, mas não adiantava. Fomos criadas naquele sistema de que casamento é até a morte. Não tinha separação na nossa família. Ela achava muito feio uma mulher ser separada — conta Crenocir, que uma vez até conseguiu levar a irmã até a delegacia.
Loreci, porém, desistiu de fazer a denúncia diante da possibilidade de o marido ser preso.
— Naquele dia (do crime), ela tinha trabalhado pela manhã, fez o rancho da semana, visitou a nossa mãe e, quando voltou, foi pintar a unha. A briga foi porque ele não queria o esmalte vermelho. Foram cinco tiros, todos por trás e à queima-roupa. Lembro que ela estava caída próximo da porta e ali, em cima do tanquinho, estava o esmalte vermelho — relata Eloir.
Pedro Fragata está com a prisão decretada pela 1ª Vara Criminal de Caxias do Sul desde o dia 10 de outubro de 2012. Natural de Soledade, ele não possui nenhum endereço conhecido pelo Poder Judiciário. Em busca de respostas, a família contratou um advogado para auxiliar o Ministério Público na acusação.
— Houve uma demora inicial, talvez pelo volume de processos do Judiciário, e o réu não foi citado no processo (antes de desaparecer). Por isso, o processo nunca começou. O pior é que nem as testemunhas foram ouvidas. Quanto mais tempo passa, mais difícil fica. Demora (em um processo) é uma coisa, mas não há justificativas para não andar um processo em 20 anos. É muito difícil de explicar esta situação — afirma o advogado Airton Barbosa de Almeida, que representa a família da vítima.
"Confessou o crime, mas nunca o prenderam", lamenta irmã
Loreci foi morta num sábado e, conforme os familiares, Pedro Fragata fugiu para evitar uma prisão em flagrante. Dois dias depois, ele se apresentou na delegacia e confessou o crime. De acordo com o relato do delegado aos irmãos da vítima, Fragata afirmou estar arrependido e pediu perdão a família. Na sequência, porém, ele desapareceu. As últimas informações, conseguidas pela própria família, foram de que ele trabalhou como garçom em Porto Alegre. Quando a polícia averiguou, no entanto, nada foi constatado. O assistente de acusação ressalta que, nestes 18 anos, não há qualquer registro do indiciado.
— Não existe uma conta de luz ou de água. Não há dúvida que ele está se ocultando — afirma o advogado Airton Barbosa de Almeida.
A investigação e localização do réu cabe à Polícia Civil. A Brigada Militar também pode capturar Fragata, caso o encontre em alguma abordagem ou receba uma denúncia. Contudo, diante da elevada demanda dos policiais e dos novos crimes que acontecem, o sentimento da família é que o caso ficou para as estatísticas.
— Está esquecido. É porque não é da família deles, senão... Não é fácil perder uma pessoa assim. Minha irmã era uma pessoa de bem e trabalhadora. Ela foi assassinada e ninguém faz nada. Ele confessou o crime, mas nunca o prenderam, nem por alguns dias. Matou e nunca aconteceu nada com ele — lembra Crenocir.
— É um caso de homicídio com autor identificado. Não acredito que, a polícia e o Judiciário, que hoje contam com tantos meios de informações, não consigam localizar esta pessoa — salienta o advogado.
"Iremos olhar para este caso. O problema é que são muitos fatos", diz delegado
O processo por homicídio simples foi proposto em 3 de janeiro de 2000 e, conforme o site do Tribunal de Justiça, possui movimentações recentes: em abril e julho deste ano. A situação, contudo, não muda: aguarda prisão do réu. O drama da família aumenta porque o mandado de prisão tem validade até 23 de outubro de 2020. Ou seja, está próximo a prescrição do crime — o prazo máximo é 20 anos em razão da pena para homicídio.
— São milhares de foragido no Estado e é até difícil quantificar quantos são de Caxias do Sul. Temos os meios de investigação e podemos localizar (este procurado), com certeza. Tanto nós quanto outros órgãos de segurança. Ele está sujeito a ser preso e (agora) iremos olhar para este caso. O problema é que são muitos fatos e, realmente, este não estava em nosso foco — aponta o delegado Adriano Linhares, da Delegacia de Furtos, Roubos, Entorpecentes e Capturas (Defrec).