Os corpos — e restos do que um dia foram corpos — começaram a aparecer em maio do ano passado. Primeiras da lista, mãe e filha foram reduzidas a quase nada em meio às chamas de um casebre popularmente conhecido como castelinho, bem perto do ponto turístico e religioso Monte Calvário, na área central de São Marcos.
Do castelinho, sobraram pedaços de tijolos e vestígios enegrecidos pelo fogo. De Angela Moraes Sá, 45 anos, e Andreza Ribeiro Sá, 23, restaram dois pedaços carbonizados do tamanho de uma bola de futebol, condição que só permitiu a identificação oficial por meio de exames de DNA quase um ano depois. Em dezembro passado, foi a vez de Anderson Rodrigues, 31, ser executado dentro de casa, no bairro Santini. Muitos tiros e nenhuma testemunha.
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Só que havia indicativo de algo pior pela frente. Nos bastidores, um grupo criminoso iniciava movimentações para assumir o controle do tráfico de drogas. Desde então, os corpos se espalharam. De 11 mortes violentas registradas em 2018, sete estão diretamente ligadas ao tráfico. É uma matança sem precedentes na história da cidade de 21 mil habitantes e não há perspectivas de que vá parar tão cedo. Para comparação, em 2016 não houve assassinatos.
São Marcos está num redemoinho de violência que atinge comunidades de porte semelhante na Serra. Há dois anos, o tráfico era regido por criminosos locais eventualmente associados a distribuidores de Caxias do Sul. Esse mercado com grande clientela atraiu quadrilhas chefiadas por apenados encarcerados nas galerias da Penitenciária Estadual, no Apanhador, e com ligações com grupos da Região Metropolitana.
Em comum, são bandidos que usam o nome de uma facção para intimidar e afastar quem estiver pelo caminho, situação admitida pelo comandante do 36º Batalhão de Polícia Militar (36º BPM), major Juliano Amaral, que abrange a companhia da Brigada Militar local.
No final do mês passado, uma jovem de 19 anos morreu baleada na saída de um bar. Supostamente, acabou morrendo por estar ao lado de um traficante. Duas famílias também perderam parte do patrimônio no mesmo incêndio que sepultou mãe e filha na área do Monte Calvário. São as vítimas da "bala perdida", da violência desmedida.
— Hoje, todo mundo está correndo risco, sabemos disso, tanto que estamos traçando uma meta em conjunto com a Brigada Militar e a Polícia Civil para proteger a comunidade — garante o prefeito de São Marcos, Evandro Carlos Kuwer (MDB).
— Sim, há uma facção tentando "limpar o terreno", mas desencadeamos ações para reprimir esses crimes — complementa o major Juliano Amaral.