Para o desfile de Sete de Setembro em Caxias do Sul, a tradicional banda marcial do Instituto de Educação Cristóvão de Mendoza conseguiu um feito notável: reunir integrantes das primeiras formações com a atual composição. A iniciativa partiu de um chamamento, via redes sociais, do atual regente da banda, Antonio Roberto de Jesus Filho.
A ação conseguiu atrair cerca de 30 pessoas para a apresentação. Apesar dos poucos ensaios (dois) e da necessidade de viabilizar uniformes extras, a banda conseguiu triplicar o número de participantes do ano passado e deve atravessar a Rua Sinimbu com cerca de 70 componentes.
Apesar da adesão positiva, a convocação não foi motivada apenas com o propósito de reencontro.
— Na época do desfile, sempre temos esse problema de falta de músicos porque a maior parte se profissionalizou, passou a tocar em outras bandas, dá aulas. Ano passado, estávamos com menos de 20 na avenida e é inadmissível uma banda importante como a nossa ter esse número. A solução foi chamar os antigos — salienta o regente.
Esse resgate da "velha guarda" não só terá efeito positivo na confraternização de várias gerações, mas também pode servir como estímulo para a retomada da valorização da Semana da Pátria, evento que teve seu auge nas décadas de 1960 e 1970 e que, nos últimos anos, vem sofrendo com a crescente queda de público e de participação de entidades.
No ano passado, o desfile cívico voltou a ser realizada na Rua Sinimbu (em 2016, não houve parada e nos dois anos anteriores, ocorreram na Rua Plácido de Castro). Mesmo assim, a atração registrou o menor número de espectadores dos 10 anos, com um total de 12 mil pessoas. A expectativa deste ano é que mais de 20 mil prestigiem o evento.
Conforme a professora Marília Fanton, responsável pela Semana da Pátria em Caxias, a maior mobilização das entidades (são 11 a mais do que o ano passado) já demonstra que esta edição representa uma pequena retomada:
— As escolas estão incentivando que os estudantes se envolvam mais. Esperamos que os alunos não confundam a homenagem à pátria com política.
Neste ano, quem abre o desfile será o Colégio Estadual Henrique Emílio Meyer, que participa das atividades há cerca de 10 anos.
— Foi um reconhecimento. Os maestros se reuniram e destacaram nossa lealdade com o evento. Apesar dos poucos incentivos, buscamos nos alunos e professores essa motivação de mostrar que queremos algo mais. Não temos a mesma estrutura por sermos uma escola pública, mas todos participam muito orgulhosos — garante a diretora, Michele Biondo.
50 anos de diferença entre gerações
Aos 61 anos, o arquiteto César Augusto Mendonça Pagliarin se surpreende com o fato de que o uniforme que vestia em 1978 ainda lhe serve, mesmo passados 40 anos. Ele é um dos integrantes que atendeu ao convite e retornará à Sinimbu com o bumbo, instrumento que tocou na banda marcial Cristóvão de Mendoza entre 1978 e 1986. Pagliarin também participou da formação que foi campeã nacional das bandas marciais, em 1982.
_ Já tínhamos um grupo de amigos envolvendo ex-integrantes, que chamamos de "dinos", e sempre falávamos em nos reunir para tocar. Mas foi com a ajuda do Antônio (Roberto de Jesus Filho) que conseguimos formar a turma. Uns estão meio mancos, outros meio tortos, mas o entusiasmo de voltar supera tudo _ brinca.
Contemporâneo de César, o hoje guarda municipal Paulino Velho, 56, foi também integrante de uma das primeiras formações da banda: começou no final da década de 1970 e tocou até a interrupção das atividades, em 1989. Apesar de ter se afastado da música, ele fez questão de aceitar o convite para rever os velhos amigos.
_ Virei servidor, mas sempre me empolguei pela música. Tanto que participei dos desfiles com a Guarda Municipal. Quando fizeram o convite, não pensei duas vezes _ garante.
Na mesma banda em que vão desfilar os veteranos no Sete de Setembro está o trompetista Victor Hugo Nascimento de Oliveira, 11, o mais jovem do grupo _ 50 anos que separam ele de Pagliarin, por exemplo. Estudante "emprestado" da Escola Municipal Marianinha de Queiróz, Victor, que sonha em ser músico — ou piloto de corrida — afirma sentir orgulho em dividir a apresentação com os antigos integrantes:
— Me sinto pequeno perto deles. Eles tocam pra caramba, são muito evoluídos — afirma.
Data parece ter perdido o valor
Ex-integrante da banda do Cristóvão, o maestro da Orquestra Municipal de Sopros de Caxias, Fernando Berti Rodrigues, não entende os motivos de haver desinteresse ou antipatia pelo Sete de Setembro.
— Não vejo mal em homenagearmos a nossa independência. Foi uma conquista que tivemos e que não precisa estar vinculada com militarismo ou à política atual. Um povo que não cultua suas tradições e suas conquistas acaba se tornando um povo sem referência — opina.
O arquiteto César Augusto Pagliarin também se diz perplexo com a mudança de mentalidade.
— A gente praticava esportes, tocava na banda. Existia uma rivalidade saudável entre as bandas e todos prestigiavam, 200, 300 pessoas iam assistir ensaios. Fazíamos vaquinha, rifa para conseguir dinheiro para comprar equipamentos e viajar. Hoje, os jovens têm mais interesse em tecnologia e o Sete de Setembro parece ter perdido o valor, principalmente devido a essa dicotomia política que vivemos, uma pena — lamenta.
O estudante Roberto dos Reis, 16 anos, do 2º ano do Ensino Médio do Cristóvão, concorda que o Sete de Setembro é, de fato, uma data que deveria ser mais valorizada pelas bandas:
— É quando a gente consegue mostrar o nosso trabalho para um maior número de pessoas, e da própria cidade — destaca o trompetista.
A própria responsabilidade em participar de uma banda seria um dos fatores que, de acordo com o regente da banda, desmotiva muitos a se integrarem.
— O maior desinteresse da atual geração é porque gera compromisso. Eles não querem ter que ir no final de semana na escola. E, muitas vezes, o aluno quando chega mais novo se sente acuado de ver os mais velhos tão adiantados e acaba não tendo motivação ao saber que leva dois anos, em média, para aprender — analisa Antônio Jesus Filho.
"A banda foi fundamental na minha formação"
Criada em 1965, a banda marcial do Instituto de Educação Cristóvão de Mendoza sofreu uma reestruturação importante em 1978, quando começou a se tornar a referência que é até hoje. Além de campeã nacional em 1982, a banda também conquistou títulos estaduais ao longo dos 45 anos de história _ entre 1989 e 1997, as atividades foram suspensas. Nesses 40 e poucos anos, a banda ajudou a revelar muitos músicos profissionais que são referência em orquestras de várias cidades do Brasil.
— A banda do Cristóvão foi fundamental na minha formação. Foi a partir dali que descobri a música. Não fosse ela (a banda), não teria tido o despertar — comenta o maestro e diretor artístico da Orquestra Municipal de Sopros de Caxias do Sul, Fernando Berti Rodrigues.
Para Rodrigues, as bandas escolares cumprem exatamente essa função, a de alertar que há algo além do ensino, seja através da arte, da música ou algo que estimule os alunos além da área pedagógica. A motivação, no entanto, ainda é reduzida entre os estudantes da instituição. Na banda do Cristóvão, por exemplo, da formação fixa de 35 integrantes, apenas dois são alunos.
— Ninguém (dos colegas) parece se interessar pela música. Acho que é muito em função da internet. Eu me interessei porque tocava na antiga escola e a música é meu sonho — avalia o estudante Roberto dos Reis.
Outro entrave é a falta de investimentos. Algumas instituições conseguem viabilizar a compra de instrumentos e uniformes por meio de leis de incentivo à cultura. Outras, no entanto, precisam recorrer a eventos para arrecadação ou se apresentar em concertos particulares.
— A gente não tem incentivo fixo, a banda vive do que a escola pode colaborar, que é com apoio logístico. Por isso, sobrevivemos dos cachês e apresentações particulares. Quando tocamos em shoppings, por exemplo, conseguimos algum recurso, mas quando vamos a escolas, só podemos cobrar por transporte e lanche, até por questão de bom senso — explica o regente Antonio Roberto de Jesus Filho.
De acordo com Fernando Berti, a falta de investimentos é o que justamente contribuiu para a perda de representatividade das bandas em escolas:
— São poucas as atividades que contribuem tanto para desenvolvimento da personalidade e do caráter como a música. E não há noção dessa importância. Existe falta de investimento e falta de interesse dos entes públicos e privados e até nas escolas particulares.
PROGRAMAÇÃO
Até o dia 7
Praça Dante Alighieri
9h: hasteamento das bandeiras e execução do Hino Nacional.
17h: arriamento das bandeiras e execução do Hino Nacional.
Dia 7 (Sexta-feira)*
9h: Desfile da Independência na Rua Sinimbu, com a participação de 46 entidades e escolas.
17h: encerramento da Semana da Pátria na Praça Dante Alighieri.
*Na manhã do dia 7, a organização avaliará a necessidade de um possível adiamento para domingo, dia 9, se houver mau tempo.