Contornando o muro do Cemitério Público Municipal, um pequeno espaço chama atenção quase no final da Rua Rosalimbo Cossio, na comunidade do Euzébio Beltrão de Queiróz, em Caxias. Bancos pintados, paredes com grafite e canteiros com plantas colorem uma área outrora ignorada. O que há cerca de dois anos era ponto para descarte de lixo, hoje tornou-se a Praça da Esperança.
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Tudo iniciou em 2016, quando os integrantes do projeto TaliesEM, do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Caxias do Sul (UCS) convocaram moradores do bairro para criar um grupo de planejamento para restauração do espaço. A iniciativa gerou o interesse de diversas famílias das imediações, cuja mobilização resultou na completa recuperação da área, que será inaugurada neste domingo.
— Eles (os moradores) sempre se dedicaram bastante desde o início. E a ideia foi sempre de fazermos um projeto baseado no conceito de urbanismo colaborativo com a participação ativa da comunidade _ comenta a coordenadora do TaliesEM, Terezinha Buchebuan.
Inicialmente, acadêmicos de Arquitetura e Urbanismo realizaram oficinas para conscientizar moradores sobre questões que envolvem o ambiente urbano. Após alguns meses, com um grupo formado, foram realizadas reuniões de planejamento para a revitalização da área com o suporte direto dos estudantes.
—No início, eles (moradores) sempre aguardavam a nossa chegada e no final (do projeto), quando chegávamos, eles já estavam trabalhando, plantando mudinhas e se organizando. Conseguimos visualizar no final os vínculos resgatados do sentimento de pertencimento dos moradores com aquele espaço que lhes pertence — complementa Terezinha.
A participação popular no projeto preenche em cor cada aspecto da nova praça. O muro que separa a rua do cemitério ganhou pintura de grafite com a participação de crianças do Euzébio, em parceria com um projeto desenvolvido pelo MC Chiquinho Divilas.
— A gente ajudou a fazer o piso, plantar as mudas, pintar o muro. Tudo na base na colaboração, pegando coisas emprestadas e recebendo doações — comenta Sidnei Renato dos Santos Marques, morador da comunidade.
Segundo Marques, além de influenciar no novo visual da praça, o envolvimento dos moradores é um motivo para que o espaço seja cuidado.
— Antes, além de servir como lixão, usuários de drogas frequentavam o local. O pior é que crianças esperavam o ônibus ali. Agora, os próprios moradores cuidam e sempre avisam se tem alguma movimentação diferente — conta Marques.
Para os cerca de sete estudantes e da coordenadora que contribuíram diretamente no desenvolvimento do projeto, a experiência transcendeu o propósito acadêmico.
— Foi incrível ver eles (os moradores) retomando o interesse pela própria comunidade, criando vínculos e nos comprovando que a arquitetura não precisa estar no escritório, ou no computador, ela pode estar na rua, nas comunidades. Havia também uma frase que usamos bastante que é: fazer o que pode com o que se tem. E acho que isso resume o espírito do projeto e da importância social dele — comenta a estudante Luiza Signori.
Espírito comunitário
A estrutura da Praça da Esperança é singela: são três bancos distribuídos em uma calçada alargada e canteiros preenchendo o aspecto urbanístico. Ainda assim, a revitalização atrai e conforta a vizinhança.
— Eles capricharam de verdade. Ficou muito bonito — comenta o aposentado Raul Moreira, 83.
Acompanhado do seu cachorro Bandi, o morador afirma que o ressurgimento do espaço de lazer o motivou a voltar a sair de casa.
— Eu nem saía mais porque tenho problema na coluna, daí evito caminhar. Mas agora venho todos os dias na pracinha com meu companheiro — anima-se Moreira.
Embora pequena, a área de lazer já é um sucesso.
— Tá sempre cheio nos domingos. Eu moro aqui na frente, daí é sempre bom reunir a família aqui nos finais de semana, ter um espacinho de lazer — comenta a higienizadora Jussara Marques.
—Achei bem bacana. Antes era só um lugar abandonado. Mas agora atrai famílias e vizinhos para interagir e isso é muito importante. Também têm pessoas que vem aqui comprar alguma coisa e isso também é bom — ressalta o funcionário de uma mercearia das imediações, Guilherme Santos.
BOAS AÇÕES
O projeto TaliesEM, desenvolvido pelo curso de Arquitetura e Urbanismo da UCS, promove diversas atividades fora do ambiente acadêmico. Em dezembro de 2017, o Pioneiro divulgou um trabalho que teve a participação dos estudantes do grupo para elaboração de uma cartilha sobre construções inteligentes para moradores de São Francisco de Paula.
Agora, o projeto deve se dedicar a ações semelhante à desenvolvida no Euzébio Beltrão de Queiróz. Entre os trabalhos, o grupo vai começar o diagnóstico para futura reformulação de áreas de duas escolas: uma no bairro Reolon e outra no município de Farroupilha.