O massacre no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus, que deixou 56 mortos, serve de alerta para o controle cada vez maior das facções em presídios pelo país, situação que também seria comum nas duas penitenciárias de Caxias do Sul. Embora as autoridades descartem que chacinas semelhantes possam ocorrer nas cadeias gaúchas, é fato que os grupos criminosos se fortalecem cada vez mais atrás dos muros, a exemplo da Penitenciária Industrial de Caxias do Sul (Pics).
Além das vistas grossas sobre a rotina interna dos apenados, os servidores denunciam a falta de revistas nas celas da Pics – a última grande ação foi em março de 2011. De lá para cá, os apenados montaram um grande esquema de venda de drogas e de bebidas, além do aluguel de camas e celulares. Não bastasse isso, os próprios presos estariam controlando os horários de banho de sol e os castigos de desafetos. O que pode potencializar conflitos, porém, é o lucro cada vez maior nos presídios, já que a cobiça tende a acirrar ainda mais as disputas entre grupos que já promovem assassinatos no lado de fora.
Em entrevista à Rádio Gaúcha, o juiz Sidinei José Brzuska, da Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre, afirmou que as facções gaúchas lucram muito nas prisões e, por isso, cai a probabilidade de um episódio semelhante ocorrer no Estado.
– No nosso cenário atual, dificilmente aconteceria isso, porque o nosso crime, aqui dentro das prisões, me parece ser mais organizado. As nossas facções aprenderam a lidar com o sistema, elas já fizeram a leitura do "bandido bom é bandido morto". A facção trabalha com essa lógica e viu nela uma forma de ganhar dinheiro. Então, quanto pior o presídio, melhor para o crime. As nossas galerias, as pessoas que controlam essas galerias, acabam tendo uma lucratividade muito grande. São locais de recrutamento de mão-de-obra para o crime, e não vão colocar em risco esses espaços, que são valiosos, que geram muito dinheiro para o próprio crime – ponderou o magistrado.
Na terça-feira policiais militares da guarda externa da Penitenciária Modulada de Charqueadas, na Região Metropolitana, mataram um detento e feriram outros dois durante uma invasão de alas. Um grupo de apenados, pertencentes à facção dos Manos, teriam quebrado o muro que os separa da ala onde estão os rivais da facção dos Abertos, ação que teria sido reprimida pelos PMs.
Disputa pelo controle do tráfico no país
Conforme documentos obtidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, a Polícia Federal descobriu, durante a Operação La Muralha, "planos para o assassinato de todos os membros" do Primeiro Comando da Capital (PCC), originária de São Paulo, pela Família do Norte, facção amazonense alvo da ação policial de novembro de 2015. Por trás do massacre, estaria a disputa de poder no controle do tráfico no país. Envolve o PCC e o aliado da Família do Norte, o Comando Vermelho (CVV), bando formado no Rio de Janeiro. A briga sangrenta revela como o tráfico transnacional de drogas transformou-se em uma atividade organizada por facções. O enriquecimento de criminosos, que gera poder e disputa entre facções, preocupa o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Mas ele enfatizou que o massacre não pode ser explicado simplesmente por uma guerra entre facções.
– Isso tem uma questão muito mais profunda, que é a entrada de armas nas penitenciárias, em virtude da corrupção, e a possibilidade de presos perigosos ficarem submetendo, independentemente de facções, outros presos. Dos 56 mortos, menos da metade tinha ligação com alguma facção ou organização criminosa – afirmou.
O ministro Moraes negou que o Estado tenha perdido o controle das casas prisionais.
– Diria que temos problemas graves e sérios, principalmente pelo descaso dos governos anteriores, de 15 anos para cá, tiveram com o sistema penitenciário. Precisamos reverter isso e é uma absoluta prioridade do presidente Michel Temer e do Ministério da Justiça – afirma.