Palco da chacina, o Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj) é um presídio terceirizado, ou seja, o governo do Amazonas paga para uma empresa realizar a segurança. É uma diferença fundamental com o Rio Grande do Sul, onde não existe parceria público-privada. Contudo, no restante, os presídios gaúchos são muito semelhantes ao Compaj. É o que aponta um ex-agente penitenciário do Amazonas e que atuou no Compaj entre 2005 e 2007.
O homem de 38 anos, que prefere ter sua identidade mantida em sigilo, hoje mora em Farroupilha. No período em que atuou no Compaj, a casa recolhia João Pinto Carioca, o João Branco, apontado como um dos principais narcotraficantes daquele Estado e membro da Família do Norte. João Branco era o xerife de uma das galerias, "cargo" que na Penitenciária Industrial de Caxias do Sul (Pics) é chamado de prefeito.
– Os xerifes sempre tiveram acesso direto com os diretores do presídio. Era muita mordomia. Não precisava de agente (penitenciário), era tudo negociado com os diretores. Nós (agentes penitenciários) ficávamos no meio (entre a direção e os presos) e sabíamos que havia coisa errada, mas tínhamos que ignorar. Não tínhamos autonomia. Se alguém quisesse fazer (o trabalho) ao pé da letra, não ficava muito tempo na casa – relata.
O depoimento é semelhante ao denunciado por um policial militar e um agente penitenciário da Pics em reportagem publicada pelo Pioneiro em 6 dezembro.
– Não conheço a realidade daqui, mas sabemos que há contatos. Lá é uma facção do Norte contra outra de São Paulo. É um problema a nível de Brasil e afeta toda a sociedade. Esses presos dão ordens para fora, inclusive de um Estado para o outro, que são cumpridas rigorosamente. A essência é a mesma e, por isso, a criminalidade está dominando o Brasil. É a corrupção. As autoridades se rendem a essas propostas. Alguns negócios que envolvem milhões – aponta o ex-agente no Amazonas.
O estresse diário de ir trabalhar e não saber se voltaria para casa foi o motivo do ex-agente pedir demissão e se mudar para a Serra, onde a irmã já morava.
– Para ser sincero, para gente era apenas rezar muito (para não acontecer confusões). Se queríamos algo, como fechar uma galeria, precisávamos pedir ao xerife. O controle era de dentro. O Estado já perdeu o poder faz tempo – afirma.